Cuba, 1957: Matthews, do NYT, entrevistou Castro na Sierra Maestra
 
 
Na Cuba revolucionária da segunda metade dos anos 1950, um rebelde caiu no mar (1956) e um jornalista ianque, Herbert Lionel Matthews, caiu num igarapé cubano (1957).
 
 
 
 
 
 
 
 
Fulgencio Batista na capa da revista norte-americana
 

 

 

Bohemia cover 3-Mar-1957

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

CAPA DA REVISTA DE OPOSIÇÃO Bohemia, 3.3.1957
(http://cuba1952-1959.blogspot.com/2009/06/1957-matthews-castro-interview-printed.html)

 

 

HERBERT MATTHEWS

(http://www.spartacus.schoolnet.co.uk/SPmatthewsH.htm)

 

 

"Herbert Matthews with Ernest Hemingway in Spain"

(http://www.spartacus.schoolnet.co.uk/SPmatthewsH.htm)

 

 

(http://lauramartinez.wordpress.com/2009/05/)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  

 

O DESEMBARQUE DO IATE GRANMA: dezembro de 1956

(http://josecarlosalexandre.blogspot.com/2009_11_01_archive.html)

 

 

Fidel e Matthews naquele encontro. Essa imagem percorreu o mundo
 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
1957: O CORRESPONDENTE
DO NYT EM HAVANA E O COMANDANTE
CASTRO, CADA UM DELES SEGURANDO
DIFERENTES OBJETOS:
Mattews, papel e caneta, Castro,
fósforo e caixa de fósforos:
de forma “politicamente incorreta”,
os dois fumam – eles faziam História
 
(Sem a legenda desta Coluna, a foto está em:
 
OBS. - MATTHEWS, NASCIDO EM 1900, TINHA 57 ANOS QUANDO
CAIU NO RIO
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
HAVANA (CUBA): MENINAS UNIFORMIZADAS VÃO ÀS AULAS
 
 
 
 
 
 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
"Comemorado em Cuba Dia Nacional do Educador

HAVANA, Cuba, 22 dez
[2008] (ACN) Nesta segunda-feira, por ocasião do Dia Nacional do Educador, foi reconhecido o trabalho dos professores cubanos por parte do governo insular e da Federação das Mulheres Cubanas (FMC) (...)".
 
 
 
 
 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O CINEASTA DINAMARQUÊS LARS VON TRIER
 
COMEMORA CONQUISTA DA PALMA DE OURO
 
EM CANNES (FRANÇA), NO ANO 2000
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
"MUITO"-PÓS-ROBINSON-CRUSOÉ E IMEDIATAMENTE PRÉ-LOST:
 
O ATOR ESTADUNIDENSE TOM HANKS INTERPRETA NÁUFRAGO EM ILHA DESERTA
 
(Sem a legenda acima conferida, a foto de cena encontra-se, na Web, em:
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

 

 
 
 
 
 
MONIQUE EVANS, ATRIZ BRASILEIRA
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

"(...) A casa do velho Epifanio [Epifanio Díaz, camponês, de amizade sincera e um dos primeiros colaboradores de Fidel e da guerrilha, de acordo com J. A. Fulgueiras, logo antes] erguia-se solidária em Los Chorros, a sul do Purial de Jibacoa, na vertente norte da Serra Maestra. Na quinta não havia grandes elevações que possibilitassem o refúgio da guerrilha, embora pelo lugar em que se encontrava, facilitasse o acesso de qualquer veículo ou pessoa que não conhecia o caminho.

Fidel, que conhecia a lealdade e colaboração de Epifanio e de seus dois filhos, Enrique e Miguel, decidiu esperar nesse lugar o jornalista norte-americano e ao mesmo tempo realizar a primeira reunião com os principais dirigentes da planície oriental.

Filho de camponeses, e camponês ele também, Guerrita podia determinar as horas apenas olhando os astros. Por tal motivo, quando viu a lua no centro do céu, soube que, no domingo, 17 de fevereiro de 1957, quase estava terminando.
 

Foi então que deteve o veículo e disse que havia que continuar a pé. Matthews desceu do jipe e caminhou com os outro em meio da escuridão e do cício do grilo insone. Guerra Matos, conhecedor do caminho, ia à frente e o jornalista se guiava por seus passos, sem soltar o cachimbo nem as ânsias de chegar.

De repente apareceu diante deles o riacho Tío Lucas, que corria entre as árvores da Serra. Para chegar ao acampamento, era preciso atravessar o riacho de águas frias e as correntezas. René o explicou ao repórter do The New York Times e este respondeu com um gesto animador.
 
Matthews entrou brioso, mas em meio do riacho perdeu o equilíbrio e caiu na água. “Danou-se o norte-americano”! gritou Guerrita. Mas, apesar do surpreendente esbarrão, o jornalista levantou a pequena carteira que levava nas mãos, sem soltar o cachimbo da boca. Guerrita ofereceu-lhe a mão em sinal de ajuda e o norte-americano se incorporou com certos brios juvenis.
 
O riacho da Serra, que comprazia a Martí mais que o mar, se comporta como um cachorro faminto que lambe constantemente as pedras do fundo até deixá-las polidas. Matthews, ao que parece, não levou em conta o curso fluvial, e esbarrou como um clássico jogador de beisebol à procura da base.
Contudo, não perdeu a postura nem a inteireza, e com gesto elegante, exortou a prosseguir a viagem rumo ao acampamento, que, sem ele saber, apenas faltava uns poucos minutos. (...)".
 
 
TRECHO DE Marabuzal, RECENTE LIVRO DE JOSÉ ANTONIO FULGUEIRAS
 
 
 
 
          Para o Frei Betto,
          Lars von Trier, Tom Hanks, Monique Evans e José Antonio Fulgueiras,
          ao pesquisador, professor, editor e poeta Moacy Cirne,
          ao escritor, jornalista e autor cinematográfico Luiz Rosemberg Filho (*),                                         
          e em memória de José Agrippino de Paula    
 
 
(*) – BREVE DICA SOBRE SITE (VIAPOLÍTICA) ONDE ATUALMENTE ESCREVE
Luiz Rosemberg Filho: “Cineasta, videomaker, crítico de cinema e artista plástico, em Versus manteve Circo Cinematográfico, polêmica e iconoclasta coluna sobre filmes, cultura e sua relação com o poder. Na atualidade, assina a coluna semanal Cinema de Invenção, no site www.viapolítica.com.br e produz documentários em vídeo. Dirigiu, entre outros, os filmes Crônica de um industrial, Assuntina das Amérikas, e O Santo e a vedete. Foi roteirista de Adyos, General e Viva a morte 
 
 
 
 
 
 
                                                     
17.3.2010 – Homem ao rio! - No artigo de Frei Betto “Cinco homens e as relações Cuba-Eua”, publicado na revista Caros amigos [Ano XIII, nº. 149, agosto/2009, p. 33], é mencionada uma estória que se reconta muito. Trata-se de um episódio, por assim dizer, “pré-revolucionário”, ou já revolucionário -, ético e marítimo.
 
