[M. T. Piacentini]

No Brasil é grande a preocupação com a crase, mas poucas pessoas se dão conta de que conhecer bem o artigo é imprescindível para se fazer bom uso do acento indicativo de crase. O artigo é a palavra que introduz o substantivo, indicando-lhe o gênero (masculino/feminino) e o número (singular/plural).


O artigo definido – o, a, os, as – individualiza, determina o substantivo de modo particular e preciso. Designa um ser já conhecido do leitor ou ouvinte. Exemplos:


O violino está desafinado. [referência a um instrumento específico, seja o meu ou o seu, enfim aquele já mencionado]

A lâmpada queimou. [a apontada ou a única no local]

Falei com os meninos. [meninos já conhecidos do falante]

Vimos as estrelas no telescópio. [as estrelas de que falávamos antes]


O artigo definido também é empregado para indicar a espécie inteira; isto é, usa-se o singular com referência à pluralidade dos seres:


O homem é mortal.  [ = todos os homens]

A acerola contém grande quantidade de vitamina C.

Dizem que o brasileiro é cordial.


O artigo indefinido 
– um, uma, uns, umas – determina o substantivo de modo impreciso, indicando que se trata de simples representante de uma dada espécie. Designa um ser ao qual não se fez menção anterior. Exemplos:


Um violino está desafinado. [um dentre os vários da orquestra]

Uma lâmpada queimou. [uma das diversas existentes no local]

Falei com um menino. [não é particularizado]

Vimos uma estrela no telescópio. [uma representante da espécie]

Marcos deve ter uns quarenta anos. [aproximação]


Por questão de estilo, evita-se a utilização frequente de um, uma. O abuso do artigo indefinido torna a frase pesada e deselegante. Observe nos períodos abaixo como certos artigos são desnecessários:


A menina ganhou (uns) lindos brinquedos.

Recebemos do interior de São Paulo (uns) pêssegos maravilhosos.

O funcionário está respondendo a (um) processo por malversação de dinheiro.

“Sou muito feliz por ter (uns) pais como vocês”, escreveu a criança.

Ter (uma) boa saúde é fundamental.

Colocar um coração de (um) babuíno em um recém-nascido foi (um) ato tão ousado quanto atravessar o Atlântico a nado.


É mais elegante deixar fora o artigo indefinido antes de pronome de sentido indefinido, como "tal, certo, outro":


Vi Laura em (uma) tal consternação que achei melhor ficar quieto.

Encontrei (uma) certa resistência quando sugeri que discutíssemos o assunto em (uma) outra ocasião. 

Acabei não mencionando (um) outro caso interessante.


Em alguns casos nem o pronome indefinido é necessário:


A neve e o vento glacial alteraram a paisagem europeia e não pouparam país.


Está certa a ausência do artigo, pois significa que nenhum país (da Europa) foi poupado no pior inverno dos últimos anos. É importante notar que a indefinição se faz mentalmente – não é preciso constar explicitamente o artigo ou o pronome indefinido. Caso a reportagem estivesse se referindo só à Inglaterra ou à Suécia, por exemplo, o redator teria escrito “não pouparam o país”.


Entretanto, o artigo indefinido é usado como reforço em expressões exclamativas:

 

Foi uma alegria te ver. O desfile foi um horror!