UM COMENTÁRIO A UM POEMA (SONETO) DE FRANCISCO MIGUEL DE MOURA
Por Cunha e Silva Filho Em: 26/12/2024, às 08H20
UM COMENTÁRIO A UM POEMA (SONETO) DE FRANCISCO MIGUEL DE MOURA
Por Cunha e Silva FilhoEm: 18/12/2024, às 01H02
UM COMENTÁRIO A UM POEMA (SONETO) DE FRANCISCO MIGUEL DE MOURA
CUNHA E SILVA FILHO
A esta altura de sua poética. vejo a que nível de nobreza estética chegou um poeta nascitur como V. ., tanto quanto o foram só para dar alguns nomes da prata de casa, ou seja, no circuito poético piauiense: Da Costa e Silva, Martins Napoleão, Clóvis Moura, Hardi Filho. H. Dobal, Mário Faustino, Celso Pinheiro Filho, Torquato Neto. Não vou relacionar os que estão, graças a Deus, ainda vivos .Contudo, voltemos ao seu soneto "A falta que faz;" Antes, , vou-lhe ser franco.. V. ainda se encontra numa fase fértil, produtiva, de seu percurso literário. Diria, mais na poesia. V. é um poeta que trabalha em outros gêneros e é igualmente um polígrafo, uma vez que cultiva outros gêneros literários: ficção, (romance, conto , crônica, e ainda faz, vez por outra, . uma tradução do francês e inglês.
Registrarei , em ordem de grandeza estética, o seguinte: ensaio, sobretudo, o poético, mas trabalha bem no ensaio sobre ficção. V. escreveu uma história literária que, no meu juízo. é superior em formação acadêmica à história literária do Herculano Moraes, mas V .redundou em erro por omissão nas duas versões da sua obra historiográfica, uma vez que deixou de citar-me, de forma independente como fez com outros piauienses, os quais são comentados na forma de verbetes. .
Não estou me reportando a esse assunto por dor de cotovelo, segundo diz o poeta Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) ao ironizar poetas que. por dor de cotovelo, se veem obrigados a escrever versos lacrimosos. sem criaitividade alguma. . Longe disso, mas sim em face de um dado bibliográfico em moldes acadêmicos, ou seja, com uma obrigação de um historiador literário que não pode deixar de registrar um nome de um autor, pois estará incorrendo em erro de omissão ou silêncio. Involuntário ou adrede oensado.
O mesmo problema ainda mais grave foi a omissão por completo do poeta e historiador Herculano Moraes (1945-1918) quanto à minha produção acadêmica. Ele nunca me havia citado nem sequer com uma linha nas duas versões de sua história da literatura piauiense. Simplesmente, me ignorou. Mesmo quando eu já havia escrito antes dele um bom número de artigos juvenis sobre literatura brasileira em jornais de grande circulação em Teresina no início dos anos 1963. Moraes é um bom poeta. No entanto, como historiador, lhe faltava uma formação mais completa, máxime do ponto de vista teórico-metodológico, domínio de algumas línguas, do latim, do grego, conhecimentos de teoria literária. gramática, filologia, linguística e uma considerável e multidisciplinar cultura geral. Era talentoso, sim, daí ter sido admirado como poeta por muita gente do Piauí, visto que a originalidade, o talento são fenômenos da criação literária que não precisam de ter tanto saber erudito. Mas, Herculano Moraes tem o seu lugar assegurado de justiça e de direito na vida da inteligência piauiense.
