Dia desses, a câmara de vereadores, por meio de um de seus edis, talvez não acintosa, mas, desnorteadamente, propôs título de cidadania a um deputado federal evangélico que, sabidamente, jamais fez qualquer trabalho ou intervenção política em prol de Teresina ou do Piauí. Para agravar sua situação, atribuem-lhe, ainda, a pecha de ser contrário ou discordar de tantos quantos veem com naturalidade as práticas homoafetivas. Uma grita partindo, notadamente, de instituições autoproclamadas defensoras dos direitos dos cidadãos, e que reverberou para outros nichos da sociedade – em boa hora, diga-se de passagem, dado o total distanciamento da pretensa figura homenageada com as coisas piauienses e teresinenses – impediu ou postergou a entrega da comenda parlamentar. No último dia vinte e um de abril, consagrado à morte do mártir da independência, Joaquim José da Silva Xavier, Tiradentes, o governante de Minas Gerais, em Ouro Preto, durante tradicional cerimônia de entrega de comendas, lá chamada de medalha da inconfidência, em sua exposição de motivos e de justificativas para escolha dos homenageados, decidiu comparar os feitos do herói da independência com os dos pretensos próceres julgados criminosos no episódio jurídico-policial alcunhado de mensalão. Mais que uma inversão de valores, querer assemelhar as ações dos “mensaleiros” condenados por desvios de conduta e de recursos financeiros públicos, com os atos de Tiradentes, é um disparate, um abuso moral, uma ignomínia. Fato é que, dito governador, após melosos e descabidos lero-leros, decidiu distribuir medalhas, algumas, merecidamente, se o galardão levou em conta o grau de autoridade e de importância burocrática do laureado, e não o contido na descrição do arrazoado ou discurso que justificava as concessões; outras, imerecidas sob qualquer prisma de observação: a biografia, o caráter, o comportamento do homenageado, enquanto cidadão. Tanto quanto o descabimento da concessão de comenda ao deputado federal – citaremos seu nome, pois todos os meios de comunicação teresinenses já o fizeram por ocasião da pretensa outorga – Marcos Feliciano, que nada fez para merecê-la, verdadeiramente; também seria descabida e inoportuna qualquer menção, por menos honrosa que fosse, desde que distribuída por autoridades públicas representantes do povo, a homens como João Pedro Stédile, de reputação questionável, comparável, não a revolucionários, mas a guerrilheiros, do tipo que se põe à disposição de alguém visando, mais que reconhecimento pelos serviços prestados, a contraprestação a esses serviços, na forma de favores escusos ou liberação de recursos públicos, ainda que esses venham dos bolsos do cidadão brasileiro. Dessa festividade episódica de entregas de medalhas e comendas pelo governo mineiro, talvez para reduzir o número de testemunhas ou de contestadores, quis ele que grande parte dos moradores da cidade não participasse; para que isso se efetivasse decidiu embarreirar a área onde o evento acontecia. De todo o dito e, também, do não falado ou escrito, conclui-se: graças à nossa cordata conivência, estão os homens que nos governam e os que nos representam, politicamente, nos parlamentos, tomando as decisões e atitudes que lhes convêm. O mal maior não tem como causa esses episódios comezinhos ou insignificantes em que, infelizmente, vêm se transformando essas estapafúrdias e recorrentes distribuições, Brasil a dentro, por gestores públicos demagogos e hipócritas, de comendas ou láureas, criadas ou pensadas, originariamente, como algo sério e valioso; todavia, não se pode dizer, honestamente, que tais atos ou ações não sejam fio condutor de desrespeitos maiores; por essa razão, não podemos deixar de nos indignar, também, diante deles, por mais que pareçam miúdos ou desprezíveis. É que, dada a recorrência com que vimos sendo desrespeitados em tantas outras searas da vida pública, chegará o momento em que eles tentarão nos fazer entender que a verdade deles é que deverá ser seguida, prevalecer, não nossa vontade ou discernimento. Resta-nos fazê-los compreender, vez por todas, que não somos consumidores de suas ideias ou decisões, mas os que decidem, os proponentes, criadores, seus autores. Nós damos as ordens que governos e parlamentares devem obedecer. Esta é a lógica, a ordem natural das coisas. Antônio Francisco Sousa – Auditor-Fiscal ([email protected]