Redescobrir Clarice

[Luiz Ricardo Duarte]

Dois livros acabadinhos de chegar à minha mesa. O Lustre e Água Viva marcam o início de uma nova fase da divulgação de Clarice Lispector em Portugal. A Relógio d’Água adquiriu, até 2018, os seus direitos de publicação e promete levar a cabo uma edição exaustiva da obra da grande escritora brasileira, revelando até facetas pouco conhecidas, como os seus livros infanto-juvenis (A Mulher Que Matou os Peixes, A Vida Íntima de Laura, O Mistério do Coelho Pensante, Quase de Verdade e Como Nasceram as Estrelas) e dois álbuns lançados sob pseudónimo com conselhos para as mulheres (Correio Feminino e Só para Mulheres – Conselhos, Receitas e Segredos).
 
Esta renovada atenção à escrita de Clarice Lispector não esquecerá a reedição dos livros que já integram o catálogo da Relógio d’Água: Perto do Coração Selvagem, Laços de Família, A Paixão segundo G. H., A Maçã no Escuro, Uma Aprendizagem ou O Livros dos Prazeres, A Hora da Estrela, Contos Reunidos e A Cidade Sitiada. A estes juntam-se agora O Lustre e Água Viva e, também em 2012Para não Esquecer e Um Sopro de Vida. Se a esta notícia juntarmos a tradução, em 2010, na Civilização, da biografia de Benjamin Moser, podemos dizer que a obra Clarice Lispector nunca esteve esteve tão acessível.
 
Publicado em 1946, O Lustre é o segundo livro de Clarice Lispector. Como nota Benjamin Moser na referida biografia, ao contrário do fragmentário Perto do Coração Selvagem, o seu primeiro romance, aqui estamos perante um conjunto coerente. “Apesar de os seus extensos segmentos descreverem propositadamente acontecimentos, consistem sobretudo em longos monólogos interiores, interrompidos apenas por um singular e perturbador fragmento contendo diálogo ou ação”, afirma o investigador norte-americano. “O livro progride em ondas lentas que se elevam, alterosas, nos momentos de revelação. As páginas entre estas epifanias são precisamente os momentos em que o livro se torna mais intolerável para o leitor, que é forçado a seguir o movimento interior de outra pessoa com um detalhe microscópico. Acostumado às epifanias, esperando estímulos e surpresas permanentes, o leitor que aborde o livro pela primeira vez depressa se sente desconcertado.”
 
Água Viva, por seu turno, foi publicado em 1973 e, ainda segundo Moser, "não se parece com nada que tivesse sido escrito na época, no Brasil ou em qualquer outro lugar. Os seus parentes mais próximos são visuais ou musicais, uma semelhança que Clarice enfatiza ao transformar a narradora, uma escritora, nas versões iniciais, numa pintora; na altura, ela mesma dava os primeiros passos na pintura”.
 

Dois livros acabadinhos de chegar à minha mesa. E que ainda não li. Algo que vou ter de resolver brevemente.

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