Falar de  Alphonse de Lamartine (1790-1869) é falar do clamor da alma, do amor à  natureza, porém não uma natureza meramente copiada, mas de uma natureza transfigurada pelos sentimentos discretos, melancólicos, elegíacos. Lamartine é considerado o primeiro grande poeta romântico francês.
                 Lamartine nasceu em Mâcon. Sua infância se passou no campo e nesse ambiente sofreu a influência encantadora e piedosa de sua mãe, segundo informa,  num resumo biobibliográfico Maria Junqueira Schmidt, fonte da qual estou extraindo esses comentários. 
                   Ainda me lembro que, no curso científico, me encantara com um poema seu célebre: "Le lac". Me lembro mesmo que li parte dele em sala de aula, para a rigorosa professora Madame Helena no Liceu Piauiense, professora de francês, casada com um médico francês que aportara em Teresina. Não sei ao certo, mas me informaram que a Madame, como era mais conhecida entre os estudantes, saíra de  Teresina e fora para Minas Gerais. Daí então, não mais tive notícias de suas atividades docentes.
                 Lamartine leu os antigos autores com grande entusiasmo, sobretudo Bernardin de Saint Pierre e Chateaubriand, suas duas grandes admirações. Obras: Méditations, Nouvelles Méditations, Harmonies poétique et religieuses; em prosa: Graziella, Voyage en Orient, Histoire des Girondins.
               Caro leitor, abaixo lhe trago minha tradução bilíngue do poema "L’Automne". Este poema, aliás, foi lido e traduzido de improviso, em aula por meu pai, que me lecionou francês no Ginásio “Des. Antônio Costa”, mais conhecido por “Domício,” já que , quando se falava nessa escola, que ia do primário até a 4ª série ginasial, ela era sinônimo ou metonímia do nome todo da escola, instituição muito popular em Teresina durante longos anos.

     O nome “Domício” foi-lhe dado em razão de um de seus diretores-proprietários se chamar professor Domício Melo Magalhães, professor de história, mestre bonachão, divertido, conversador, piadista, muito querido dos alunos. O outro diretor se chamava Francisco Melo Magalhães, professor de matemática. Era o oposto do irmão, sério, rigoroso, mas nem tanto. Foram dois grandes e estimados educadores piauienses.


                   L’Automne
 

Salut, bois couronnés d’um reste de verdure!
Feuillages jaunissants sur les gazons;
Salut, derniers beaux jours! Le deuil de la nature
Convient à la douleur e plait à mes regards,

Je suis d’un pas rêveur le sentier solitaire;
J’aime à revoir encor, pour la derniére fois,
Ce soleil pâlissant, dont la faible lumière
Perce à peine à mes pieds l’obscurité des bois.

Oui, dans ces jours d’automne où la nature expire,
À ses regards voilés je trouve plus d’attraits;
C’est l’adieu d’um ami, c’est le dernier sourire
Dês lèvres que la mort va fermer pour jamais.

Ainsi prêt à quitter l’horizon de la vie,
Pleurant de mes longs jours l’espoir évanoui,
Je me retourne encore, et d’um regard d’envie,
Je contemple ces biens dont je n’ai pas joui.

Terre, soleil, vallons, belle et douce nature,
Je vous dois une larme aux bords de mon tombeau!
L’air est si parfumé! La lumière est si pure!
Aux regards d’un mourant le soleil est si beau!

Je voudrais maintenant vider jusqu’à la lie
Ce calice mêlé de nectar et de fel:
Au fond de cette coupe où je buvais la vie,
Peut-être restait-il une goutte de miel!

Peut-être l’avenir me gardait-il encore
Un retour de bonheur dont l’espoir est perdu!
Peut-être, dans la foule, une âme que j’ignore
Aurait compris mon âme e m’aurait respondu!...

La fleur tombe en livrant ses parfums au zéphire;
À la vie, au soleil, ce sont là ses adieux;
Mois, je meurs; et mon âme, au moment qu’elle expire
S’exhale comme un son triste et mélodieux.

                 

                                   O Outono


Salve, bosque coroado dum resto de verdura!
Folhagens amarelentas na relva esparsa;
Salve, derradeiros dias! O luto da natureza
Convém à dor e agrada aos meus olhos.

Sigo com passo sonhador o atalho solitário;
Amo rever ainda, pela última vez,
Este sol pálido, do qual a tênue luz
Mal me chega aos pés na obscuridade dos bosques.

Sim, nestes dias de outono ,onde a natureza expira,
Encontro mais atrativos em seus olhares velados;
De um amigo é o adeus, é o derradeiro sorriso
que dos lábios a morte vai fechar para sempre.

Assim prestes a deixar da vida o horizonte,
Em meus longos dias chorando a desvanecida esperança,
Mais uma vez retorno e, com um olhar de inveja,
Estes bens dos quais não desfrutei contemplo.

Terra, sol, vales, bela e doce natureza,
Uma lágrima vos devo à beira do meu túmulo.

O ar perfumado está! tão pura é a luz!
Aos olhos dum moribundo é mais belo o sol!

Agora desejava, até ao fundo esvaziar,
misturado de néctar e de fel, este cálice:
Ao fundo desta taça, uma gota de mel!

Quem sabe o futuro reservasse ainda
Uma vez mais a felicidade da qual se perde a esperança!
Quiçá, na multidão, uma alma que não conheço
Minh’alma teria compreendido e uma resposta me daria !...

Cai a flor entregando ao zéfiro seus perfumes;
À vida, ao sol, apenas sobram adeuses;
Eu, morro, sim, e minh’alma, no instante em que expira,
Qual plangente e melodioso som se exala...