Ninguém lhe pode sonegar esse aspecto de sua dinâmica atividade literária, de sua capacidade de escrever bem e de forma clara. Era um jornalista nato. Foi um intelectual batalhador e incansável no campo das letras piauiensse. Seu nome está citado, por exemplo, em, pelo menos, duas histórias literárias de dois autores e historiadores literários de peso: um, o brasileiro Wilson Martins (1921-2010),com os dois grossos volumes de sua também monumental obra de pesquisador, scholar e estudioso da literatura brasileira, que é A crítica literária no Brasil (Primeiro volume. 1983; segundo volume, 3 ed. Atualizada. Rio de Janeiro: Imprensa Oficial do Paraná.: Franciso Alves Editora, 1992. As citações se encontram no segundo volume, p.236-243. O outro Rio de Janeiro, RJ: Francisco Alves,1983; O segundo historiador que cita o Herculano é uma historiadora italiana, a Luciana Stegagno Picchio, que escreveu uma monumental História da Literatura brasileira.2ª edição revista e atualizada (Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2004.
Entretanto, acentuamos que o crítico e historiador Wilson Martins cometeu dois deslizes. O primeiro se reporta ao título da obra do Herculano, chamando-a, à página 236, de A nova literatura piauiense e, contraditoriamente denominado-a, à página 243, pelo seu título correto(sic!), Visão histórica da literatura piauiense, título da obra de Herculano Moraes de desde a sua primeira versão ... O segundo deslize se refere ao sobrenome do historiador piauiense, ortograficamente grafado “Morais” e não “Moraes,” usado pelo Herculano na capa de seu livro, cuja versão, num único volume, tem data de publicação de 1976. Foi até V., poeta Miguel de Moura, quem me ofertou um exemplar da estreia do Herculano como historiador literário.
A obra era muito fraca e só valia pelo seu sentido histórico- documental, ou sejam de quase catalogação relacionar nomes de escritores mais em evidência no Piauí. Não empregava metologia alguma em todos os aspetos, mas o esforço despendido pelo então jovem historiador piauiense levou-o a reescrevê-la e melhorá-la muito mais, expandindo-a na exposição e na sua forma de entendimento do que seja um história literária melhor estruturada.
Todavia, ainda veio com muitas falhas, na publicação em três volumes. No historiador, a parte de análise de alguns autores é desproporcional em qualidade e aprofundamento de visão analítica com relação a outros autores que, na obra, recebem tratamento analítico mais generoso de que outros autores e, agindo assim, incorre em armadilhas grosseiras de omissão, injustiça e de falta de maior pesquisa e conhecimento mais íntimo dos autores. No entanto, nem tudo está perdido e há sempre um tempo para tud: “..pour le plaisir et pour le travail.”
A roda do tempo vai arrumando tudo, ou quase tudo. E não é que que o antigo vizinho meu da Rua São Pedro , amigo de adolescência do meu irmão Winston, já citado, velho Herculano de Moraes, bom poeta, bom escritor e ótimo analista de ficção e poesia, escritor já maduro, com os seus livros publicados, membro da APL. me escreveu uma carta à mão, datada de janeiro de 2010, perguntando quando iria ao Piauí, a fim de tomar posse da cadeira que pertencia ao meu pai., uma vez que os membros dessa instituição literário-cultural amarantina me elegeram em “pleito regular.pois a vaga na Academia de Letras de Amarante me esperava para tomar nele posse, cujo patrono é meu pai. Não lhe respondi. Tempos depois, me vem pelos Correios um bilheate se me lembrando da vaga de membro da Academia de Letras do Médio-Parnaíba, de Amarante, Dessa vezm datilografou o bilhete m sempre bem polidamente escrito e muto claro n o que raespeitaao se estilo de escrita objetivo e límpido. No bilhetem percebi, pela primeira vez, que tinha um visão mais profunda de mim.Era um bilhete bem cordial e educado, um bilhete até elogioso e animado, cujo teor me permito transcrever, em parte, mais adiante, enfim, bilhete com todo aquele estilo próprio e impecável que usava nos artigos saídos em jornais de Teresina.
,,,,,,,Na verdade, ele me enviou uma carta e uns quatro bilhetes em diferentes intervalos de tempo., que Eis um parte de um dos biletes em que me fala de um 6 edição de sua Visão histórica da literatura piauiense e que e até gostaria de qe e a examinasse. Vejo aí uma prova de que Herclano de Moraes já me via com olhos outros na condição de historiador. Veja pare do mbilheate:
“Caro professor Cunha e Silva Filho:
Mesmo acompanhando com interesse o sucesso que os seus ensaios e análises têm causado entre nó, só agora decidi tomar a iniciativa de conversas que o destino interrompeu. Muito me agradou sabe-lo um bem sucedido professor de literatura, cujos textos tenho lido com muito interesse (...)"
