AS COISAS QUE NUNCA ACONTECEM   



                                                       Miguel Carqueija



   -Querido – dizia a loura seminua, de uns vinte e poucos anos – a visão da galáxia é realmente espetacular...
   -Eu não lhe disse? – falou o Rego. – Aqui tudo é espetacular, minha querida. A começar por mim, é claro.
   Ela sorriu e, aproximando-se dele, beijou-o lascivamente na boca. Estavam estendidos num colchonete à beira da piscina, e Rego pusera a funcionar um planetário na cúpula do satélite, para distrair a amante.
   -Eu fico imaginando... – prosseguiu a Rosina – quanto custa a manutenção de uma ilha espacial como essa?
   -A bagatela de quinhentos mil créditos por dia, meu bem. Mas não se preocupe: afinal eu sou o homem mais rico do mundo.
   Ele tinha bigode grisalho, testa enrugada, era meio careca, mas as garotas enxameavam à sua volta. O dinheiro é poderoso!
   Contudo, Rosina era daquelas que pensam: 
    -Aqui é fabuloso, fantástico... mas não é perigoso? Por exemplo, se um meteoro atravessar a cúpula de magiplast, não provocará a descompressão e matará a todos nós?
   -Ora ora, minha flor. Essa possibilidade já foi calculada como sendo de uma vez em cada bilhão de anos...
   -Não pode ser! Tem certeza disso, amorzinho?
   Ele tomou uma dose de conhaque:
   -É claro! São raríssimos os meteoros suficientemente grandes para inutilizar uma cúpula de magiplast. Precisaria um do tamanho de uma casa...
   -Do tamanho de uma casa? Como aquele ali?
   -O que?
   A cúpula, a uns quinhentos metros de altura, rachou-se e rompeu-se subitamente, enquanto um imenso pedregulho cósmico a atravessava. E antes mesmo que a despressurização fosse total, despencou sobre o casal que, abraçado em pânico, despediu-se da vida com gritos horripilantes...