Senador Joaquim Cruz
Senador Joaquim Cruz

Reginaldo Miranda*

 

Médico, militar e político brasileiro, nasceu na cidade de Caxias, província do Maranhão, em 6 de janeiro de 1846, filho do coronel João da Cruz, empresário e político[1] em Caxias, e de D. Lina Joaquina Castelo Branco Cruz[2], falecida em 20 de outubro de 1906, na cidade de Caxias. Era neto paterno do português Joaquim Antônio dos Santos[3], abastado fazendeiro e dona Cândida Vieira, esta filha de Manuel Lázaro de Carvalho e dona Helena do Espírito Santo, portugueses estabelecidos na vila do Poti, hoje cidade de Teresina. Pelo lado materno era neto de José Joaquim de Santana e dona Veneranda Clara Castelo Branco, esta filha de Francisco Gil Castelo Branco e dona Maria Eugênia Lopes da Cruz, descendente dos fundadores de Buriti dos Lopes.

Entre seus irmãos, também militou na política o agrônomo João Christino Cruz[4] (1857 – 1914), engenheiro-agrônomo formado por Hohenheim, em Württemberg (Alemanha), deputado federal pelo Maranhão e autor da lei que criou o Ministério da Agricultura. Outros irmãos foram: a) Verônica Castelo Branco da Cruz e Santos (Caxias, 9.7.1852 – Teresina, 7.5.1877), que fora casada com seu primo coronel João da Cruz e Santos (Barão de Uruçuí)[5]; b) Lina Castelo Branco da Cruz, falecida em 1875, no Engenho d’Água, em Caxias, ainda na primavera da vida; c) tenente-coronel José Castelo Branco da Cruz; d) Raymunda da Cruz e Santos; e) Veneranda da Cruz Britto, falecida em 17 de setembro de 1929, em São Paulo, casada com Dr. João Paulo da Silva Britto, médico obstetra, residente em Caxias e depois em Recife; filho: Dr. João Paulo da Cruz Britto, médico oftalmologista especializado em Viena, Berlim e Londres, lente catedrático de clínica oftalmológica da Faculdade de Medicina de São Paulo, a partir de 1916, patrono da cadeira n.º 27 da Academia de Medicina de São Paulo; f) Maria Germana da Cruz e Santos; g) Hermenegilda da Cruz Beleza; h) Felisbela da Cruz; e, i) Aniceto Castelo Branco da Cruz.

Joaquim Antônio da Cruz, cursou os estudos iniciais em sua terra natal e preparatórios em São Luís do Maranhão. Depois mudou-se para a cidade do Rio de Janeiro, onde matriculou-se no curso de medicina da Faculdade Nacional de Medicina, concluindo-o no ano de 1872, com 26 anos de idade.

Depois de formado fixou residência na cidade de Teresina, onde passou a clinicar. Desde muito moço revelou firmeza de caráter e bondade de coração, distinguindo-se no exercício da medicina pela distinção no atendimento e acerto no diagnóstico, assim tornando-se popular e amado. Em 1874, foi nomeado para reger a cadeira de Inglês, do Liceu Piauiense. Em seguida tornou-se sócio e diretor da Companhia de Navegação a Vapores[6].

Em Oeiras, por ocasião de terrível epidemia que assolou a cidade no ano de 1876, foi enviado pelo presidente da província e ali prestou serviços inestimáveis, conseguindo extingui-la, assim deixando profundas recordações em toda aquela região[7].

Em 16 de março de 1876, sentou praça no corpo de saúde do Exército Brasileiro, no posto de 2.º tenente cirurgião. Em 1885, integrou a comissão encarregada de desobstruir o rio Parnaíba. Foi promovido a capitão em 5 de março de 1890 e major médico de terceira classe, em 27 de março do mesmo ano. Em 17 de janeiro de 1902, obteve reforma no posto de major médico.