Um historiador literário mais bem aparelhado tem que ter um faro de bookworm, de caçadores de novos autores não somente dos que já têm livros editado( o que significa não necessariamente, é óbvio, serem os melhores), mas também daqueles que não tiveram ainda, por um razão ou outra, oportunidade de o fazer. E só o faze mais tardiamente. Tal foi o meu caso particular. Demorou muito para que eu fosse editado. Meu primeiro livro, originalmente, um dissertação de mestrado, Da Costa e Silva: uma leitura da saudade, é de 1996, quando já estava com cinquenta anos e inédito em livro!. Talvez aí resida um atraso de visibilidade da minha atividade de escritor e crítico explique um silêncio intencional... Por outro lado, o que me deixa com um pé atrás, no que diz respeito a omissões decho historiográfico de historiadores piauienses, é que venho publicando artigos na imprensa piauiense em Teresina, desde , grosso modom 1963..
A questão de uma história literária depende de uma capacidade de síntese, a qual demanda uma habilidade de dizer muito em pouco espaço da página em branco, além de um planejamento de um corpus que sirva ao desenvolvimento da história literária com organicidade e harmonia no tocante às apreciações e críticas necessárias na interpretação dos autores selecionados e examinados. Em suma, o primeiro passo na feitura de uma história literária, a meu juízo e no que tange à escrita de uma história literária, se refere ao desenvolvimento de um projeto de história literária.
No que diz respeito ao historiador, é fundamental a utilização de uma metodologia, empregando este termo na sua acepção etimológica, ou seja, encontrar um caminho certo, com um roteiro bem delineado a ser colimado com sucesso a fim de que a obra assuma uma unidade convincente quanto a valores estéticos de cada autor, e bem assim quanto à coragem de assumir de verdade o papel que lhe cabe neste gênero de pesquisa, que é narrar e expor com independência e sensibilidade à dimensão estética e aos valores da linguagem literária - dois pilares que se completam como elementos-chave, fundamentais e decisivos à compreensão de uma obra literária no campo da historiografia.
Para tomar esta atitude, o historiador deve demonstrar seriedade de analisar um livro e, se possível, julgar do mérito e/ ou defeitos de uma obra nos vários gêneros conhecidos de quem lida com o fenômeno literário, não faltando azo para, se possível, fazer julgamentos coerentes e ter respeito às diferenças de escritor para escritor, seja em poesia, seja em que outro gênero for, tendo em vista sempre como inerente a qualidade ou não das obras literárias em exame .O historiador, enfim, deve estar consciente de que, na história literária, encontrará livros fracos estruturalmente falando, autores medianos, bons autores e ótimos autores.
Já disse alguém que a literatura, mesmo a chamada de alcance mundial, não é só feita de gênios. Sabendo julgar com equidade e sem uma tendência a preferências e desacertos de visão da história literária de um estado do país é uma tarefa árdua e extenuante. Dado um número enorme de autores, principalmente em tempos atuais, torna a tarefa do historiador ainda mais complexa.Por outro lado, deve-se louvar o esforço e a perseverança de Herculano Moraes que se salvou como historiador graças ao seu talento de escritor, talento para escrever bem, num estilo próprio. compensando as deficiências de sua formação intelectual e autodidática na esfera literária. Foi, assim, que atingiu a 4ª edição de sua obra na nova versão, em três tomos, com data de 1997, revista e atualizada.
A minha produção, hoje, é extensa. Comecei como um escritor que não havia ainda editado um livro, só escrevendo para jornais de Teresina. Fiz o mestrado .e o meu trabalho foi publicado pela UFPI em convênio com a APL. em 1996 .Esse é um marco significativo n minha carreira de escritor, conforme V. deve ter visto em postagem da minha Coluna "Letra Viva" do Site Entretextos, dirigido pelo operoso escritor e professor Dílson Lage Monteiro.
