QUATRO POETAS DO PIAUÍ – Poemas – Parte 3 (final)
Por Elmar Carvalho Em: 16/12/2019, às 10H29
NA NOITE
Elmar Carvalho
Na noite
um sapo coaxa.
Uma puta triste
acha graça. Acha graça.
Um galo
às desoras desfere um canto
fora de hora. E chora.
Um cão ladra por nada:
nenhuma cadela no cio.
O silêncio
grita como louco
na concha acústica
dos labirintos dos ouvidos moucos
por onde um Teseu lasso caminha
em busca do Minotauro – perdido
sem o fio de Ariadne –
conduzido por outro fio
que parte / se parte e
se reparte entre o ser
e o não ser.
E os gritos de Teseu
arrancam ecos
que já ecos de si mesmos
se repetem se repetem
até a mais completa
absoluta exaustão.
CANÇÃO MELANCÓLICA
Clóvis Moura
Nasci coberto de luas.
Minha mãe silenciou:
vai ser poeta das ruas,
e o vaticínio acertou.
Por isto nas praças públicas
meu verso se faz fumaça,
ama o silêncio, a penumbra
que os cadáveres fabricam
ou o riso emurchecido
dos vagabundos notívagos.
Dentro da noite navego
no meu barco sem comando
enquanto o mundo transita
em um mar feito de gritos.
Solto nuvens sonolentas
com o meu verso de fumaça:
que importa se ele naufraga
se sou poeta que passa?
A Santa me olha solene:
será Saudade ou tristeza?
Fico perdido na dúvida
e me duplico: incerteza.
Por isto é que sou poeta
pois a mãe sentenciou:
não caminho em linha reta
e fujo do que já sou.
INVERNO
H. Dobal
Debaixo de chuva os campos anoitecem
preparando a sua ressurreição.
Amanhece com o dia a vida nova
na sangria dos açudes,
nas veias abertas dos riachos.
Chuva cantando nas folhas
água correndo,
água nova cantando no chão.
De novo o resplendor da vida restaurado
num concerto geral
que pássaro nenhum, nenhum instrumento,
nenhuma garganta de homem ou mulher
jamais pode alcançar.
NEL MEZZO DEL CAMIN...
Da Costa e Silva
Passou de leve a Esperança
Pelo meu coração...
Encantou-me no azul do meu sonho de criança:
Ardeu como uma estrela... E era um pobre balão!
Passou de leve a Alegria
Pelo meu coração...
O Amor, dentro em meu ser, como um jardim, floria...
Como é triste, meu Deus, esta recordação!
Passou de leve a Ventura
Pelo meu coração...
Como foi que passou, se a busco com loucura,
Sentindo-me infeliz por desejá-la em vão?