Escreveu Frei Betto, no citado artigo:
 
Durante a travessia do Granma, barco que, em 1956, conduziu, do México ao litoral de Cuba, 82 guerrilheiros que iniciariam os combates culminados na vitória da Revolução (1959), um deles, à noite, caiu no mar. Houve discussão a bordo. Uns opinavam que o desembarque não poderia sofrer atraso, sob pena de serem apanhados pela repressão. Em nome da causa se impunha o sacrifício do companheiro...
 
Fidel se opôs. Argumentou que a Revolução se faria para salvar vidas. Seria um contrassenso, grave erro ético, abandonar o náufrago ao infortúnio. O companheiro foi resgatado (...)”.
 
Quem foi o homem que caiu no mar? É o que se procurava descobrir, pesquisando-se no globalizante e inacreditável site de busca Google, quando eis que aparece na tela do microcomputador, traduzida para o idioma de José Agrippino de Paula, a entrevista histórica em que outro homem aparece caindo n’água, não no Oceano Atlântico, mas num rio cubano: o correspondente em Havana do The New York Times.
 
Como estórias revolucionárias são incessantemente contadas e recontadas, cabem perfeitamente – não seria preciso lembrar – neste espaço de crítica e discussão.
 
Na foto da entrevista, enquanto o lendário jornalista estadunidense Herbert Matthews (1900 - 1977, http://es.wikipedia.org/wiki/Herbert_Matthews) faz suas competentes anotações, Castro acende um bom charuto - um ótimo charuto nacional. Fica patente que tanto essas anotações, quanto o charuto de Fidel, são objetos que mereceriam ser expostos em espaço privilegiado do Museu da Revolução. Isso se o rebelde charuto não tivesse sido consumido, é claro.
 
Resta a pergunta: mas qual foi o cidadão que estava no iate Granma e caiu no Mar do Caribe no mesmo ano em que, na Europa Oriental, mais exatamente na Hungria, a insatisfação com "tacão soviético" - a expressão talvez seja "reacionário-burguesa", mas é ótima! - explodiu e foi militarmente reprimida? 1956 é o ano evocado. Nele nasceram personalidades como o criador cinematográfico dinamarquês Lars von Trier, o ator estadunidense Tom Hanks e a atriz, modelo e apresentadora de televisão carioca (Rio, Estado da Guanabara, Brasil) Monique Evans [eles são um ano menos novos do que o responsável por esta despretensiosa Coluna do portal Entre-textos].
 
EM TEMPO: "Granma" é gíria para a palavra VOVÓ, em inglês.
 
 
 
 
 
QUANDO A OBRA ESTIVER DISPONÍVEL, LEIA
Marabuzal, livro de José Antonio Fulgueiras!
 
LEIA A REVISTA BRASILEIRA Caros Amigos!
 
LEIA OS LIVROS DE Frei Betto!
 
LEIA OS LIVROS DE Herbert Matthews!
 
LEIA O JORNAL IANQUE THE NEW YORK TIMES!
 
E LEIA O JORNAL CUBANO-GOVERNISTA GRANMA!
 
 
 
 
 
 
A ENTREVISTA LEGENDÁRIA
 
GRANMA INTERNACIONAL Digital / Notícias - Havana, 20.7.2007
 
 
 
 
A entrevista legendária

“Visita ao rebelde cubano em seu refúgio”, assim intitulou o importante diário “The New York Times”, em sua edição de 24 de fevereiro de 1957, a primeira parte de uma reportagem que atraiu a atenção mundial, ao mostrar a guerrilha sobrevivente, liderada pelo comandante-em-chefe Fidel Castro na Serra Maestra  Fidel ordenou a Faustino Pérez, expedicionário do iate Granma, que descesse das montanhas à planície e que, entre as primeiras missões a cumprir, tentasse enviar um jornalista, mas os diretores das principais publicações se recusaram por medo das represálias. Contudo, nos primeiros dias de fevereiro, conseguiram que o destacado repórter Hebert Matthews, chegasse a Cuba...

