ANA MARIA BERNARDELLI
ANA MARIA BERNARDELLI

CERTEZA

 

 

Poesia

é o pássaro

afogado

no mar

 

o peixe alado

sobre a terra

firme

 

a luz fugidia

na manhã

 

o diáfano

no deserto

 

o rosto

sem tempo

 

a matéria

sangrenta

 

o vento

estático

da vida

 

e o segredo

 

Poesia

é a fé

e a febre

 

a dor e o amor

 

o olhar

no silêncio

e o degredo

 

a mudez do grito

a vela do incêndio

a ausência

do destino

 

Poesia

é o pensamento

é o sentimento

é o deslumbramento

desse canto

amargo

 

Antes de tudo

e depois do nada

 

o fim do começo

e o início do fim

 

Poesia

é a mãe

do mistério

e a solidão

da sombra

 

(a casa

íntima

da alma)

 

Poesia

é a agulha

de coser

o espanto

 

a vaga lírica

a tristeza da alegria

magra

 

o encanto

 

 

Poema de Diego Mendes Sousa

 

Entrevista com Diego Mendes Sousa:

https://www12.senado.leg.br/.../26/dia-nacional-da-poesia...

 

 

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CERTEZA - Diego Mendes Sousa

 

                     Um estudo de Ana Maria Bernardelli*

                             C. Gde. 30/10/2023

 

 

 

O poema "Certeza", de Diego Mendes Sousa, é uma reflexão profunda sobre a natureza da poesia, explorando diversos elementos simbólicos e metafóricos que compõem o seu entendimento do que é a poesia. Através de imagens fortes e marcantes, o poeta nos leva a uma jornada através do pensamento poético, abordando temas como a dualidade, a profundidade emocional e a complexidade da arte poética.

A estrutura do poema, com versos curtos e uma linguagem concisa, reflete a ideia de que a poesia é capaz de comunicar muito com poucas palavras. O uso de metáforas como "o pássaro afogado no mar" e "o peixe alado sobre a terra firme" nos convida a contemplar a contradição e a surpresa que a poesia pode oferecer. A luz fugidia, o diáfano no deserto e o rosto sem tempo evocam um senso de efemeridade e intangibilidade, destacando a natureza elusiva da poesia.

A segunda parte do poema aborda o aspecto emocional da poesia, associando-a à fé, à febre, à dor e ao amor. A noção de "degredo" e "mudez do grito" sugere uma experiência solitária e às vezes dolorosa na busca da expressão poética. A ausência do destino e a vela do incêndio revelam a incerteza inerente à criação poética, onde a direção e o resultado são muitas vezes desconhecidos.

O poema encerra com uma consideração sobre o mistério e a solidão da poesia, retratando-a como a "agulha de coser o espanto". Esta imagem sugere que a poesia costura as partes desconexas do mundo e da experiência humana, tornando-as um único tecido de beleza e significado. A "tristeza da alegria magra" e "o encanto" destacam a complexidade das emoções humanas e a capacidade da poesia de capturar essa complexidade.

Em termos de comparação com outros poetas, o poema de Diego Mendes Sousa ecoa em alguns aspectos versos de Fernando Pessoa, especialmente no que diz respeito à profundidade filosófica e à exploração de temas existenciais. Assim como Pessoa, Sousa mergulha nas complexidades da existência e da linguagem para expressar a essência da poesia e a experiência humana. Ambos poetas também compartilham a habilidade de criar imagens poéticas poderosas e provocativas. No entanto, é importante destacar que cada poeta tem sua voz única e singular, e "Certeza" é uma expressão autêntica da visão de mundo e da estética de Diego Mendes Sousa. Este poema é um exemplo de como a poesia moderna muitas vezes explora a “certeza” nas experiências e percepções pessoais, destacando a importância de encontrar significado na observação atenta do mundo ao nosso redor.

 

*Ana Maria Carneiro Bernardelli é poeta, ensaísta, crítica literária e palestrante. Graduada em Letras, é professora especialista em Literatura Brasileira e Portuguesa, atuando por mais de 40 anos como professora de Literatura e Produção Textual e exercendo magistério desde o ensino básico até a Universidade. Também é Musicista certificada pelo Centro de Artes do Rio de Janeiro. Formada em Língua e Literatura Francesa pela Université de Nancy, França. É Membro da Comissão sul-mato-grossense de Folclore e membro da Academia Sul-Mato-Grossense de Letras.