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[Flávio Bittencourt]

O livro da filha do Doutor Lacan

Um pai, de Sibylle Lacan.

 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

"Meu primeiro encontro com Judith [OUTRA FILHA DE JACQUES LACAN]  me arrasou. Ela era tão amável, tão perfeita, e eu tão desajeitada, tão inábil. Ela era a socialidade, a descontração, eu, a camponesa do Danúbio [*] (...)."

 (SIBYLLE LACAN, Um pai, p. 37)

[*] - Referência à fábula de La Fontaine: O Camponês do Danúbio. (N. da T.) 

 

 

 

 

 

Um encontro com Lacan,

Youtube:

 

 

 

 

 

BLOG CAMÉLIA DE PEDRA:

"05 junho 2010

Lacan e suas filhas, Sibylle e Judith.

 


Já faz tempo que venho tentando ler alguma coisa da biografia de Lacan. Isso porque de repente parei para pensar que, embora tenha lido seus seminários e seus escritos, não sabia nada a respeito de sua vida familiar. E claro que um dia ainda ficaria curiosa. Esse dia chegou faz um tempão.
Na faculdade eu ouvi que Melanie Klein, por exemplo, foi uma mãe tão complicada que um de seus fllhos mudou-se para NY e trocou de nome para não ser reconhecido como filho dela. O outro suicidou- se. E a filha, no dia da morte da mãe, foi a uma conferência calçada com longas botas vermelhas para demonstrar que não estava de luto. Santo de casa, não é? Winnicott, que depois de pediatra se tornou psicanalista, e era seguidor de Klein, não teve filhos. Sabe-se apenas que foi bastante dominado por mulheres: mãe, irmãs e esposa.. Freud eu me contentei em saber que foi pai de Anna Freud, que seguiu seus passos. E ainda teve altas richas teóricas com Melanie Klein. E do Jacques Lacan? Procurei no google e encontrei aqui e ali alguma coisa da biografia dele: nasceu em 1901, em um lar católico. Se casou e teve tres filhos desse casamento: Caroline, Thibault e Sibylle (tenho uma prima Sibila, adoro esse nome). Oito meses após o nascimento de Sibylle, nascia Judith, fruto do relacionamento de Lacan com Silvya, uma mulher de origem judia.
Aparentemente quem mais sofreu nessa historia foi Sibylle, consta na biografia dessa filha, publicada em 1994: "
Quando eu nasci, meu pai não estava mais conosco. Até poderia dizer que, quando fui concebida, ele já estava em outro lugar [...]. Sou o fruto do desespero. Alguns dirão que sou fruto do desejo, mas não creio nisso.” Dá dó da menininha, que cresceu com essa crença. Vai ver a mãe sofreu um bocado e a filha assimilou.
E quem certamente ficou com o legado da obra de Lacan foi Judith, que se casou com Jacques Allain Miller, o guardião-mor de tudo que Lacan falou ou escreveu.
Mas enfim, só curiosidade mesmo.
A obra é muito mais importante, nesse caso, do que algumas linhas da biografia estilo fofocas de "Caras". (fotos encontradas em busca no Google. A foto na capa do livro é Sibylle e a outra foto é Judith)

(http://cameliadepedra.blogspot.com.br/search?q=lacan)

 

 

 

 

 

22.11.2012 - O livro de Sibylle Lacan, a filha não-predileta de Jacques Lacan - Um pai - Puzzle. F. A. L. Bittencourt ([email protected])

 

 


    “Numa noite de 1991, Sibylle Lacan, filha do famoso teórico da psicanálise Jaques Lacan, escreve de uma só vez este livro - texto fragmentado, carregado de forte emoção, que a autora afirma não se tratar de um diário, mas sim de um puzzle.  Lembranças sofridas que expõem sua relação de amor e ódio com um pai todo-poderoso, que amava sem restrições outra filha, Judith, fruto de seu segundo casamento.
     Um pai é, acima de tudo, um desabafo doloroso.  Lacan foi, com Sibylle, um pai ausente.  Já separado da primeira mulher na época do seu nascimento, Sibylle e seus dois irmãos imaginavam-no sempre em viagem.  Seus encontros restringiam-se a esparsos jantares requintados e posteriores decepções  (...).
     Um pai é um grito de amor, solitário, cujos ecos ultrapassam o tempo da leitura e permanecem na memória.”