São dez livros editados e quinze livros inéditos, um dos quais escrito em inglês e francês.Pretendo também editar om obra de memórias bibliográficas concernentes a autores didáticos que escreveram e lecionaram línguas estrangeiras no país. São pequenas anotações, escritas ao correr da pena, pois as faço à mão aproveitando o espaço em branco das capas artesanais mesmo que venho fazendo nos últimos anos. Também faço referências a estrangeiros que vieram morar no país. Faço, igualmente, com alguns autores ou não, e até com dicionários de alta relevância, assim como gramáticas estrangeiras, ou não, de línguas que domino. Tudo começou com um hobby que há tempos cultivo tenho de colecionar livros didáticos principalmente.
Não acha, caro poeta Miguel de Moura, que eu deveria merecer de sua parte, enquanto obrigação acadêmica, um verbete mostrando que livros escrevi e foram publicados, inclusive fazendo alguma apreciação positiva ou negativa, não importa, sobre a minha produção científica ?Não sei, querido poeta, por que motivo não destinou um verbete na sua obra de historiador literário. Apenas me citou, "à vol d'oiseau." Quer dizer, nada de relevante comentou sobre a minha produção científica atualizada, porém me citando em apenas minguadas quatro ou cinco linhas, bem lacônicas e ainda cometeu um erro de historiografia. Não verificou o que eu venho produzindo ao longo de quatro décadas!
Por exemplo, apenas afirmou que eu havia defendido uma tese sobre Da Costa e Silva “ (1885-1950), quando não foi tese, mas uma dissertação de mestrado estudando a saudade na poesia de nosso poeta maior, Da Costa e Silva (1885-1950).A minha tese de doutoramento foi acerca do contista João Antônio (1937-1996) e tem por título: O conto de João Antônio: na raia da malandragem, defendida, em 2002, na Faculdade de Letras da U.F.R.J.
Entretanto, sobre a minha produção ensaística, de crítico literário, de tradutor, de cronista, de articulista de política brasileira e estrangeira. V,, meu talentoso poeta, nada disse sobre mim, nem tampouco se reportou, segundo deveria ser um trabalho de historiador meticuloso, a outros tipos de escrita literária que tenho produzido desde muito jovem, com textos de cunho literário que cultivo de forma praticamente ininterrupta tradução de poesia estrangeira, artigos sobre política brasileira ou estrangeira. Lendo a sua boa História da literatura do Piauí me dá, por vezes, a impressão de que não pertenço ao sistema literário piauiense.
A razão seria por que moro distante do Piauí? Todavia, isso não seria uma desculpa plausível, de vez que sempre escrevi mais para o Piauí. Nasci em Amarante e, portanto, pertenço à história literária piauiense, malgrado os historiadores da "Cidade Verde" não me tenham mencionado. Não queiram tirar a minha raiz literária que está fincada no Piauí.
Escrevo, desde adolescente, vale reiterar, para jornais e revistas de Teresina. Fiz dois lançamentos de livros em Teresina, na própria Casa de Lucídio Freitas e mais uma conferência sobre o bardo Da Costa e Silva. Fiz outro lançamento fora da APL Fiz, em Amarante, a mesma conferência sobre o “Poeta da Saudade.” Escrevi, por muito tempo, para os jornais Diário do Povo, Meio-Norte, Revista Presença," e um pouco para os Cadernos de Teresina, Revista De Repente. Isso só para me cingir ao espaço literário de Teresina e, por extensão, do Piauí todo.
