[Maria do Rosário Pedreira]

Pessoa escreveu algures que só era um bom livro para crianças aquele que pudesse ser lido com prazer por adultos também. O livro de que hoje falarei pertence a uma colecção aparentemente juvenil (as ilustrações ajudam a vê-lo assim, bem como a editora que o publicou – a Planeta Tangerina – que é sobretudo conhecida pela edição de livros infantis), mas está longe de ser o que parece (daí o título do post) e deve ser lido por todos os adultos que gostem de uma história séria, profunda e contada com muita arte. Se virem, pois, um livro extremamente azul pousado na mesa das crianças de uma livraria (a autora até já anda de cabelos em pé por causa disso), por favor não passem a correr. Fiquem, folheiem e comprem, porque Irmão Lobo, de Carla Maia de Almeida (com ilustrações de António Jorge Gonçalves, que são boas, mas na verdade não fazem muita falta a não ser para, no final, nos mostrar uma casa em ruínas), é uma pérola sobre uma família típica e atípica – especialmente sobre Bolota, a filha mais nova (e mais nova também do que seria suposto na sua conjuntura), e o pai, uma grande personagem que se chama tão depressa Alce Negro como Homem do Gelo e é o companheiro desta miúda especial numa «expedição» que, desde o início, se pressente dramática, mas vai muito mais longe do que imaginámos. Não se pense, porém, que Irmão Lobo é uma aventura recheada de peripécias, como é apanágio dos livros juvenis; pelo contrário: trata-se de uma narrativa absolutamente actual sobre o desemprego e os seus efeitos numa família que já teve casa com jardim, cão da neve de olhos azuis e uma vida que, infelizmente, foi acabando (mais para uns do que para outros, mas para todos sem excepção). Sem lamechice nem pedagogia barata, este livro fala de coisas muito difíceis e muito importantes e, por isso, precisa de ser arrumado nas estantes (depois de lido, evidentemente) de toda a gente que se preocupa com o presente e com o que ele pode fazer ao futuro dos mais novos. Numa palavra: Maravilhoso.