Muitos acham que a máxima “navegar é preciso, viver não é preciso”, celebrizada por Fernando Pessoa, admite mais de uma interpretação. Para uns, ela pode assumir conotação matemática: o vocábulo “preciso” denota exatidão, certeza. Nesse caso, navegar seria algo exato: não havendo desvio de rota, quem parte sabe exatamente aonde deveria chegar. Viver, contrariamente, não está submetido a nenhuma regra matemática, depende da vontade da natureza ou do criador. Para outros, quereria significar a expressão uma necessidade, quem sabe uma exigência natural: navegar é necessário, viver não é. A serem verdadeiros os fatos que apontam o contexto histórico – por volta dos anos setenta antes da era cristã, tempestades aconselhavam o comandante a adiar a partida de seus navios, cuja finalidade seria escoltar uma frota com provisões para Roma que, à época, passava fome em decorrência de uma greve de escravos liderada por Espártaco – como fonte da frase que ficaria famosa “Navigare necesse, vivere non est necesse”, propalada, na oportunidade, pelo general romano Pompeu aos assustados marinheiros por conta das tormentas, fica afastada, praticamente, sua hermenêutica matemática. Em texto que lemos outro dia, físicos e cosmonautas de plantão tentavam dar nova versão ao “big bang” – evento que teria originado o universo -, desconstruindo a ideia, até então vigente, de “grande explosão”, afirmando que isso não ocorrera, uma vez que, segundo a mais recente interpretação das pistas deixadas por “ondas gravitacionais” produzidas em uma fração de trilionésimo de trilionésimo de trilionésimo de segundo, há quase quatorze bilhões de anos – antes, pois, do surgimento do tempo, senão de sua mensuração como é hoje -, o que acontecera teria sido um aumento, um crescimento, uma expansão absurda da matéria e energia infinitas contidas em um ponto microscópico singular, sem conceito definido. Fica valendo essa conclusão, enquanto outros cientistas não expõem novas teses contestando tudo o que há de descoberto ou conhecido; ou estudiosos das religiões não aproveitam instante de dubiedade e ceticismo de alguns para publicarem ensaios ou tratados em que insistirão com a afirmação de que o cosmos, de fato, teria sido criado por um ser superior. Quanto a nós, mortais comuns, provavelmente, continuaremos testemunhando o mais comum dos círculos viciosos, ou melhor, virtuosos: a terra girando, ininterruptamente, e cada um assistindo, diuturnamente, o renascer ou surgimento do sol no oriente e seu pernoite ou desaparecimento no ocidente. Como se fosse um anacoluto em relação aos dois parágrafos anteriores, uma citação ao final do artigo que, temporariamente, punha fim à suposta tese do “big bang”, uma conclusão atribuída a Charles Darwin, atinente, ainda, ao tema discutido – origem e evolução da existência de tudo que se conhece-, pareceu-nos eivada de acachapante simploriedade. Afirma o texto que aquele estudioso, desafiadoramente, teria ameaçado rasgar sua teoria da evolução se alguém lhe apontasse um único ser vivo sem antepassado. Se isso não foi um blefe hiperbólico, nem uma ideia pespegada de um contexto estranho, haver-se-ia de tomar a famosa teoria como uma proposição absurdamente abrangente e, portanto, extremamente vaga e imprecisa. Ora, de fato só existiria “ser vivo” sem antepassado – tomando-se por semântica do termo expressões como o que viveu antes, antecessor, o predecessor – se ele fosse eterno, infindo, imortal, infinito. Para os crentes, e tudo indica que Darwin não era um deles, um único “ser”, “ente”, preencheria esses requisitos: Deus, o Criador do universo e de tudo que há nele. Ou seja, até que se chegue a um conceito definitivo, preciso, matemático sobre Verdade, cada um, filosoficamente, vai tendo ou tecendo o seu a respeito da sua. Antônio Francisco Sousa – Auditor-Fiscal ([email protected]