(Extraído do livro em edição:  Marabuzal)
POR JOSÉ ANTONIO FULGUEIRAS
 
O caminho apareceu diante de Felipe Guerra Matos como uma corda lamacenta e enegrecida pela noite rural em Manzanillo. Felipe conhecia o caminho como a palma da mão e sabia muito bem onde estavam os cruzamentos da estrada como um reflexo condicionado pelas muitíssimas subidas e descidas. Seu jipe Willy assemelhava-se a um mulo de cascos firmes, domesticado para vencer os obstáculos que os aguaceiros dos últimos dias esculpiram no caminho rústico e estreito. 
A seu lado, mais ou menos acomodado no banco dianteiro, viajava o jornalista norte-americano Herbert Matthews, que segundo parece, tentava decifrar através do pára-brisa o caminho que o levaria  a um lugar desconhecido na Serra Maestra.
“Creio que não vai chover nesta noite”, disse o motorista em voz alta, inclinando a cabeça para um lado. Depois reparou que o norte-americano sabia pouco ou nada de espanhol. René Rodríguez, Javier Pazos, Quique Escalona e Nardi Iglesias, que também viajavam no banco traseiro também nada responderam.
Então, com o pouco conhecimento que tinha do idioma inglês, tentou enfiar na mente alguma frase para ganhar a amizade do repórter do The New York Times, famoso por seu trabalho como repórter em diversos países do mundo, participando como testemunha de alguns dos acontecimentos mais importantes do século.
O homem, na casa dos 60 anos, foi correspondente de guerra na Abissínia, na década de 30, e na Espanha, durante a Guerra Civil, que acabou com a República. Publicou vários livros e ganhou diversos prêmios, entre os quais, o John Moors Cabot, conferido pela Escola de Jornalismo da Universidade de Columbia.
Matthews era editor do The New York Times, e se destacava na redação de editoriais e reportagens especiais sobre a América Latina. Com mais de 1,80 m, magro, ligeiramente encorvado, olhos claros e olhar penetrante, Herbert Matthews, desde sua posição liberal, era considerado um dos jornalistas mais prestigiados e importantes nos Estados Unidos.
Mister, how do you feel here?, Guerrita queria perguntar, mas essa pergunta pareceu-lhe vulgar para uma pessoa tão experiente na arte das perguntas e respostas.
Saindo de Yara, uma patrulha da estrada os detém. Um guarda, com cara amarrada, aproximou-se deles e Guerrita, sem descer do veículo, respondeu-lhe antes que o homem lhe perguntasse:
— O senhor é um norte-americano rico que está interessado em comprar os campos de arroz de Gómez, disse, enfatizando a palavra rico e o sobrenome do burguês, muito conhecido na zona.
A frase era quase uma redundância para o patrulheiro, pois segundo os jornais e os filmes da época, todos os norte-americanos eram ricos. No entanto, o guarda, satisfeito com as facilidades que sua farda amarela lhe proporcionava para beber uma cerveja sem pagar em qualquer bar de Manzanillo e seus arredores, sabia que incomodar uma pessoa abastada era fatal para suas aspirações de ser promovido para sargento, então, como diria o poeta Amado Nervo, fez um gesto de cortesia e fechando os olhos os deixou passar.
Para Guerra Matos, depois do ardil efetivo, o mais importante era dirigir o melhor possível por aquele caminho inundado por causa das chuvas recentes e chegar ao destino.
Are you cold?, perguntou-lhe o norte-americano quando o viu fazer um gesto de quem sente um momentâneo calofrio. Mas o homem continuou absorto na escuridão e no pensamento. De vez em vez, quando absorvia o cachimbo que não afastava da boca; depois expirava a fumaça pouco a pouco.
Para chegarem a Matthews, os companheiros do Movimento 26 de Julho tiveram que transitar inteligentemente um caminho perigoso. A idéia foi de Fidel Castro, que com 82 homens tinha desembarcado, dois meses antes (2 de dezembro de 1956) pela praia Las Coloradas, na costa norte da província de Oriente.
Após serem surpreendidos pelo exército batistiano em Alegria de Pío, os jovens rebeldes se dispersaram por diferentes lugares da zona. Alguns foram presos ou assassinados às ordens do presidente Fulgencio Batista; outros puderam burlar o cerco e somente sete conseguiram reencontrar-se em Cinco Palmas, onde Fidel, com uns poucos fuzis tornou célebre em 1956 a frase mais otimista do século 20: “Agora sim ganhamos a guerra”!
Contudo, a imprensa cubana publicou a notícia de que Fidel foi morto e a guerrilha eliminada. E depois, censura total contra tudo o que e parecesse rebeldia.
Quando subia a montanha, Guerrita lembrou aquele fato:
“Entre os dias 9 e 11 de fevereiro de 1957, perdemos o contato com a Serra, até o dia em que o companheiro Radamés Reyes, telegrafista do quartel e aliado do Movimento 26 de Julho, chegou à loja de Rafael Sierra. Trazia a infeliz notícia de que Fidel e o grupo tinham sido liquidados numa emboscada em Los Altos de Espinosa.
“Rafael Sierra me informou e imediatamente transmiti a Celia aquela horrenda notícia. Com muito otimismo, ela disse: ‘Não acredito, pois a imprensa já o teria publicado. Temos que confirmá-lo, mas tenho certeza que ele estava vivo’.”
FIDEL ESTÁ VIVO!
“No dia seguinte, Miguelito, um filho de Epifanio, chegou e me contou o que tinha acontecido. Eles conseguiram fugir com Luis Crespo. E ele estava certo de que Fidel e outra parte do grupo também conseguiram burlar o cerco inimigo. Disse-me que Crespo, expedicionário do iate Granma, queria nos contatar.
“Celia ordenou-me que fosse buscá-lo. Crespo afirmou que Fidel estava vivo, pois viu que o comandante e o resto do grupo também fugiram”.
“Eu propus a Crespo que o melhor era que ele abandonasse a Serra e respondeu taxativamente: ‘Enquanto houver um fuzil aqui, a luta continuará’. Senti grande admiração pela atitude daquele homem semi-analfabeto, que em meio do desespero, mostrava os valores e a qualidade humana dos expedicionários do Granma.
“No dia seguinte, Miguelito retornou de novo a Manzanillo com a confirmação de que Fidel estava vivo e mandou um mensageiro, que esperava por nós na quinta de Epifanio para recolhê-lo, porque recebeu a ordem de se entrevistar com Celia. Fui buscá-lo e quando regressávamos, deparei na entrada de Manzanillo com um soldado da guarda rural que me pediu carona. Parei o carro e o levei. Entrei na cidade protegido por um guarda inimigo e festejando a vida de Fidel”.
Mas a ditadura de Batista se aferrava à notícia de que Fidel e seus homens tinham sido liquidados. Foi por isso que Fidel pediu um repórter, para que publicasse a notícia, mas os chefes da imprensa nacional tinham medo das represálias e por isso foi necessário buscar um jornalista de um jornal influente.
Ruby Hart Phillips, correspondente do The New York Times em Havana, mandou Matthews vir urgentemente para Cuba, pois tinha uma boa notícia para ele. Na segunda-feira, 4 de fevereiro, a senhora Phillips foi convocada para o escritório de Felipe Pazos, no prédio Bacardí, na rua Monserrate. Ali se encontravam também seu filho Javier Faustino Pérez e René Rodríguez, que explicaram à repórter o interesse de Fidel em receber um jornalista no coração da Serra Maestra.
Logicamente, Phillips se ofereceu de imediato, mas foi convencida de que não devia ser ela, pois as condições da viagem eram muito difíceis para uma mulher, e além disso, ela era a correspondente permanente no país e depois podia ser alvo de uma forte represália do regime de Batista.