É importante ressaltar que, na qualidade de médico militar prestou relevantes serviços não só no Piauí, quanto no Maranhão e no Ceará, sobretudo em Fortaleza, “impondo-se por toda a parte à estima dos grandes e pequenos”[8]. Segundo o noticiário da época, “até no estrangeiro a sua memória é conservada com estima e gratidão. Em uma cidade da Argentina, limítrofe com o Brasil, cooperou preponderantemente para a fundação de um hospital, que ostenta o seu retrato no salão de honra”[9].

No campo político sua ação foi brilhante e fecunda, prestando relevantes serviços ao Piauí. No tempo da monarquia foi um dos chefes do Partido Liberal, por cuja legenda foi eleito deputado geral na última eleição patrocinada pelo regime, tendo na anterior perdido a cadeira por uma diferença de apenas cinco votos. Conforme as notas da imprensa, isso aconteceu em pleitos renhidos, onde o direito de sufrágio foi disputado com consciência e liberdade.

Proclamada a República, reorganizam-se as forças políticas do Estado procurando adequar-se à nova situação. Foi, então, o major Joaquim Cruz, um dos fundadores do Partido Republicano Federal, ao lado de seu primo e cunhado Barão de Uruçuí, conforme se observa nesse resumo histórico:

“A 20 de março [de 1890] em reunião realizada na casa do Cel. Honório Parentes, concluía-se a fusão de todos os antigos partidos políticos em um só que se denominou – Partido Republicano Federal – e conglobava os conservadores chefiados por Theodoro Pacheco e Simplício  Mendes; os liberais sob a direção do dr. Joaquim Cruz e Barão de Urussuhy e republicanos representados pelo dr. Nogueira Paranaguá[10].

‘O diretório do PRF ficou constituído pelos drs. Theodoro Pacheco, Barão de Urussuhy e Nogueira Paranaguá.

‘Como órgão do partido na imprensa, surgiu a DEMOCRACIA (3 de abril), desaparecendo o Fiat Lux e a Actualidade.

‘Dissidentes dessa organização partidária ficaram o Barão de Castelo Branco (liberal) e o dr. Simplício de Rezende (conservador). Exprimiu-lhes, no jornalismo, o pensamento político – ‘O Democrata’ tendo Clodoaldo Freitas como redator principal, cujo primeiro número circulou a 11 de junho.

‘Acendeu-se a luta política no Estado que culminou com a retirada do governador Thaumaturgo de Azevedo (4 de junho de 1890), prisão do dr. Coelho de Rezende (13 de outubro) pelo governador Gabino Besouro e suspensão do ‘O Democrata’ (16  de outubro).

‘O predomínio político do PRF tornou-se, então, absoluto, pois como seu aliado pode-se considerar o – partido catholico – fundado a 10 de julho em reunião popular realizada na residência do cônego Honório José Saraiva que, com o saudoso clínico dr. Gentil Pedreira foram os seus diretores na capital. ‘A Cruz’, foi o seu órgão na imprensa.

‘O partido democrata desapareceu, dissolvido pelos seus chefes. Com a suspensão do ‘O Democrata’ e sob ameaça semelhante deixou de circular ‘O Telephone’ de Antônio Diniz, que reapareceu a 11 de junho. Assim, também na imprensa o PRF ficava solus totus, com a ‘A Democracia’.

‘Já então as eleições para a Constituinte Federal se tinham realizada (5 de setembro).

‘Sem querer estabelecer confronto com os atuais, vale apenas citar os nomes que representaram o Piauhy naquela assembleia.

Senadores: Dr. Joaquim Cruz, chefe do partido liberal monárquico; Dr. Theodoro Pacheco, grande jornalista e chefe do partido conservador na monarquia; Dr. Eliseu de Souza Martins, republicano da propaganda e conhecido jurisconsulto.

‘Deputados: Capitão ... Nelson de Vasconcelos Almeida, engenheiro naval e civil; catedrático da Escola Naval dr. Anfrísio Fialho, advogado notável; dr. Joaquim Nogueira Paranaguá, médico distinto e ex-governador do Piauhy. Os três últimos eram republicanos históricos e dois deles, Nelson e Fialho, com serviços relevantes à Revolução de 1889.

