Cunha e Silva Filho

 

                A crítica literária, o ensaio, a tradução, a crônica, o artigo acerca de temas da minha preferência me atraem, mas o momento brasileiro,se não me atrai pela positividade, me atrai para a discussão, o debate, político, a escrita indignada, a escrita “rebelde” ressonâncias limabarretianas?), cujos tons discursivos às vezes resvalam para o panfleto. Mas, me perdoe, leitor, é que, em razão de tanta sem-vergonhice de que se tem notícia a respeito do que ocorre no país, de tanta impunidade consentida, de tanta traição fingida ou verdadeira, mais uma vez, aqui estou para falar da vida nacional.

              No Facebook, me deparo com uma cena, no mínimo, hilariante: o ex-presidente Lula na posse da presidente da Suprema Corte. Lá estava ele, lépido e ladino, com a  mesma  facies que sempre lobriguei no seu olhar e, no seu andar entre pícaro malandro e investigado pela LavaJato. Lá estava ele livre,  solto, um passarinho à procura de uma solução para o país. Naturalmente, conversava com a elite, com os donos do poder ((ainda que, na Terra um tanto devastada, só provisório). Imagine se fôssemos eternos, imortais, infinitos... Quem suportaria tanta notícia e contra-notícia, versões e versões, os  prós e os  contras, fuxicos e conversas ao pé do ouvido, sussurros, balbucios, linguagens cifradas, esoterismos,  camuflagens, espelhos trocados, imagens torcidas, “um vasto mundo” cheio de miasmas se alguns poderosos fossem imortais?

            Eu procuro pelo destino da minha pátria amada como o filósofo Diógenes procura um homem honesto com uma lamparina em pleno   dia de sol. Só vejo neblinas, nuvens pesadas. Descortino realidades inimagináveis no grotesco da política nacional. Não encontro uma saída para atinar com tanta impureza no cenário fosco que se me apresenta o quotidiano da nossa aviltada pública vida. A LavaJato não me sai da cabeça e o diabo é que não consigo dissociá-la da figura do Lula.

           Por outro lado, como hei de enfrentar os subterrâneos, a intimidade da intimidade, da intimidade, como se tratasse de uma ficção utilizando-se do recurso do mise-en abyme? Onde estão a “verdade” e a imaginação do inconsciente coletivo? Será que Freud teria alguma pista para chegar aos fatos incontestáveis  das causas primeiras da origem de todo esse sofrimento por que parte considerável dos brasileiros está passando? Seria isso algo só destrinchado por um Sherlock Holmes saído da ficção e transformado em ser de carne e osso para a nossa realidade tupiniquim? Ou a débâcle financeira nacional teria sua resposta em alguma das tragédias shakespearianas? Como explicar, com argumentos sólidos, inatacáveis o fato de um ex-presidente ser presença na posse de uma presidente do STJ? 

           Então, foram só boatos os resultados da LavaJato, a quase prisão do ex-mandatário? Não se pejam os três poderes da presença do ex-sindicalista na Suprema Corte? Não seria esta uma resposta dos donos do Poder acenando para os brasileiros que, no caso do Lula, da sua transformação em homem de posses, com filhos enriquecidos, ainda que pese a dúvida sobre ser ele dono ou não do sítio de Atibaia? Ora, tudo isso é um grão de areia no Saara se fôssemos a fundo na investigação do famigerado Escândalo do Mensalão, cujos desdobramentos ainda não tiveram um desfecho cabal. Onde esta o Brasil que queremos a salvo das tramoias e chicanas político-partidárias? Será que desejamos um país desenvolvido convivendo com um país campeão da impunidade em quase todos setores da vida pública?

           Seria um desatino pensarmos assim, de vez que a alta impunidade mexe com a infraestrutura das instituições públicas e democráticas. Não podem coexistir progresso com corrupção e impunidade. Os atos lesivos à economia e às finanças do país se sustentam até certo ponto, mas, em seguida, começam a desintegrar-se e os resultados estão à vista dos brasileiros: maior violência, estados falidos, saúde pública falida, funcionários públicos estaduais, juros altíssimos nos cartões de crédito, desemprego, lojas fechando, custo de vida em alta, salários encolhidos e arrochados, cujo exemplo mais trágico é o do Rio de Janeiro, passando seu funcionários e seus aposentados e pensionistas privações sem precedentes na história da vida pública brasileira. De longe, até nos lembram os sofrimentos por que tem passado a sociedade grega atual.

          Se fôssemos fazer uma arqueologia das causas da delicadíssima situação financeira do pais, nos últimos quinze anos, posso apontar como  alguns dos fatores  mais    determinantes os seguintes a roubalheira ativa e passiva , a gastança e a propinagem, os escândalos e as sucessivas denúncias de desvios do dinheiro público em conluio descarado com alguns setores corruptos da empresariado brasileiro.Isso explicita à saciedade o motivo nuclear e decisivo da falência do Estado Brasileiro. O país de nossos sonhos não encontro no mapa geográfico. Onde está o Brasil?