Cunha e Silva Filho


                   Mal foram concluídas, as eleições presidenciais e as dos novos governadores e eis que, usando de suas prerrogativas, os senadores, deputados federais e juízes federais já deram sinal de que querem aumentar seus salários.
                  Nem bem foram definidos os novos ministros, nem tampouco houve a posse ainda da Presidente Dilma e a avidez da pecúnia já tomou força de dois poderes da República. No mínimo, é uma insensatez e uma ação insensibilidade de nossos homens públicos que legislam e fazem julgamentos.
                  Nem mesmo sabendo que o país atravessa um série de tormentas geradas pela corrupção, pela dinheirama surrupiadas por corruptos da Petrobrás, de grandes empreiteiras e de intermediários coadjuvados com alguns políticos de mais de um partido, inclusive do PT, esses donos do poder não se sentem constrangidos em proclamar seu direito por aumentos salariais, logo eles que são uma “elite” de indivíduos que percebem altos salários do governo federal.
                 A insensatez desses senhores, que deveriam dar um bom exemplo em tempos de Brasil moral e politicamente decadente, provém de um direito - nem bem sei qual é o termo legal para isso -, o de se darem os próprios aumentos, quando, a racionalidade e as supostas leis não poderiam permitir essa aberração que vai de encontro à regra geral de reajuste de salários tanto dos funcionários públicos menos aquinhoados quanto mesmo do setor privado.
               Por outro lado, há que considerar mais um contra-senso. Esse grupo de homens públicos determina seus aumentos salariais quando os outros setores públicos nem mesmo têm tido aumento há uns três anos pelo menos.Ou seja, o aumento deles se dá anualmente, ao passo que o do resto do funcionalismo fica ao sabor da situação financeira do país. É uma insânia tal comportamento dos privilegiados tupiniquins.
               O que agrava mais a situação criada é que o percentual não se pauta por índices da inflação por que passa o país, mas por altos percentuais, entre 20% e 30% só para mais, já que o para menos só vale para as porcentagens eleitorais de candidatos a políticos. Se, por exemplo, um classe de trabalhadores em greve de categorias sem muito poder de barganha política reivindicasse aumentos compatíveis com o alto custo de vida, o Tribunal do Trabalho seria célere em considerar o pleito abusivo. Dura lex sed lex, o que se há de fazer?
               Essa forma de deputados, senadores e juízes se darem o próprio aumento é um aleijão do ponto de vista legal e, se o fato é amparado por lei, que se modifique tal lei. É bem interessante que os contemplados por esse tipo de reajuste, e aí incluo, os políticos, os juízes, em geral não se mostram contrários a esse tipo de majorar salários, i.e., ficam calados, embora possa m alguns deles particularmente serem contrários a esse absurdo que só desmoraliza os detentores desse grupo de privilegiados, o que outrora, na era Collor, chamava-se marajá. Atente-se, o leitor, para a circunstância de que, além dos vencimentos propriamente ditos, que já são polpudos, os deputados e senadores e mesmo os juízes federais, ainda têm outros direitos régios, como verba parlamentares, auxílio moradia, entre outras regalias.Quer dizer, somando-se tudo, o salário real atinge cifras altíssimas e o custo para o Erário Público atinge cifras de milhões por ano.
               Enquanto isso, o aumento dos barnabés, dos baixa renda, dos escalões inferiores do funcionalismo federal, ou de níveis médios de outras categorias profissionais, até nas Forças Armadas, se dá por decreto do Executivo.
              Se o país almeja melhorar sua democracia, que se comece pela reformulação das regras de reajustes salariais e suas gritantes diferenças entre os salários do cidadão brasileiro do setor público. Claro, de acordo com a relevância e a alta responsabilidade dos cargos, tem que haver diferenças, mas que não sejam tão injustas se comparadas, por exemplo, com o brasileiro comum aposentado pelo INSS, que percebe migalhas.
             Agora, me lembro de um senhor aposentado que, ao ser recentemente perguntado por um repórter de tevê se estava contente com a sua aposentadoria, qual não foi a sua resposta: “Estou feliz com dois salários mínimos,” afirmou sorrindo. De loucos todos temos um pouco. Para os governantes, uma resposta como essa é a medida de todas as coisas.
             Fica difícil, portanto, acreditar em mudanças num país que, antes das eleições, seus candidatos prometem mundos e fundos, manipulam dados estatísticos, exibem um Brasil mágico e edulcorado, um paraíso, onde tudo está funcionando quase perfeitamente. As grandes questões e seus gravíssimos desafios passam pela tangente, ardilosamente sabendo que, ao enfrentá-las com objetividade e seriedade, perderão as eleições. E esse comportamento do político brasileiro vem de longe enquanto um povo alegre, festivo, cordial, carnavalizado dança o samba do crioulo doido diante dos donos do poder. Haja Black Friday da momice consumista ianque-brasileira a sustentar o status quo do nosso Planalto e da Praça dos Três Poderes.Como reflexões ao brasileiro, que tal o “homo eroticus” e o conceito de ‘laboratório da pós-modernidade’ do sociólogo francês Michel Maffesoli, que esteve recentemente no país para conferências?