No telefonema de Phillips e Matthews não se deram muitos detalhes, mas um jornalista experiente como ele sabia que se tratava de algo muito importante.
Cinco dias depois, Matthews, acompanhado de sua esposa Nancie, chegou à terra cubana. Em 15 de fevereiro, às 22h, hospedou-se no hotel Sevilla, com sua mulher, e se encaminhou para o oriente do país, com Faustino Pérez, que desde o primeiro momento trabalhou incansavelmente para executar a ordem que Fidel lhe tinha dado.
Faustino acompanhou o destacado jornalista até Manzanillo. Guerrita viu pela primeira vez o jornalista nessa cidade, em casa de Pedro Eduardo Saumell, e pensou que era um homem muito idoso para viajar pelo caminho difícil que o levaria à Serra. E por seu cachimbo e boné, segundo ele, parecia-se mais com um detetive privado ao estilo de Sherlock Holmes do que com um repórter com vigor e juventude para escalar, por exemplo, a Colina de la Derecha de Caracas, que se ergue majestosa, vestida com a verde folhagem da Serra.
Matthews e Nancie estavam cansados pela longa viagem, quase sem dormir, por toda a Rodovia Central. Somente detiveram-se em Camagüey para tomar o café da manhã. Depois continuaram rumo a Bayamo e entraram no trecho mais difícil, custodiado por várias patrulhas do exército. Seus visíveis traços de turistas estrangeiros lhe permitiram entrar em Manzanillo sem muitos contratempos, acompanhados por Faustino Pérez, Javier Pazos e Lilia Mesa.
À medida que a encosta e a água estagnada exigiam maior velocidade do motor do jipe, Guerrita olhava de esguelha o norte-americano, que tinha deixado sua esposa na casa do anfitrião, Saumell, em Manzanillo. Ele estava concentrado na direção do jipe, nas velocidades e no freio, evitando os saltos e as freadas abruptas. Contudo, de vez em vez, quando o jipe dava um grande salto como um cavalo ferido pelo ginete. Sempre que isso acontecia, Guerrita olhava para o rosto do norte-americano, tentando ver algum gesto de contrariedade, mas o homem aceitava sem alarde os saltos do jipe por causa do caminho alagado.
Esta era a terceira viagem no mesmo dia à quinta de Epifanio Díaz, camponês, de amizade sincera e um dos primeiros colaboradores de Fidel e da guerrilha depois do desembarque.
FAUSTINO O LEVOU A MANZANILLO E ALMEIDA FOI O PRIMEIRO A RECEBÊ-LO NA SERRA
A casa do velho Epifanio erguia-se solidária em Los Chorros, a sul do Purial de Jibacoa, na vertente norte da Serra Maestra. Na quinta não havia grandes elevações que possibilitassem o refúgio da guerrilha, embora pelo lugar em que se encontrava, facilitasse o acesso de qualquer veículo ou pessoa que não conhecia o caminho.
Fidel, que conhecia a lealdade e colaboração de Epifanio e de seus dois filhos, Enrique e Miguel, decidiu esperar nesse lugar o jornalista norte-americano e ao mesmo tempo realizar a primeira reunião com os principais dirigentes da planície oriental.
Filho de camponeses, e camponês ele também, Guerrita podia determinar as horas apenas olhando os astros. Por tal motivo, quando viu a lua no centro do céu, soube que, no domingo, 17 de fevereiro de 1957, quase estava terminando.
Foi então que deteve o veículo e disse que havia que continuar a pé. Matthews desceu do jipe e caminhou com os outro em meio da escuridão e do cício do grilo insone. Guerra Matos, conhecedor do caminho, ia à frente e o jornalista se guiava por seus passos, sem soltar o cachimbo nem as ânsias de chegar.
De repente apareceu diante deles o riacho Tío Lucas, que corria entre as árvores da Serra. Para chegar ao acampamento, era preciso atravessar o riacho de águas frias e as correntezas. René o explicou ao repórter do The New York Times e este respondeu com um gesto animador.
Matthews entrou brioso, mas em meio do riacho perdeu o equilíbrio e caiu na água. “Danou-se o norte-americano”! gritou Guerrita. Mas, apesar do surpreendente esbarrão, o jornalista levantou a pequena carteira que levava nas mãos, sem soltar o cachimbo da boca. Guerrita ofereceu-lhe a mão em sinal de ajuda e o norte-americano se incorporou com certos brios juvenis.
O riacho da Serra, que comprazia a Martí mais que o mar, se comporta como um cachorro faminto que lambe constantemente as pedras do fundo até deixá-las polidas. Matthews, ao que parece, não levou em conta o curso fluvial, e esbarrou como um clássico jogador de beisebol à procura da base.
Contudo, não perdeu a postura nem a inteireza, e com gesto elegante, exortou a prosseguir a viagem rumo ao acampamento, que, sem ele saber, apenas faltava uns poucos minutos.
O primeiro a recebê-lo foi o expedicionário Juan Almeida Bosque, que lhe explicou que Fidel se encontrava nesse momento no Estado-Maior e que chegaria ao amanhecer. Matthews simpatizou, desde o primeiro momento, com este homem que apoiava suas palavras na tradução de Pazos e lhe informou que a tropa dispunha de vários acampamentos.
A conversa demorou vários minutos, incorporando-se depois Ciro Frías e outros guerrilheiros. Almeida pediu a Matthews que descansasse um pouco. O norte-americano concordou e tirou do bolso uma caixa de fósforos, que sobreviveu do mergulho da madrugada e acendeu o cachimbo imutável.
Celia Sánchez lembrava:
Naquela noite, fomos caminhar para ver se encontrávamos uma pequena casa que víamos de dia. Íamos Fidel, Armando, Frank, Vilma e eu; e Luis Crespo que sempre estava perdido, e foi como guia. Não encontramos a casa; caminhamos tanto pela noite, que depois não soubemos voltar ao acampamento; deitamo-nos em pleno campo. Nessa madrugada chegou Matthews. Quando Universo chegou com a notícia, ordenamos-lhe que dissesse que Fidel estava em outro acampamento, que o esperasse ali. Almeida, Che e Raúl ficaram com o visitante.
No alvorecer, chegou ao acampamento o grupo liderado por Fidel. Vilma Espín, prestigiosa combatente da clandestinidade em Santiago de Cuba, que foi levada horas antes por Guerrita para o acampamento, e Javier Pazos, foram os tradutores, apesar de Fidel ter bom domínio do idioma inglês.
Raúl se adiantou ao grupo e cumprimentou o jornalista, anunciando a chegada de Fidel. Em seu diário de campanha, o então capitão Raúl Castro narrou o fato da maneira seguinte:
Chegamos ali e dei um abraço no “Flaco” (O Magro) — René Rodríguez —, que cumpriu realmente o que prometeu. Cumprimentei o jornalista e lembrando meu inglês elementar, lhe disse: How are you? Não entendi o que me respondeu e imediatamente chegou F (Fidel), que depois de cumprimentá-lo, sentou-se com ele na cabana e começou a entrevista, que, com certeza, será uma bomba (...) Enquanto corria a entrevista, o oficial Almeida triplicou a vigilância, tomando todas as medidas de segurança ao nosso alcance naquele lugar. Infelizmente esta é uma zona completamente a céu aberto e foi um atrevimento afastarmo-nos tanto de nossos queridos arvoredos. Se nos surpreendiam por causa de uma delação, o Movimento 26 de Julho sofreria um colapso, pois poderíamos perder alguns de nossos valentes homens.
Guerra Matos, por seu lado, o descreveu assim:
 “Vi Fidel chegar e cumprimentar o jornalista, e senti uma imensa satisfação, mas não a externei. Tinha contribuído com um grãozinho de areia para este encontro tão esperado por nosso máximo líder, que tinha uma grande importância, pois tornaria público ao mundo que Fidel estava vivo e a guerrilha pronta para o combate. Em todo o percurso, fiz todo o possível para que o norte-americano se sentisse o mais cômodo e seguro possível, pois se ele se arrependesse no último instante, isso marcaria minha vida para sempre.
“Quando escorregou no riacho, fiquei desapontado e não consegui fazer coisa alguma para impedi-lo. Mas o jornalista tinha muita determinação como nós  para chegarmos ao acampamento e nenhum bombardeio nos deteria. Percebi o entusiasmo de Fidel quando se dirigia a Matthews e esse regozijo o transmiti a meu coração.
 Fidel cumprimentou Matthews com cortesia e singeleza. Com muita naturalidade, sentou-se em frente do repórte do The New York Times e começou a entrevista.
Matthews, como jornalista experiente, havia pesquisado durante sua estada em Havana sobre a situação em Cuba, a repressão a que era submetido o povo e conhecia, também, muitos traços pessoais de Fidel e alguns dados de sua história revolucionária estudantil e sua participação, como líder, no ataque ao quartel Moncada, em Santiago de Cuba.
Apesar disso, ficou impressionado com a juventude de Fidel, mas, à medida que o ouvia, chegava à conclusão de que o chefe guerrilheiro era um homem invencível.
Fidel contou-lhe a odisséia do desembarque, quando foram apreendidos e assassinados muitos expedicionários, mas a tropa conseguiu reagrupar-se, consolidar-se e desferir-lhe nos dois meses de levantamento, várias derrotas ao exército de Batista.
 “Há setenta e nove dias que estamos lutando — expressou Fidel — e somos mais fortes do que nunca. Os soldados estão combatendo mal. Sua moral é baixa e a nossa não pode estar mais alta. Provocamos muitas baixas a eles, mas quando os prendemos, nunca os fuzilamos. Interrogamo-los, tratamo-los bem, ficamos com suas armas e seus equipamentos, e os libertamos.”
E mais para frente, acrescentou:
“O povo cubano ouve pela rádio todas as notícias referentes à Argélia, mas não ouve nem lê uma só palavra a respeito de nós, graças à censura. O senhor será o primeiro a falar-lhe de nós. Temos seguidores na Ilha inteira. Os melhores elementos, especialmente os jovens, são a nosso favor. O povo cubano é capaz de suportar qualquer coisa, menos a opressão.”
Fidel destacou ao jornalista que a ditadura estava empregando contra o povo armas munidas pelos EUA e acrescentou:
“Batista tem 3 mil homens com armas perseguindo-nos. Eu não lhe direi quantos homens tenho, por razões óbvias. O exército opera em colunas de 200 homens. Nós, em grupos de 10 a 40. É uma batalha contra o tempo, e o tempo está ao nosso favor.
Enquanto decorria a entrevista, René Rodríguez, com uma máquina fotográfica antiga que trouxe de Manzanillo, se graduava como correspondente de guerra. Com muito afã, focalizava o entrevistado e o entrevistador e apertava o obturador, enquanto Matthews, com traços ágeis e pouco legíveis, fazia apontamentos num caderno com capa preta.
Frank País, o grande líder clandestino, um pouco afastado, aproveitava o tempo dando manutenção às armas dos rebeldes, ação que se gravaria na memória de Che Guevara, que escreveu depois em seu diário:
“Não presenciei a entrevista, mas segundo me contou Fidel, o homem mostrou-se amigável e não fez perguntas capciosas. Perguntou a Fidel se ele era antiimperialista; respondendo-lhe que sim, que ele era, no sentido de almejar livrar sua pátria das cadeias econômicas, mas não de odiar os Estados Unidos e seu povo. Fidel  queixou-se da ajuda militar prestada a Batista, fazendo com que ele visse quão ridículo era pretender que essas armas eram para a defesa do continente, quando não podiam acabar com um grupo de rebeldes na Serra Maestra.”
O diálogo entre Fidel e Matthews se caracterizou pela sutileza do cubano, onde o humor e a originalidade apareciam nos momentos mais relevantes e mais difíceis. A tropa de rebeldes tentava, de qualquer jeito, impressionar o repórter, sem cair em alardes nem mentiras que pusessem em dúvida a veracidade, a existência real e a força da guerrilha.
Por isso, desde o início, Fidel deu a ordem de manter uma atmosfera marcial diante do repórter norte-americano e dar uma imagem de grupo que simulasse ser mais numeroso do que era realmente. Enquanto decorrria a entrevista, os rebeldes entrevam e saíam constantemente do acampamento, aparentando um maior número de pessoas. Isso correspondia à insinuação de Almeida a respeito da existência de vários acampamentos no entorno.
Alguns guerrilheiros, como Manuel Fajardo, passavam ao lado de Matthews, impedindo que ele reparasse em sua camisa completamente rasgada. Outro momento engenhoso, foi quando o então capitão Raúl Castro Ruz, após a chegada do combatente Luis Crespo, informou Fidel:
 — Comandante, chegou o enlace da coluna 2!
Fidel ao reparar na tramóia de Raúl, respondeu-lhe:
— Diga-lhe que espere que eu terminaecom o repórter.
A famosa entrevista durou ao redor de três horas. Matthews, visivelmente satisfeito, pediu para Fidel lhe autografar a agenda e assim conferir maior autenticidade aos dados obtidos. Fidel acedeu ao pedido e acrescentou a data do encontro histórico nesse dia.
A certa distância, Guerra Matos viu feliz a despedida do chefe guerrilheiro e do jornalista. Agora tinha uma ordem ainda mais complexa a executar: devia voltar a Manzanillo com Matthews em pleno dia. Javier Pazos o acompanharia no regresso, ao qual se somaria o jovem camponês Reynerio Márquez, que os dirigiria à casa de uma filha de Epifanio, ao lado do caminho do Jíbaro.
INTERCEPTADOS NOVAMENTE POR UMA PATRULHA DO EXÉRCITO
Guerrita contou:
“Depois da entrevista, mandaram-nos passar para cumprimentar Fidel. O comandante-em-chefe mostrou interesse em saber como foi a viagem do repórter, qual caminho tomaram, quais medidas de precaução foram tomadas e insistiu em que tinha que ser mais cauteloso ao voltar, a fim de impedir que acontecesse alguma coisa ao jornalista.
“Recordei a Fidel que o conheci dez anos atrás, quando dos fatos da campanha de La Demajagua.” Guerrita revelou que o Fidel da Serra Maestra era o mesmo homem convicto e convincente, porém ainda mais inspirado. Gesticulava e punha otimismo em cada uma de suas palavras, que eram capazes de alentar a pessoa mais desanimada.
“Fui para Cayo Espino, para a quinta de meu pai a fim de buscar o carro que ali estava. Voltei e recolhi o norte-americano na casa de Epifanio e às 13h estávamos já em Cayo Espino.
“Sirva o almoço ao jornalista e que ele goste muito. O norte-americano tem que sair daqui com barriga cheia e coração contente’, disse Guerrita com tom de brincadeira a sua mãe e seu pai, camponeses admiradores e colaboradores das forças do Movimento 26 de Julho.”
Enquanto a família de Guerra Matos aprimorava a refeição cubana típica para satisfazer o visitante, o repórter apenas mastigou um pedacinho de frango e, com a maior cortesia do mundo, proferiu, para supresa de todos, cinco palavras que fizeram mudar completamente o itinerário:
Please, take me to Manzanillo. (Por favor, me leva a Manzanillo).