No passado mais remoto, anos 1963 até 1980, grosso modo, colaborei para os jornais: Estado do Piauí, Folha da Manhã, Jornal do Piauí, O Liberal Estou mencionado assim de memória. Certa vez, conversando com o meu correspondente aí, em Teresina, o saudoso amigo e escritor M. Paulo Nunes (1925-2021), ele me afirmou que, na Academia Piauiense de Letras (APL), não entraria escritor que não morasse no Piauí, opinião que era compartilhada pelo saudoso e muito ilustre escritor Celso Barros Coelho.(1922-2023) .Fiquei achando aquilo estranho, pois sou um escritor piauiense nato, enquanto o ilustre jurista e ensaísta Celso Barros Coelho e outros não são piauienses, porém se tornaram piauienses de coração. No caso de. Celso Barros, maranhense. Por que essa discriminação? O Carlos Castelo Branco (1920-1993), piauiense, foi residente em Brasília e no Rio de Janeiro, o Félix Pacheco (1879-1935, idem, o Da Costa e Silva (1855-1950), idem, o Afonso Ligório, idem.
Por que esse “apartheid" contra mim tendo em vista que sempre estive ligado ao Piauí e, a par disso, tendo analisado obras de vários autores piauiense novos nunca analisados por autores piauienses residentes em Teresina. Isso é um absurdo e diria até reducionista, quer dizer, sem cabimento. Historiografia literária é uma tarefa de alta envergadura intelectual e compromisso com a vida literária. Exige de seu cultor muito e variado conhecimento, muita sensibilidade para a área literária e um elevado senso de equilíbrio.
Ante tudo isso, não mais me candidatarei a uma vaga da APL, entidade cultural que sempre respeitei e, inclusive, meu saudoso pai, o eminente professor, escritor e grande jornalista Cunha e Silva (1905-1990) foi dela um ilustre membro efetivo, cadeira nº 8, cujo patrono é José Coriolano de Sousa Lima (1829-1869) sucedido por Antônio Chaves (1883-1938), Breno Pinheiro (1899-1957)), Celso Pinheiro Filho (1914-1974 ), e o atual ocupante, por feliz coincidência, é V., meu querido poeta Francisco Miguel de Moura. Por outro lado, de um coisa neste sentido, não posso deixar de declinar: foi o escritor Oton Lustosa quem, primeiro, me perguntou, isso faz muito tempo, se eu desejava pertencer à APL. Na ocasião, lhe dissera que não, pois não era o meu momento melhor para pensar sobre uma candidatura a um instituição cultural. Não que me opusesse a esse tipo de instituição.
Ao contrário de Graça Aranha (1868-1931), que renunciou à Academia Brasileira de Letras (ABL), não critico quem entre para membro efetivo de uma Academia de Letras ou de outra natureza cultural ou científica. Só há pouco tempo, o poeta de Poemas ou/tonais(1991),obra notável quem por sinal, tive o prazer de resenhar, sendo publicado, primeiro, na Revista Lavra, de Brasília, me perguntou se queria concorrer a uma vaga da APL? Foram só esses dois escritores piauienses - e ninguém mais -, que me perguntaram se queria ocupar uma vaga na APL:. Por isso, lhes sou imensamente grato. Ia comentar seu soneto, porém, sem querer, como num conto digressivo machadiano, terminei por não tecido comentário algum sobre um soneto tão bem literariamente mentado, que é "A falta que faz." Boa noite, nobre poeta. Amplexos fraternos do Cunha e Silva Filho1
Tempo, Universidade, Liberdade
Cunha e Silva filho
O tempo que passamos na universidade, com o fito de recebermos o diploma, muito pesa na nossa formação cultural e, contraditoriamente, muito nos toma daquela liberdade de escolha na questão de leituras, Por essa razão, esse tempo, conquanto fértil de ideias nascidas sobretudo da saudável interação com colegas e professores, tem um tanto de algo que nos faz pensar nas exigências burocráticas que, por si mesmas, não se coadunam com o tempo da criatividade absoluta.
No período pelo menos de quase dez anos em que nos vemos compelidos a ler e a discutir o que nos “obrigam” por injunções da natureza acadêmica, lá se vão preciosos anos em que, de moto próprio, escolheríamos nossos autores, nossas obras sem as pressões impostas pelas datas de entrega de trabalhos monográficos, cujo limite máximo de pressão situa-se no período da escrita da dissertação ou tese.
