Poema de Maria azenha

meninos do medo meninos sem linguagem



ninguém sabe que os gritos
libertam pérolas de um cativeiro
uma cidade de fogo esplendorosa
caindo a pique
uma infância à porta dos grandes gelos
um nome de inverno com dragões negros
uma palavra acesa nos lábios dos mendigos.

escrevem uma vontade
um navio carregado com os últimos carvões
o vento
a noite
o mar acordado
um pedaço de poesia azul forte. o tempo
acabará por dissolvê-los.

é um grito que gravo nas paredes do meu quarto
um grito de sílabas compactas
procura ainda o fogo
um horror que queima a página.

sopra um vento gelado
um vento insistente
um vento que procura alguém
meninos de pânico do medo
meninos sem linguagem

cantam.
cantam a música que envenena o sangue.

2004,dezembro,25,lisboa