          Guerrita não percebeu nesse momento que o pensamento do jornalista estava muito longe de seu estômago, e sua maior fome se concentrava na notícia que tinha gravada em sua cabeça e nos papéis que guardava zelosamente nos bolsos da camisa.
          Uma patrulha do exército interceptou-os novamente na rodovia, mas Guerrita conseguiu desinformá-los outra vez. Ao redor das 17h, chegaram à casa de Saumell, onde sua esposa Nancie o esperava sentada na sala.
          No limiar da porta, com breves palavras, Matthews propôs a Nancie partir imediatamente para Santiago de Cuba. Subiram apressados no carro que os levaria para o lugar. Viajaram de Santiago de Cuba para Havana num avião e no dia seguinte, o casal de norte-americanos foi para Nova Iorque.
          Ao embarcar no avião, Nancie parecia mais gordinha que ao chegar. Será que teria abandonado seu regime, por causa da atraente comida cubana? Nada está mais longe disso. A esperta mulher havia colocado sob a roupa os papéis com todos os apontamentos que fez Matthews de sua entrevista histórica com Fidel. Enganaram, com discreta artimanha, os inspetores da alfândega e a rede dos ferozes membros do Sistema de Inteligência Militar de Batista.
          Guerrita, por sua parte, continuou cumprindo suas tarefas, ora como mensageiro ora no translado de combatentes para a Serra Maestra. No mesmo dia em que Matthews abandonou Manzanillo, ele se encarregou de levar para a quinta de Epifanio Díaz mais três expedicionários do iate Granma, dispersos durante o desembarque.
          Dias depois da partida do repórter para os Estados Unidos, Guerrita examinava diariamente os jornais à espera de um artigo escrito por Matthews. E no domingo, 24 de fevereiro de 1957, reparou que nas manchetes do El Diario de la Marina apareceu este título de grande impacto:
O IMPACTO DAQUELA ENTREVISTA FOI IMPRESSIONANTE
Fidel está vivo!
E mais abaixo, o seguinte sumário:
Entrevistado por Matthews, do “The New York Times”, na Serra.
          “Rebelde cubano é visitado em seu esconderijo”, aparecia depois na cabeça da página. E depois, a foto do chefe guerrilheiro com um fuzil de mira telescópica e a cópia fotostática do autógrafo que Fidel assinou na agenda do jornalista.
          Guerrita, sentado no volante de seu jipe, começou a ler minuciosamente  o artigo escrito por Matthews no The New York Times, que foi reinserido pelo El Diario de la Marina em suas páginas.
          Matthews começava sua reportagem com esta afirmação:
          “Fidel Castro, o chefe da juventude cubana, está vivo e está combatendo fortemente e com sucesso nos inóspitos e quase impenetráveis bosques da Serra Maestra, no extremo sul da Ilha.
          “O presidente Fulgencio Batista mantém seu exército nessa região, mas os militares estão travando uma batalha, até agora, perdida para destruir o inimigo mais perigoso, ao qual o general Batista teve que enfrentar em sua longa e difícil carreira como líder e ditador cubano.
          “Esta é a primeira notícia certa de que Fidel Castro ainda está vivo e em Cuba. Ninguém relacionado com o mundo exterior, e ainda menos com a imprensa, viu o senhor Castro, exceto este repórter. Ninguém em Havana, inclusive na Embaixada dos Estados Unidos, com todos seus recursos para a recopilação de informação, saberá até ser publicado este artigo que Fidel Castro está realmente na Serra Maestra.”
          Matthews não escondeu neste artigo sua repulsa pelo regime de Fulgencio Batista e manifestou categoricamente: “Fidel Castro e seu Movimento 26 de Julho são o símbolo inflamado da oposição ao regime”.
          Mais adiante argumentou: “Para facilitar meu acesso à Serra Maestra e meu encontro com Fidel Castro, dezenas de homens e mulheres em Havana e na província de Oriente correram verdadeiramente um grande perigo”.
          Guerrita pensou que aquele homem de bonê e cachimba estava referindo-se a ele, e que em nenhum momento transpareceu que sabia do grande perigo que corriam ao levá-lo para se encontrar com Fidel. Por isso, quando releu a linha: “um grande perigo”, cresceu sua admiração pelo repórter veterano.
          Continuou lendo e deparou que Matthews fazia um esboço biográfico de Fidel desde o ataque ao quartel Moncada até a expedição do iate Granma. Depois, referiu-se  às diversas versões em torno da provável morte de Fidel, que desmentiu taxativamente. A seguir, informou de sua entrevista com Fidel e concluiu com uma breve referência a sua saída para Nova Iorque.
          Dias depois, Guerrita deleitou-se novamente com mais dois artigos de Matthews, em que examinava a situação atual de Cuba.
          O governo de Batista não teve outra alternativa que suspender a censura da imprensa. Ao que parece, tinha reconsiderado isso a partir da publicação dos artigos de Matthews, uma vez que estes poderiam ser aproveitados pela imprensa internacional para causar um grande escândalo e pôr em ridículo seu regime.
          Por isso, os principais órgãos de imprensa de Cuba reproduziram os artigos de Matthews, ao passo que o ministro da Defesa, Santiago Verdeja, emitia algumas declarações em que qualificava as notícias de Matthews como os capítulos de um romance fantástico.
          “O senhor Matthews não se entrevistou com o tal insurgente”, ressaltava.
          O porta-voz governista impugnava a autenticidade da foto de Fidel e fundamentava sua dúvida com estas palavras:
          “Parece ingênuo que, apesar de ter tido a oportunidade de se embrenhar naquelas montanhas e ter realizado a entrevista, não se retratasse com ele para confirmá-lo.”
          Guerrita sabia que René lhe tinha tirado algumas fotos a Matthews e a Fidel quando conversavam na Serra Maestra. Talvez, pensou, os negativos se tivessem arruinado ou não tivessem a melhor qualidade para serem visíveis nas páginas de um jornal. Lembrou que Frank subiu também com uma máquina fotográfica, mas não se lembra dele tirando fotografias.
          O regime batistiano tentava por todos os meios negar a veracidade da entrevista de Matthews com Fidel, a qual se espalhava por toda a Ilha. Aos depoimentos de Verdeja somaram-se os do chefe militar da província de Oriente, Martín Díaz Tamayo, que declarou à imprensa cubana: “É absolutamente impossível cruzar as linhas onde há tropas. A entrevista é história”.
          Em 28 de fevereiro, como um facão no pescoço dos sicários de Batista, El Diario de la Marina mostrava, tirada do The New York Times, na capa a foto esperada em que apareciam Matthews e Fidel dialogando. A foto instantânea, que à velocidade da luz percorreu o mundo, mostrava à esquerda o repórter fazendo apontamentos. À direita, de perfil, o comandante-em-chefe Fidel Castro, com seu boné verde-olivo e sua barba de guerrilheiro, acendendo um charuto cubano, cujas chamas aclaravam as pupilas esperançosas das camadas mais humildes do povo.
          Guerrita matos tirou seus óculos e enxugou-os com a ponta da camisa. Depois, pô-los novamente para poder apreciar com mais nitidez a foto tirada por seu companheiro René Rodríguez. Então mostrou um leve sorriso, arrancou o carro e partiu às pressas para a Serra Maestra".
 