(DA APRESENTAÇÃO DA EDIÇÃO BRASILEIRA DE UM PAI, lIVRO DE SIBYLLE LACAN [LANÇADO POR ÉDITIONS GALLIMARD, PARIS, EM 1994; TRADUÇÃO BRASILEIRA PUBLICADA POR ED. BERTRAND BRASIL, RIO DE JANEIRO: 1996. TRADUTORA: MARIA AMÁLIA RAMOS])

 

 

 

 

 

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"BIOGRAFIA DE JACQUES LACAN (1901-1981)

 
 

 


1901
- Nascimento de JACQUES-MARIE-ÉMILE LACAN em Paris, em 13 de abril, em uma família burguesa de origem provinciana. A família paterna era de vinagreiros de Orléans (os Dessaux) e de sólida tradição católica.

- Lacan era filho primogênito, depois dele viria uma irmã, Madeleine, nascida em 1903, um irmão, Raymond, morto na infância e enfim Marc-François (1908-1994), que teria por ele grande afeição.


1902-1917
- Devido à formação católica, Lacan estudará no Colégio Stanislas, uma célebre instituição dirigida por jesuítas. Aí ele adquire, como seus condiscípulos dos liceus laicos, a formação nobre que abre então para todas as altas funções, inclusive médicas, a formação clássica: latim, grego, alemão, retórica, filosofia e matemática.

- A França separa a Igreja do Estado e na educação de Lacan transmite valores religiosos, sociais e políticos da elite burguesa católica conservadora. Tem um irmão (Marc) e uma irmã (Madeleine).

- Com a idade de 16 anos, admirava a “Ética” de Baruch Spinoza (1632-1677). Um ano depois, voltou-se para o nietzscheísmo, e durante algum tempo ficou fascinado com Charles Maurras (1868-1952), cujo estetismo e gosto pela língua adotou. Enfim, interessou-se pela vanguarda literária.


1918
- O jovem não encontrou entre os que voltaram da guerra o pai carinhoso, moderno e cúmplice, que tanto amava na infância. No entanto, tinha sido uma tia materna quem percebera a precocidade do menino, permitindo que estudasse no colégio Stanislas, em Paris; seu condiscípulo Louis Lepreince-Ringuet relatou seus dotes de então para a Matemática. O provinciano foi introduzido na vida mundana da capital, sendo seduzido por ela; essa dissipação não o impediu de associar aos sólidos estudos médicos um interesse eclético, mas despido de amadorismo, pelas Letras e pela Filosofia mais os pré-socráticos e Platão, Aristóteles, Descartes, Kant, Hegel [com Kojève] e Marx (com Gilson), pela História (Marc Bloch e les Annales), pela lingüística (F. de Saussure, em seus primórdios) e pelas ciências exatas, em particular a Lógica, com B. Russel e Couturat. Depois de estudos no Colégio Stanislas, Lacan rompeu com o catolicismo.

- Como primeira publicação, tem-se dele um poema publicado em “Lê Phare de Neuilly” dos anos 20; obra de fatura clássica, em alexandrinos bem ritmados e de leitura sempre agradável, sem dúvida devido à submissão da forma ao fundo.


1919 - 1928
- Lacan perdeu a fé no final dos anos 20, esse foi o clímax de uma verdadeira interrogação. Como se fizera com seus outros irmãos, acrescentou-se ao seu nome o da Virgem Maria. Progressivamente, renunciaria a esse nome, nos diversos textos escritos no período entre-guerras. Seu pai, Alfred Lacan (1873-1960) era um homem fraco e trabalhava como representante comercial da empresa de vinagres, esmagado pelo poder de seu próprio pai, Émile Lacan (1839-1915). Desejava que seu filho mais velho assumisse a sucessão de seus negócios e desse um impulso decisivo ao comércio de mostarda, não compreendia nem aprovava sua evolução. Quanto à sua mãe, Émilie Baudry (1876-1948), mais intelectual, era inteiramente voltada para a religião, ignorando tudo sobre a vida que o filho levava, fora dos caminhos da religião e do conformismo burguês.

