UMA LUTA DE SÍSIFO

 

                                                                                                  Cunha e Silva Filho

 

 

      Se a vida é dinâmica, assim como  todos os nossos atos bons ou ruins,  o estado  de tranquilidade, de paz  e de alegria é, todavia, muito precário. Cada dia  tem sua história,   suas lutas, seus descaminhos, suas surpresas. Tudo é incerto,  volúvel, fugaz. E assim também é a Natureza que nos cerca, na qual  nada é duradouro, seguro, estável.  O próprio Universo, segundo os cientistas,  aumenta de tamanho.  A “Canção do Tamoio”("Não chores, meu filho:"Não chores, que a vida/ É luta  renhida: Viver é lutar/ A vida é combate/Que os fracos abate/ Que os fortes, so bravos/ Só pode exaltar"),  de Gonçalves Dias (1823-1864),  também se poderia  aplicar   a esse combate sem trégua entre o homem e a Natureza.

     A história da Humanidade é essa contínua refrega  de perdas e ganhos, talvez mais perdas do que ganhos. Vem-me à mente, guardadas as devidas diferenças, esse descer e subir da imagem mitológica do  rochedo de Sísifo simbolizando,   com propriedade,   as forças físicas  e morais entre o homem e seu meio ambiente, esse eterno   castigo  e  luta para alcançar  um desiderato.  Assim igualmente se poderia  invocar a imagem da Fênix da mitologia grega. Das cinzas, quer dizer,  da destruição,  renasce  a ave   indefinidamente, do mesmo modo que dos escombros  das construções  ressurge o trabalho árduo  e persistente do homem  em prélio contra  as forças naturais inapeláveis   e aquém  dos poderes  humanos.

       A Natureza constrói e destrói ao mesmo tempo. Não tem hora marcada  para que  se revolte contra a paz dela mesma. Assim, se explicam  os caprichos  e a selvageria  que  ela exibe  no que  os ingleses  denominam,  com sentido antinômico, de  acts of God (ações de Deus).

       Os exemplos mais   emblemáticos   da fúria da Natureza contra  a vida e a própria Natureza são os terremotos,  os furacões, os maremotos,  os tsunamis,   os ventos  assassinos  que, de vez em quando,   assolam  regiões diversas da Terra sem dó nem piedade. Nem as criancinhas são poupadas quando esses  flagelos  mortíferos  atacam  as cidades,   os países,  a humanidade. E o pior  e menos consolador  é que  a Natureza não paga pelos seus erros e defeitos. Nem ninguém  é  capaz de  puni-la. Ela permanece  indiferente como a baleia branca do romance Moby Dick de Helman  Melville(). Nada a atinge  mortalmente  quando ela   se manifesta em toda a sua  brutalidade  e crueza contra  nós, pobres mortais, que, diante  da sua ira ciclópica,  nos reduzimos  a ínfimas criaturas   desprotegidas.

     Não há avanço tecnológico e científico que  possa   ombrear-se com a pujança da  sua   destruição. Inclemente,  está  acima dos homens e da civilização. Seu ímpeto  é  destruir,  transformar  prédios, casas,    em pó, detritos, areia, poeira. Tudo vem abaixo na sua passagem  sem freios nem impedimentos, Não pede licença a prefeitos, governadores nem  presidentes. Monarcas e ditadores. Vem arrastando tudo, causando  inundações   e vítimas fatais.

    E, desse modo, foi agora com os furacões Harvey e  o Irma, e agora mesmo, com o terremoto no México, país assentado numa  parte do Planeta onde se concentra  a área mais  sujeita a terremotos.  O Brasil deve agradecer  sempre  à Natureza por não registrar  terremotos. Pelo que sabemos,   aqui  só temos tido  notícias de  tremores de  terra. Entretanto,  inundações de rios são constantes  entre nós e têm trazido muitas desolações e perdas de vida, infortúnios e pobreza.

