ELMAR CARVALHO

 Contou-me o amigo e colega Edison Rogério, faz alguns dias, que rapazola, ainda adolescente, vinha de uma festa, alta madrugada, quando ouviu o bater longínquo de tambores. Tomara umas boas talagadas de pinga, em companhia de uns colegas, e se dirigia para sua residência, em Pedreiras – MA. Levemente tocado pelo álcool, o baticum dos tambores lhe caíram fundo na alma, quase como um chamado irresistível, que lhe despertou o imaginário e a curiosidade, talvez por força de alguma memória atávica longínqua, ou seja lá o que tenha sido. O fato é que o colega, com a audição e os demais sentidos aguçados, se dirigiu para o lugar distante de onde vinha o batuque. Descobriu que as batidas vinham de dentro de um terreiro ou salão de umbanda ou macumba. O nosso bravo Rogério adentrou o salão da dança ritualística; envolvido pelo som dos tambores, inebriado pela magia da dança e do incenso, e talvez pelos requebros de alguma cabocla que dançava, oxalá já cavalgada por algum espírito lascivo, entrou na dança. Tomou mais algumas doses da branquinha, e enfeitiçado pelo ritmo dos tambores, pelos giros e rodopios da dança e – quem sabe? – por algum espírito brincalhão e festeiro, Edison Rogério dançou como um mestre consumado, como um verdadeiro virtuose das danças ritualísticas, a ponto de impressionar o macumbeiro dono do salão. No dia seguinte, ao acordar, por volta das onze horas, foi abordado por seu pai, que lhe indagou sobre o que andara fazendo. Ele não se lembrava de tudo em detalhes, e tinha vagas lembranças de sua performance extraordinária no salão de dança umbandística. Seu pai, então, lhe contou que fora procurado bem cedo pelo macumbeiro, que lhe dissera nunca ter visto ninguém dançar tão bem como seu filho, e por isso tinha vindo lhe pedir para que o rapaz fizesse parte de seus seguidores. Edison Rogério nunca mais pôs os pés naquele terreiro de tambores e dança tão encantados; tudo fora apenas aventura e brincadeira de um adolescente, a desbravar a magia da vida e do mundo. Certamente o terecô perdeu um virtuose da dança ritualística, enfeitiçada, mas a magistratura piauiense ganhou um bom juiz.

  

Essa história do Edison Rogério me fez recordar os meus tempos de adolescente. Estava passando uns dias de férias em Barras, terra natal de meu pai, em companhia do Zé Moura, que foi um dos grandes atletas do futebol piauiense. Todas as noites atacávamos em diferentes pontos da cidade, em busca de alguma garota, para um namoro rápido e descompromissado. E quase toda noite conseguíamos uma menina diferente, para uns amassos, como na época se dizia. Certa vez, atraídos pelo bater de tambores, fomos sair em um salão de macumba ou umbanda, que ficava próximo à curva da estrada que seguia para a barragem. Vimos o interior do salão e o caboclo que tocava os tambores, em ritmo frenético, com tanta garra e energia, mas logo saímos para o terreiro, para conversarmos com umas moças, que logo soubemos ser filhas da dona do templo. Quando a conversa já estava bem adiantada, prometendo render bons frutos, a macumbeira, ou antes, a bruxa daquele terreiro apareceu com um cabo de vassoura, e furiosa nos botou para correr. Ainda bem que aquela velha bruxa não sabia voar em vassoura, e ficou apenas empunhando o cabo, a vociferar e a desferir imprecações contra uns jovens, que queriam apenas um ameno e inocente aconchego com suas belas filhas.