Confesso-lhe, leitor, que olhando para trás, mal acredito que haja passado por todas essas fases extenuantes, que haja obedecido a cronogramas, a relatórios e a tantas exigências de ordem técnico-burocrática. De parabéns estamos todos os que sobrevivemos a essas mil dificuldades . Não se pode negar que haja momentos de grandes alegrias no meio das canseiras e às vezes até de vontade de desistir de tudo.
Enquanto isso, lá fora do campus esperava por mim um considerável número de autores não lidos no tempo devido. Quer dizer, não se tratava apenas de autores não lidos, porém de estudos gerais não empreendidos e até de maior assiduidade nas leituras de jornais e revistas.
Quando cursei os períodos de pós-graduação me dei conta de que alguns livros não lidos - teóricos ou não -, eram apenas um problema meu, individualmente localizado. Contudo, logo percebi que mesmo professores que lecionavam para nós não haviam lido certas obras, algumas das quais, diria, até imprescindíveis à área de letras. Compreendi que todos temos gaps de leituras. Compreendi mais que todos nós somos culturalmente incompletos. Afinal, entendi que isso não desmerece mestres e alunos. O que é relevante é a capacidade de disponibilidade para o auto-aperfeiçoamento de cada ser humano.
A formação intelectual merece ser orientada cedo por gente especializada a fim de que, no futuro, não seja prejudicada ou nos cause certa frustração por não havermos cuidado mais de nosso desenvolvimento cultural. Foi, de resto, pensando nesse tema que escrevi um pequeno livro sobre diretrizes pedagógicas na formação do educando de letras. A meu ver, a falta de orientação para os jovens não está, em geral, nos planos da docência superior, principalmente no primeiro período de vida universitária e isso é visível em depoimentos que me deram alunos recém-chegados ao terceiro grau de ensino.
Poucos jovens universitários foram beneficiados por mentores intelectuais que, logo lhes reconhecendo a vocação, cuidaram de lhes propiciar a rota correta, antecipadora de deficiências que só vinte, trinta ou quarenta anos adiante, mostrarão suas consequências danosas. Daí que eu considere como o período mais independente do estudioso aquele no qual ele ainda possa dispor de algum tempo útil para em parte contornar as deficiências passadas cuja solução se viu postergada por muito tempo.
É óbvio que me coloco neste capítulo da perspectiva do educando. Entretanto, mesmo demorando a acontecer esse momento de maior liberdade de opções de nossas leituras atuais, é nele que devemos concentrar todo o nosso esforço de aprimoramento contínuo e pertinaz, que é um trabalho de uma vida.
A liberdade nossa agora, fora de constrições acadêmicas, não conhece entraves a não ser os limites ditados pelo tempo, que é breve, tal como a vida, segundo aprendemos com o primeiro aforismo de Hipócrates (Ars longa, vita brevis) na tradução latina.
Seria até conveniente que, posto não o cumpríssemos na integra, traçássemos um plano de horário para estudos, seguindo aquela sugestão uma vez proposta em livro ou artigo de jornal, não sei ao certo, por Tristão de Athayde (1893-1983), segundo a qual as pessoas fazem planos ainda mesmo que não consigam realizá-los por inteiro.
Não somos de ferro, por isso antecipemo-nos em afirmar: nada custa dispormos de um quadro de horários, de segunda a domingo, no qual distribuímos criteriosamente os nossos estudos, as nossas pesquisas e as nossas leituras, Eu mesmo o tenho feito não faz muito tempo, infelizmente. Deveria tê-lo iniciado muito mais cedo. Mas, essa estratégia nos ajuda e nos dá um sentido de organização e responsabilidade intelectual sem o qual nossas estudos tornar-se-iam barcos que, por defeito dos motores, permanecerão na água, à deriva.
Postado por Cunha e Silva Filho às 13:31