A VISITA DO CONSELHEIRO AO GRANDE SÁBIO-EREMITA DE ALTAIR-12


Miguel Carqueija


     Ora pois! Estava eu muito tranqüilo da vida, em meu retiro de Altair-12, quando fui procurado pelo Magno Conselheiro de Altair-25, que ouvira falar da minha fama de sábio-eremita, que me valeu a aposentadoria precoce e a subsistência cômoda graças à generosidade dos peregrinos que me visitam para conhecer o Sentido da Vida. Claro que eu nunca os decepcionei; o mínimo que geralmente faço é presenteá-los (mediante um donativo espontâneo, é claro) com um desses quebra-cabeças tipo “mata-Einstein”, explicando-lhes em seguida: - Quando você conseguir encaixar todas as peças sem ajuda de ninguém, asseguro-lhe que terá descoberto o sentido da vida.
     Há 50 anos que distribuo esses jogos e nunca nenhum dos contemplados retornou para contar que conseguira realizar a façanha. É pena: eu iria logo perguntar como é afinal esse tal sentido da vida.
     Mas o Magno Conselheiro não estava interessado no sentido da vida. O que ele queria, conforme explicou, era acabar com a poluição em seu mundo. “Somente o Senhor, ó Sábio, possui a necessária sabedoria para enfrentar tão vasto problema.”
     Perguntei-lhe quantos habitantes existiam em seu mundo e tive a informação de que não eram muitos: uns 25 bilhões no máximo. Então ele me mostrou uns holocinegramas que ilustravam a situação do planeta, com fumaça por toda parte, nuvens sujas de tanto fumo, florestas queimadas, desertos em expansão, gente tossindo o tempo todo (até o Cido Gomeira, do Jornal Planetário, dava as notícias tossindo sem parar) e por aí a fora. Expliquei então ao ilustre personagem que a solução óbvia seria extinguir a humanidade daquele planeta; aí, garantia eu, a poluição acabaria em pouco tempo. Ele até concordou comigo, mas explicou como seria difícil adotar tal medida; afinal ele também era humano.
     - Pois bem – assinalei. – Então teremos de fazer tudo de forma mais trabalhosa. Vocês terão de ter gente, dinheiro e equipamentos para despoluir o planeta e acabar com a depredação da natureza!
     - Mas é esse o nosso problema, Mestre. Nós não dispomos de recursos!
     - Ah, não? E que tal se começarmos por cortar as mordomias?
     - As o que?
     - As mordomias, Conselheiro. Por exemplo, o recesso remunerado dos mil novecentos e noventa e nove conselheiros, seis meses por ano. De agora em diante vocês só devem ter um mês de férias; o resto do tempo trabalharão para combater a poluição.
     - Mas...
     - Mas o que? Você não pediu uma solução? De agora em diante vocês recusarão favores dos donos das indústrias poluidoras. E farão cumprir a Lei.
     Ele estremeceu da cabeça aos pés.
     - Cumprir a Lei, ó Sábio? Mas nunca fizemos isso antes! Meu Deus, não saberemos nem por onde começar!
     - Muito simples. Comecem por cumprir a lei que determina o corte do “jeton” do conselheiro que faltar à sessão. Dessa maneira vocês cumprirão a lei muitas centenas de vezes no mesmo dia e aí, já mais experientes, aprenderão a cumprir o restante.
     Eu ia continuar mas o Magno Conselheiro, sentindo-se tonto, despediu-se de mim
dizendo que ia refletir sobre tudo aquilo.
     Ele deve ter refletido, mesmo. Dias depois recebi uma carta na qual ele dizia:
     
     “Ó Grande Sábio, saudações!


           Numa reunião secreta e emergencial do Alto Conselho, chegamos à conclusão de como seria difícil, doloroso e traumatizante o caminho por Vós apontado. E como outro mais fácil e viável não nos ocorresse, tomamos afinal uma decisão que trará a paz ao nosso mundo, acabando de vez com as disputas e querelas intermináveis que há anos nos atormentam.
          Legalizamos a poluição.”