[Maria do Rosário Pedreira]

Quando eu era miúda, havia em Portugal muito pouca coisa que pudéssemos ler, sobretudo se tivermos como termo de comparação o excesso que hoje existe. Lembro-me de irmos com a minha avó a uma papelaria chamada Perdiz na rua onde morávamos e de o senhor nos aconselhar, a mim e ao meu irmão mais novo, algumas leituras. Num dos últimos sábados, recordei, de resto, com detalhe uns livrinhos de capa cartonada ali comprados, que eram uma série de biografias de homens e mulheres ilustres, destinadas sobretudo a rapazes, mas que – provavelmente por as preferir às histórias que me cabiam em sorte – também eu li na infância. E dessa colecção faziam parte Pasteur ou Marie Curie, mas também os presidentes Washington e Lincoln (tenho ideia de que eram traduções de edições americanas). Ora, foi justamente por ter ido nesse sábado ver o filme de Spielberg, Lincoln (gostei muito), que de repente me vieram à memória algumas coisas que lera nesse velho livro do meu irmão (salvo erro de capa arroxeada) e comecei a tentar compor na minha cabeça a colecção completa. Tive então, sei lá porquê, saudades desse tempo em que a avó nos levava à Perdiz e tudo parecia mais fácil, especialmente porque éramos pequenos e das dificuldades se ocupavam naturalmente os crescidos. E, de repente, perguntei-me se hoje os miúdos ainda lêem biografias de gente inspiradora (que também são contos de proveito e exemplo) e têm ídolos que não sejam figuras de duas dimensões retiradas dos ecrãs de TV e dos jogos da PlayStation.