‘A 26 de dezembro empossou-se no governo do Estado o dr. Álvaro Moreira de Oliveira Lima, piauiense notável mas sem ligações partidárias, escolhido para presidir, com imparcialidade, as eleições para a Constituinte do Estado e encaminhá-lo para a vida autônoma que a Constituição Federal lhe outorgaria.

‘Quinze dias após sua posse o dr. Álvaro Lima decretava Resolução n.º 37, de 12 de janeiro de 1891, marcando as eleições estaduais para 3 de março e publicando o projeto de Constituição Piauhyense, para servir de base e estudo à que decretaria a Assembleia Constituinte convocada para 30 de abril.

‘Instala nesse dia, funcionou a primeira Constituinte, nesse caráter, até 27 de maio de 1891, quando promulgou a nossa carta política dessa data e que difere, em pontos fundamentais, do projeto publicado com a citada Resolução n.º 37”[11].

Conforme consta na retrospectiva supra, o major e médico Joaquim Antônio da Cruz, foi eleito senador constituinte por nove anos, no período de 15 de novembro de 1891 a 31 de janeiro de 1900. Foi um dos signatários da Constituição de 1891. Participou das comissões de Finanças, de Saúde Pública, de Estatística e Colonização e da Demarcadora de Limites com a Argentina (1900 - 1904), chefiada pelo general Dionísio Evangelista de Castro Cerqueira. Todavia, candidato à reeleição não conseguiu renovar o mandato.

Ainda em janeiro de 1892, rebatendo críticas desferidas pelo ex-governador Gabriel Luiz Ferreira, inconformado com a referida candidatura e eleição do Dr. Joaquim Cruz, assim publicou no jornal A Legalidade, do Partido Republicano Legalista, um partidário que assina com as iniciais WW:

“Hoje, voltando à antiga profissão, o ex-governador tem a audácia de falar na obscuridade do senador Cruz, o qual, como é sabido, pertence a uma família distinta e rica, que neste Estado goza de um nome honrado e geralmente conhecido. Poderá o caixeiro de outrora dizer o mesmo em matéria de genealogia?

‘O alto posto político ocupado pelo Dr. Joaquim Cruz foi adquirido à custa de muitos sacrifícios, da lealdade e firmeza com que sempre batalhou no seio dos nossos partidos. O seu imaculado caráter e acrisolado amor pela pátria, foram ultimamente postos à prova na dura emergência da revolução de 3 de Novembro”[12].

Mais tarde, elegeu-se deputado federal em duas legislaturas: 3.5.1906 a 31.12.1908 e de 3.5.1909 a 31.12.1911, nessa última tendo concorrido também ao sendo, sem êxito. Nesse período votou favoravelmente ao projeto de anistia do senador Rui Barbosa, em que foram anistiados João Cândido e os demais marinheiros por ele liderados na chamada Revolta da Chibata, que aboliu os castigos corporais nas Forças Armadas Brasileiras. Candidato ao terceiro mandato consecutivo, embora expressivamente votado não teve a sua eleição reconhecida pela comissão de verificação. “Este golpe, traiçoeiro e brutal, acabou por arruinar-lhe a saúde, já sensivelmente abalada por trabalhos penosos e pungentes decepções”[13].

De fato, em 1912, o Dr. Joaquim Cruz tentou viabilizar sua candidatura ao governo do Estado, em oposição à candidatura situacionista de Miguel Rosa, no que não obteve êxito e perdeu a reeleição para deputado federal.