    Os acts of God provocam  não só devastações e tragédias   humanas, mas também  prejuízos  financeiros incalculáveis. Atingem  pobre e ricos e nisso são democráticos. Mas, é claro que  os pobres são os que mais sofrem  com esses flagelos naturais. 

     Muita gente  atribui   a esses  males da Natureza  aos homens e suas maldades e neles veem  um recado  profético do Criador   dirigido   às perversidades  humanas  contra o ecossistema, contra  a cupidez   de  ações governamentais  que  maltratam  a  paisagem física, a flora e a fauna, as nossas florestas,  os nossos lagos,   rios,  mares   e oceanos. Espírito predador,  o homem mau se comporta diante da Natureza  de forma prepotente e dela só deseja  espoliar  seus  frutos,  suas riquezas que mais servem  aos potentados de todos os continentes.   

     Poluindo os rios,  praticando desmatamentos,   nos campos  e nas cidades,  o homem  vem se portando  indiferente às depredações que   estragam  as fontes  d’água, matam os rios,   secam as nascentes  nas cidades do mundo inteiro,  poluem o ar que respiramos  com   o veneno do CO2 vindo dos canos de descarga  dos carros, dos fornos das fábricas, das queimadas e vão,  desta forma,  brutal  e selvagem,   provocando  o aumento  do efeito estufa com todas as consequências deletérias  dele advindas e que,  por seu turno,  acarretarão  o aquecimento global  da Terra com forte  influência negativa para as regiões polares, cujo resultado  sãos o derretimento das geleiras, aumentando, assim,  o nível dos oceanos.

       Os organismos  internacionais em defesa  do clima e do meio  ambiente, em reuniões de cúpula, aprovam   propostas  de redução  dos níveis  de  CO2. No entanto,  países mais poluidores do Planeta  ainda resistem  a reduzir suas cotas   de poluição  atmosférica alegando  prejuízos  econômicos ou até  desemprego caso  diminuam os gases  venenosos  poluidores   do Terra.  Ora,  se essa é a atitude de alguns chefes de Estado, depois não venham  chorar  pelo   leite  derramado ao serem atingidos   pelos danos irreversíveis que provocaram e ainda provocam  na Natureza. Cumpre-lhes pensar  no bem-estar  do Planeta e não nos lucros  do capitalismo que, diante  da Natureza bravia, não valerão  um  tostão furado.  Repensar  formas de  preservar  o meio ambiente é uma questão   que deveria ser a pauta  constante  dos organismos mundiais  incumbidos da defesa  da Natureza e  da vida  humana. Nada somos  sem  o equilíbrio  ecológico, sem  os cuidados  que devemos ter  com a terra, a água e o ar.

     Não desejo nesse artigo  esquecer  de  acrescentar  mais um item  para discussão  em  escala global, que  são os testes  nucleares    feitos  por nações   belicosas. Qualquer  pessoa sensata  há de entender que, se os governos   que emulam entre si  pela a soberania  de  possuir  armas nucelares, pensam que estão agindo  corretamente,  estão  redondamente   equivocados.

      Os testes nucleares só  danificam  a estrutura  da Terra, podem  provocar  efeitos  catastróficos, como,  por exemplo, desequilíbrios  nas camadas profundas da Terra,  as chamadas  camadas tectônicas, causadoras  de  terremotos, tremores de terra e outros malefícios. Que esses governos  deixem de esburacar  o Planeta,  seja em testes nucleares, seja  para   extrair  riquezas  que só  ajudarão  no enriquecimentos  de  uma parte  menor  de bilionários   que povoam  os quatro  cantos do mundo.   É tempo de mudar mentalidades tacanhas  que só  valorizam  o vil metal. O planeta Terra está cansado de apanhar como se fora um escravo de tempos sombrios e desumanos que  a consciência dos homens de bem, em qualquer parte,  reprova  e repudia com veemência  e indignação.