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As religiões são caminhos diferentes convergindo para o mesmo ponto. Que importância faz se seguimos por caminhos diferentes, desde que alcancemos o mesmo objetivo?
Gandhi
Parece incrível, mas a ciência nunca perde a capacidade de surpreender e, em alguns momentos, até mesmo de nos confundir. Pesquisadores da Universidade de Duke, nos EUA, ao observarem os cérebros de 268 homens e mulheres com mais de 58 anos, constataram que o hipocampo – região relacionada à formação de memórias – era significativamente menor nas pessoas que se identificavam com grupos religiosos específicos ou que tinham passado por experiências religiosas de mudança de vida.
Segundo esses cientistas, certos aspectos da religião estariam provocando a liberação de hormônios relacionados com o estresse que, ao longo do tempo, diminuiriam o volume do hipocampo. A coordenadora desse estudo, Amy Owen, se mostrou surpresa com esses resultados, uma vez que várias pesquisas apontam para os benefícios da religião no alívio da ansiedade e da depressão.
Enfim, como é possível um estudo fazer uma afirmação dessas enquanto todos os outros defendem algo totalmente diferente?
Discutir com os resultados de uma pesquisa não é uma tarefa fácil, principalmente, porque não se tem acesso às informações e aos dados que foram analisados. No entanto, nada impede que teorizemos sobre o que já foi exposto, tentando chegar as nossas próprias conclusões.
Estar-se ligado a algum tipo de culto, seita ou organização religiosa é um compromisso que implica aceitação de normas, regras e determinados dogmas. As pessoas passam a ter de gerir suas vidas levando em conta as ideias que esse grupo social defende. Assim, pode acontecer que o conceito de “punição divina” seja uma constante na vida desses indivíduos ou que os preceitos presentes na religião que professam entrem em conflito com o que pensam e acreditam. Todas essas situações, segundo os especialistas, podem gerar sentimentos intensos de ansiedade, angústia e medo, o que resultaria na liberação dos hormônios ligados ao estresse.
Não quero chegar ao extremo de endossar ideias como a de Marx, quando afirmou que a religião é o ópio do povo, ou a de Freud, quando disse que ela é comparável a uma neurose de infância. Na verdade, acredito que participar de grupos religiosos pode ser uma atividade extremamente prazerosa e gratificante. O problema ocorre quando as pessoas deixam-se manipular praticando atos que, cedo ou tarde, poderão produzir algum tipo de sofrimento. Logo, o estresse não está na religião, mas na forma como o indivíduo se relaciona com ela.
Deixar-se, por exemplo, levar pelo fanatismo, acreditando-se dono de uma verdade inquestionável e absoluta é o caminho mais curto para uma vida cheia de estresse e ansiedade. Nesse caso, sinto-me tentada a acreditar nos resultados da pesquisa da Universidade de Duke, pois um cérebro fechado às diferenças só pode ser mesmo um cérebro menor.
No entanto, quando a religião é vista apenas como mais um caminho para o desenvolvimento de uma espiritualidade plena e esclarecida, os resultados podem ser totalmente diferentes. Assim sendo, não vejo problema em acreditar numa força superior – um Deus bom e misericordioso – que está sempre disposto a nos perdoar e não a nos punir. Ou em acreditar na existência de uma alma imortal, em constante evolução e aprendizagem. Enfim, essas normas de vida não têm um conteúdo estressante para quem as pratica. Ao contrário. Elas fortalecem o espírito e, consequentemente, o corpo. Um cérebro assim não pode “encolher”.
De qualquer maneira, essa pesquisa americana reacende a polêmica sobre os limites de influência da religião sobre o indivíduo e, consequentemente, a sociedade. Aliás, debate que não é novo e que até agora, como todos sabem, não chegou a uma conclusão satisfatória. Discutir sobre religião nunca foi uma tarefa simples, por se tratar de um tema extremamente delicado para a maioria das pessoas.
Por essa razão, é preciso esperar por maiores esclarecimentos, afinal uma das regras do bom pesquisador é o de não considerar os resultados de suas pesquisas como incontestáveis. Não tirar conclusões precipitadas evita juízos de valor e, como consequência, impede que sejam dados rótulos às pessoas só porque elas acreditam em coisas diferentes. Cérebro grande ou pequeno, o importante é o respeito pelas diferentes crenças, essa é a chave para se compreender o indivíduo e a sociedade na qual ele vive. Uma pessoa que pensa assim não precisa se preocupar com as dimensões do seu cérebro, pois nesse caso, o tamanho, com certeza, não será documento.


⃰Vide CRER OU NÃO CRER? EIS A QUESTÃO, publicada na Revista Virtual Partes em 04/03/2011 (http://www.partes.com.br/cronicas/mhulsendeger/crer.asp).