 
 
 
Granma

 

 

 

 

 

 

 

Iate Granma

(http://www.socialismo.org.br/portal/historia/150-noticia/668-desembarque-do-granma-impulso-definitivo-a-revolucao-cubana)

 

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ARTIGO ATINENTE DE JULIE PÊCHEUR, do conceituado jornal parisiense Le Monde,

tal como sua tradução para a língua portuguesa, a cargo de Luiz Roberto M. Gonçalves,

consta no blog ACERTO DE CONTAS 

 

"O retrato de Herbert Matthews...

 

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Em fevereiro de 1957, Castro foi dado como morto depois de um desembarque catastrófico em Cuba. Perdido na montanha com um punhado de rebeldes, ele parecia condenado ao esquecimento. O encontro com um jornalista do “The New York Times” iria lhe conferir uma estatura internacional.

por Julie Pêcheur
do Le Monde

Durante sua última viagem aos Estados Unidos, por ocasião da Cúpula do Milênio da ONU, em setembro de 2000, Fidel Castro encontrou tempo para ir ao “The New York Times”. Enquanto percorria os corredores do célebre jornal, diante dos retratos de personalidades que marcaram o século, ele exclamou de repente: “Onde está o retrato de Herbert Matthews? Esse sim era um jornalista!” Mas, apesar de 36 anos de serviço como grande repórter e editorialista, Matthews não faz parte das lendas oficiais do “New York Times”.

Por outro lado, a 2.500 quilômetros de Manhattan, no Museu Nacional da Revolução em Havana, o jornalista americano encontrou lugar em uma vitrine, em meio a uniformes militares, retratos de revolucionários e velhos fuzis. O vemos em uma pequena foto preto-e-branco, sentado em plena floresta, de charuto nos lábios e caderno na mão. Ao seu lado, o jovem Fidel Castro também acende um charuto.

“Desembarque patético”
Essa cena pouco conhecida ocorreu em fevereiro de 1957, no crepúsculo úmido da Sierra Maestra, uma região montanhosa no leste de Cuba. Três meses antes, Castro ainda se encontrava no México, onde se havia exilado depois de passar um ano e meio na prisão por sua participação, em 26 de julho de 1953, no ataque de La Moncada, um quartel do exército de Batista em Santiago. Convencido de que os cubanos, desesperados com a violência e a corrupção do regime, estavam prestes a se rebelar, ele havia elaborado e divulgado publicamente um plano muito simples: desencadearia uma insurreição popular em todo o país, fazendo coincidir seu desembarque no sudeste da ilha com um levante previsto em Santiago de Cuba.

Em 25 de novembro de 1956, Fidel Castro e 81 companheiros embarcam em um velho iate, o Granma. Sacudido pelo mar forte e chuvas torrenciais, a frágil embarcação se perde nos manguezais cubanos e chega dois dias atrasada. As metralhadoras de Batista a esperam. Informado do projeto, este último já esmagou sem dificuldades o levante de Santiago. É uma hecatombe. Os corpos de Raúl e Fidel Castro são oficialmente identificados e enterrados pelo exército.

No entanto, uma dezena de sobreviventes – entre os quais os irmãos Castro e Ernesto Guevara – consegue chegar às montanhas. Em 4 de dezembro de 1956, um editorial do “The New York Times” intitulado “Os violentos cubanos” se interroga sobre o objetivo desse “desembarque patético de cerca de 40 jovens que se consideram um exército invasor”. O editorialista não se conforma que o chefe dessa aventura, Fidel Castro, pudesse deliberadamente revelar seus planos antes da operação. “Pode-se imaginar uma coisa mais idiota?”, ele se interroga, antes de concluir: “Não há a menor chance de que uma revolta tenha sucesso nas atuais circunstâncias”, referindo-se ao poderio militar de Batista.

Instinto intacto
Efetivamente, um mês depois, o pequeno grupo que sobrevive na floresta com a ajuda de camponeses locais parece condenado ao esquecimento. A imprensa cubana estava censurada e Castro compreende que deve contatar a imprensa estrangeira para convocar a opinião pública para sua causa. Ele envia um mensageiro a Ruby H. Phillips, a correspondente do “New York Times” em Havana. Conhecida demais das autoridades locais para realizar pessoalmente essa reportagem, Phillips contata o jornal em Nova York, que então envia Herbert Matthews.

Disfarçados de turistas, Matthews e sua mulher, Nancy, partem para a província de Oriente, onde se encontram os homens de Castro na cidade de Manzanillo. Ao cair da noite, os rebeldes conduzem Matthews através dos canaviais e escapam de uma barreira do exército fazendo-o passar por um rico investidor americano. Terminam atravessando a floresta a pé. A subida é íngreme, o terreno escorregadio. Sim, Matthews já viu outros: ele cobriu a Guerra Civil espanhola, a campanha da Itália… Mas, aos 57 anos, esse homem alto e magro não está mais em sua melhor forma.

Seu instinto está intacto, porém. Enquanto espera a noite toda, sentado sobre um cobertor, pela chegada do chefe dos rebeldes, Matthews pressente que talvez se trate de um momento histórico. De fato. O jovem Fidel Castro chega finalmente e lhe dá uma entrevista de três horas – o “furo” de sua vida. “Havia uma reportagem a escrever e uma censura a vencer”, escreveu Matthews em suas “Memórias”. “Foi o que fiz, e nem Cuba nem os Estados Unidos seriam os mesmos depois disso.” Dois dias depois, Nancy esconde em sua cinta as anotações do marido, que trazem a assinatura de Castro como prova de autenticidade, e os Matthews voltam aos Estados Unidos. Em 24, 25 e 26 de fevereiro de 1957 o “New York Times” publica três grandes artigos, dois deles na primeira página. Eles descrevem em detalhe a corrupção do regime Batista e as atrocidades cometidas pelo exército, ao mesmo tempo denunciando o apoio militar e diplomático dos Estados Unidos ao regime.