Foi casado em primeiras núpcias com dona Francisca Adelaide Braga Torres da Cruz (1849 – 1.9.1883), filha do brigadeiro Francisco Xavier Torres Júnior e de Maria Pinto Braga Torres; filhos: 1. Coronel João Torres Cruz; 2. Dr. Milton Torres Cruz; 3. Dr. Eurico Torres Cruz (Barra do Piraí – RJ, 14.3.1880 – Rio, 31.11.1929), bacharel em direito pela Universidade do Brasil (31.12.1902), jornalista, militar, escritor e magistrado no Rio de Janeiro, foi casado com Martha Washington Cavalcanti, filha de Domingos Olympio Braga Cavalcanti, reconhecido escritor cearense e de sua esposa, Anna Augusta Braga Torres Cavalcanti; filho único: 3.1. Dr. Benjamim Eurico Cruz (1915 – 1992), advogado, ministro do Trabalho e Previdência Social na fase parlamentarista do Governo João Goulart (1962), cujo filho primogênito, 3.1.1.  Eurico Cruz Neto, foi magistrado no TRT da 15ª Região, com sede em Campinas (SP); 4. Constantino Torres Cruz; 5. D. Maria Lina Cruz Barroso, casada com o general Benjamim Liberato Barroso (1859 – 1933), governador do Ceará, deputado federal e senador da república; e, 6. Affonsina Torres Cruz, solteira, falecida em 10 de outubro de 1905.

Em segunda núpcias, casou-se dona Florentina da Costa Cruz, que dividiu inicialmente a pensão com a filha do primeiro consórcio Maria Lina e as demais filhas Maria de Jesus, Márcia e Amélia Cruz, estas últimas advindas do segundo consórcio[14].

Faleceu o Dr. Joaquim Antônio da Cruz, vítima de um carcinoma na boca, em 10 de outubro de 1912, na cidade do Rio de Janeiro, com 66 anos de idade, depois de três meses de padecimento, sem voz, mas em plena consciência, em cujo período se comunicava através de gestos ou escritos. Foi sepultado em jazigo perpétuo, no cemitério de São João Batista, no Rio. Em sua homenagem foram batizados dois vapores que navegavam nos rios Balsas e Parnaíba, respectivamente, Joaquim Cruz, da Oliveira Pearce & Cia., e o S.S. Senador Cruz, da Companhia de Navegação a Vapor do Parnaíba. Portanto, foi um vulto notável de nossa terra tendo muito contribuído para o seu desenvolvimento, sobretudo para viabilizar a navegação comercial no rio Parnaíba, daí as homenagens recebidas pelas empresas envolvidas em sua execução. Com essas notas resgatamos-lhe a memória ilustre para conhecimento dos pósteros.

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* REGINALDO MIRANDA, advogado e escritor, membro da Academia Piauiense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Piauí e do Tribunal de Ética e  Disciplina da OAB-PI.

 

 


[1] Eleitor de paróquia, vereador, presidente da câmara municipal, subdelegado de polícia e juiz municipal. Senhor de engenho e negociante. Já não existia em 1874.

[2] Fora casada em primeiras núpcias com Joaquim Gonçalves Pereira, prematuramente falecido, de cujo consórcio teve dois filhos: Pompeu Castelo Branco Pereira e Alexandre Castelo Branco Pereira, ambos falecidos jovens e solteiros. Em segundas núpcias, casou-se com o coronel João da Cruz, Senhor do Engenho d’Água, em Caxias e fundador da Casa Cruz, em Teresina (FERREIRA, Edigardo Pires. A mística do parentesco).

[3] Juiz de fato na vila de Caxias.

[4] Foi casado com a sobrinha Lina Amanda da Cruz, filha de Verônica Castelo Branco da Cruz e do coronel João da Cruz e Santos (Barão de Uruçuí).

[5] A imprensa, 14.5.1877.

[6] Oitenta e nove, 23.7.1874; A imprensa, 28.12.1878.

[7] O Apóstolo n.º 273, de 13.10.1912; A opinião conservadora, 27.5.1876.

[8] O Apóstolo n.º 273, de 13.10.1912.

[9] O Apóstolo n.º 273, de 13.10.1912.

[10] Aderiu à causa republicana depois de romper com seu parente, o Marquês de Paranaguá.

[11] A imprensa, 22.6.1933.

[12] A legalidade, 27.1.1892.

[13] O Apóstolo n.º 273, de 13.10.1912.

[14] DOU 28.6.1913, p. 32.