[M. T. Piacentini]

Solicitou-me uma aluna de Direito da UFSC que discorresse sobre a regência do verbo visar, uma vez que ela tinha escrito “tal medida visa o bem comum” e seu professor, num excesso de zelo, corrigiu a frase para “visa ao bem comum”.


Com efeito, professores mais conservadores ensinam que “visar”, como verbo transitivo direto, tem o sentido apenas de dirigir a pontaria ou pôr o visto em: Visou o alvo, está visando a refém; visaram o cheque, visou o passaporte. Já com o sentido de ter em vista, pretender, objetivar, deve-se usar o mesmo verbo com a preposição A. Neste caso, visar torna-se transitivo indireto: O regulamento do condomínio visa à comodidade de todos e ao bem-estar coletivo. Visamos a garantir sua segurança.


Mas existe o dinamismo do idioma a ser considerado. “A regência, como tudo na língua, a pronúncia, a acentuação, a significação, etc., não é imutável. Cada época tem sua regência, de acordo com o sentimento do povo, o qual varia, conforme as condições novas da vida. Não podemos seguir hoje exatamente a mesma regência que seguiam os clássicos; em muitos casos teremos mudado” (Antenor Nascentes, 1960, apud Celso P. Luft, Dicionário Prático de Regência Verbal, 1987:534).


Esse é o caso do verbo visar, que vem perdendo a preposição, sobretudo antes de um infinitivo, como nestes exemplos:


Sua missão visava encontrar resposta para o imponderável.

Foram implementadas medidas políticas que visavam regular a sociedade, produzindo sujeitos disciplinados, produtivos, hierarquizados.

O princípio da razoabilidade visa, ademais, impor valores.


Mesmo diante de substantivo, a forma direta tem tido a preferência:


As artes visam a expressão do belo e o despontar da sensibilidade.

A divulgação deve ser impessoal, visando unicamente o interesse público.


Essa regência já está abonada por bons dicionários e bons autores, como Domingos Paschoal Cegalla: “Entretanto, nessa última acepção [de ter em vista, objetivar] não é sintaxe condenável dar ao verbo visar objeto direto” (Minigramática da Língua Portuguesa, 1996), e Celso Cunha/ Lindley Cintra: “Esta última construção [com objeto direto], condenada por alguns gramáticos, é a dominante na linguagem coloquial e tende a dominar também na língua literária, principalmente quando o complemento vem expresso por uma oração reduzida de infinitivoO ataque visava cortar a retaguarda da linha de frente” (Nova Gramática do Português Contemporâneo, 1985).


Devo esclarecer que este último exemplo é de Euclides da Cunha. Quem não costuma usar a preposição, portanto, está bem acompanhado!


PENALIZAR

Depois da discussão sobre deletar e protocolar, questionou-se a utilização de "penalizar". Devo dizer que é lícito, sim, empregar este verbo no sentido de “apenar, punir, infligir pena a”, conforme registram alguns dicionários. Como verbo transitivo direto que é, também pode ser usado na voz passiva. Exemplos:


Pelo art. 304 do CBDF, será penalizado com multa de 40 a 200 ORTNs o clube que incluir em sua equipe atleta sem condição de saúde para a partida.

A ré interpôs recurso de apelação, alegando que não pode ser penalizada por erro a que não deu causa.

Os meios de comunicação de massa atacam a benevolência da justiça e a falta de severidade das penas, fazendo ressurgir as teorias que penalizam infratores cada vez mais jovens e reacendem o debate sobre as vantagens dos castigos extremos.