Rebelde carismático
Essa análise recusa categoricamente a linha oficial que faz de Cuba uma ilha próspera e dócil governada por um regime favorável aos interesses americanos – visão que perdura entre o governo e o público americanos, apesar dos sinais crescentes de forte descontentamento popular. Matthews elogia todos os grupos de oposição, mas diferencia e promove ao primeiro plano Fidel Castro e o Movimento 26 de Julho (dia em que, três anos e meio antes, Castro atacou La Moncada). Ele está convencido por esse rebelde carismático de 30 anos. Afirma que seu programa político é vago, matizado de nacionalismo, de anticolonialismo e antiimperialismo, mas salienta que Castro não sente qualquer animosidade em relação aos Estados Unidos. O jornalista estima que esses rebeldes são portadores de “uma mudança radical e democrática para Cuba, e portanto anticomunista”. Enfim, ele anuncia que os guerrilheiros “dominam” militarmente a Sierra Maestra e humilham regularmente a flor do exército cubano. Ele cita Fidel Castro descrevendo suas tropas, “grupos de dez a 40 combatentes”, e ele mesmo avalia o entorno do guerrilheiro em cerca de 40 homens. Na realidade, o Movimento 26 de Julho não tem mais que 18 combatentes, motivados e solidamente idealistas, mas mal armados e completamente isolados.

Dois anos depois, Castro contaria no Overseas Press Club, em Nova York, diante de um Herbert Matthews um pouco incomodado, que enganou o repórter: durante a entrevista seus homens trocaram de roupa e giraram ao redor do jornalista para dar a impressão de que eram mais numerosos. Raúl chegara a interromper a entrevista para dar notícias de uma “segunda coluna” imaginária.

Irritado com os artigos do “Times”, Arthur Gardner, o embaixador dos Estados Unidos em Havana, se apressa a tranqüilizar Washington: “Batista tem a situação “sob controle”. O comandante militar da província de Oriente, cujos homens são encarregados de eliminar os últimos rebeldes, afirma que “as declarações desse jornalista americano são absolutamente falsas, pois é fisicamente impossível ir à região onde a entrevista imaginária teria ocorrido, pois “ninguém pode penetrar nessa zona sem ser visto”. “Na minha opinião”, ele conclui, “Matthews nunca pôs os pés em Cuba.”

Na ilha, porém, as reportagens têm o efeito de uma bomba. Castro, que enviou um de seus homens a Nova York para fotocopiá-las com urgência, manda distribuir às escondidas milhares de cópias em Havana e em Santiago de Cuba. Alguns dias depois, Batista suspende temporariamente a censura, permitindo que as rádios e os jornais locais comentem os artigos do “Times”: assim, todos os adversários do regime ficam sabendo que Castro está vivo e que a luta continua. Uma propaganda inesperada. Para salvar a face, o ministro da Defesa cubano declara então que “o senhor Matthews não entrevistou o rebelde comunista Fidel Castro” e que “a entrevista e as aventuras descritas pelo correspondente Matthews podem ser consideradas um capítulo de um romance de ficção”. Ele se surpreende de que o repórter não tenha aproveitado para se fazer fotografar junto com Castro para autenticar essa fábula. “The New York Times” se apressa então a publicar a declaração do ministro, acompanhada da foto tirada por um dos rebeldes, hoje exposta no Museu de Havana. Batista está convencido de que se trata de uma montagem.

Mas o presidente do Banco Nacional de Cuba entendeu. Então ele lhe sussurra: “Se está publicado no ‘New York Times’, é verdade em Nova York, é verdade em Berlim, em Londres e em Havana. Você pode ter certeza de que o mundo inteiro acredita nessa história”. A seqüência é conhecida. Em 8 de janeiro de 1959, depois de dois anos de combates, Fidel Castro faz uma entrada triunfal em Havana com milhares de guerrilheiros. Já faz dois anos que Herbert Matthews, que se tornou o “senhor Cuba” no “New York Times” desde aquela famosa entrevista, escreve quase todos os artigos e editoriais sobre o assunto. Ele nunca se afastou de sua primeira impressão: Castro não é um comunista, repete. Ele implora que os americanos ignorem seu mau humor e suas declarações intempestivas. Chega a lhes pedir que apóiem essa revolução social e adverte que, no contexto da Guerra Fria, a deterioração das relações com Cuba faria a ilha cair na trama dos comunistas, que já tentam se apropriar da revolução.

Responsáveis pelo fracasso
Mas em 1960 a linha vermelha é cruzada: a reforma agrária fere diretamente os interesses econômicos americanos e as relações diplomáticas ficam perigosamente tensas. No “New York Times”, Matthews é gradualmente marginalizado, considerado culpado de subjetividade. Ele continua escrevendo editoriais, mas não é mais enviado a Cuba. Em janeiro de 1961, o presidente Eisenhower rompe relações diplomáticas com Havana; a revolução desliza para o comunismo – os Estados Unidos perderam Cuba. Para a direita americana, os aliados de Batista e a imprensa conservadora, Herbert Matthews e “The New York Times” são e continuam sendo até hoje os responsáveis por esse fracasso.

Em 1960, o embaixador Earl T. Smith, que substitui Gardner, acusa o jornalista de ter influenciado o Departamento de Estado americano. Diante do subcomitê do Senado para assuntos internos, ele anuncia que as reportagens do “New York Times” “permitiram que Castro adquirisse uma estatura internacional e um reconhecimento mundial. Até então havia sido apenas mais um bandido nas montanhas de Oriente …”. No mesmo ano, uma caricatura publicada na revista conservadora “The National Review” mostra Castro montado em Cuba, com a legenda “Encontrei meu emprego no ‘New York Times’”. Em uma carta dirigida a seu amigo Ernest Hemingway, encontrada durante a Guerra Civil espanhola, Matthews conta que manifestantes se reuniram diante do prédio do “New York Times” para protestar contra ele. “O que tenho sofrido ultimamente!”, ele se queixa. Está profundamente decepcionado com o rumo que tomam os acontecimentos, tanto em Cuba quanto nos Estados Unidos. Mas continua convencido de que não se enganou, que Castro não é comunista, que operou uma aproximação pragmática com esse partido somente a partir de 1960.

Depois de ter recebido ameaças de morte, o jornalista é colocado sob a proteção do governo. Ele deve deixar precipitadamente a tribuna da Universidade do Novo México depois de um alerta de bomba. Também é excluído da Associação Interamericana de Imprensa e prefere evitar o Overseas Press Club. Em 1965 o próprio Eisenhower o acusa de ter “quase sozinho” feito de Castro “um herói nacional”.

Mesmo depois de sua morte, em 1977, 20 anos depois de seu encontro com Fidel Castro na Sierra Maestra, Matthews continuou sob o ataque dos conservadores. Em 1987, William Ratliff, um pesquisador do Instituto Hoover da Universidade Stanford, ainda diria: “Raramente na história um único escritor teria dado o tom com tanta influência (…) quanto a um personagem, um movimento, um fenômeno histórico”. Herbert Matthews sempre negou ter “feito” Castro. Aos olhos dele, tratava-se apenas de “um homem prometido a um destino fora do comum, que teria acabado se impondo de qualquer maneira”. É muito provável. Mas os artigos do “New York Times” talvez tenham acelerado o curso da história.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves".

(http://acertodecontas.blog.br/politica/como-o-new-york-times-inventou-fidel-castro/