- Matricula-se na faculdade de Medicina. Paralelamente estuda literatura e filosofia aproximando-se dos surrealistas.

- Os estudos de psiquiatria misturaram-se com a freqüência aos surrealistas, o que o colocou entre os dois meios. Mais tarde, irá dizer que a apologia do amor pareceu a ele um impasse irredutível do movimento de A. Breton.

- Na Paris dos anos 1920, este aspirava à glória, comparava-se a Rastignac, freqüentava a livraria de Adrienne Monnier e os surrealistas, assistia com entusiasmo à leitura pública do “Ulisses” de James Joyce (1882-1941), ligando-se a escritores e poetas.

- Após a escolha pela Medicina (ele fez notadamente estágios em Saint-Louis, Laennec, Trousseau e Salpêtrière), passou da neurologia à psiquiatria, especializando-se em doenças mentais.

- Em 1927, é nomeado residente dos asilos. Trabalha no Asilo Sainte-Anne, na segunda secção das mulheres e na Clínica dos Doentes Mentais e do Encéfalo, dirigida, então, pelo Professor Henri Claude, uma das personalidades mais influentes da psiquiatria entre as duas guerras.
 

1928-1929
- Ligado ao Serviço de Enfermaria Especial da Delegacia de Polícia, onde Clérambault trabalha e cuja Apresentação de Doentes faz então acorrer Paris inteira; onde trabalham Georges Heuyer, com quem Lacan aprende “a observação psicoclínica rápida”.

- Em 1929, seu irmão mais novo, Marc-François tornou-se monge beneditino e entrou para a abadia de Hautecombe, situada às margens do lago do Bouget, tendo inclusive participado do “Vocabulaire de théologie biblique”, publicado sob a direção de Xavier-Léon Dufour, com uma contribuição sobre o dom da presença de Deus.

1929-1931
- Passa dois anos no Instituto de Psiquiatria e de Profilaxia Mental do Hospital Henri-Roussele.

- Em agosto e setembro de 1930, faz um estágio de estudos no serviço do Professor H. Maier, na clínica do Burghölzli de Zurich, célebre pelos trabalhos de Eugen Bleuler sobre esquizofrenia, de Jung (criador da Psicologia Analítica) e de Binswanger (promotor da “Psicanálise Existencial).

- Em 1931, provido do diploma de médico-legista, retorna a Sainte-Anne, e é nomeado chefe de clínica, e será o Professor Henri Claude que presidirá a defesa de sua tese em 1932.

- Assiste em outubro de 1931 a VI Conferência dos Psicanalistas de Língua Francesa.

- Textos pré-psicanalíticos (1929-1932).
 
 


1932
- Inicia sua análise com Rudolph Loewenstein e, no fim do ano, publicou sua tese sobre a história de uma mulher criminosa (Marguerite Anzieu), da qual fez um caso de paranóia de auto-punição (o caso Aimée).

- Defende sua tese de Medicina: “Da psicose paranóica em suas relações com a personalidade”, a 7 de setembro de 1932, obtendo o coroamento destes anos de formação.

- Sua tese foi um momento inaugural de sua carreira de médico psiquiatra. É assim uma ilustração clínica das potencialidades do amor, quando esse é levado ao extremo: a facada dada por Aimée na vedete que, a título de ideal, absorvia seu investimento libidinal. Porém, este estudo também representa uma ruptura com os trabalhos dos psiquiatras franceses da época, que viam na psicose paranóica um agravamento dos traços que definiam o caráter paranóico. Clérambault, o único mestre que conseguiu apoiá-lo e em relação ao qual Lacan confessará sua dívida por toda a vida, irá condená-lo posteriormente, acusando-o de plágio.

- O cenário está montado, e nunca irá mudar: a independência de um pensamento solidamente argumentado, em choque com os mestres, a quem ele contraria e dessa forma põe a nu; e também a negativa em ceder ao orgulho do solitário. Seus estudos sobre paranóia, de fato, mostram a ele que os traços manifestados ao mundo pelo doente, são os seus, por ele próprio ignorado (dir-se-ia projetado); e um texto precoce, “Sobre a asserção de certeza antecipada” ilustra, a respeito de um sofisma, que a salvação individual não é um negócio privado, mas da inteligência coletiva, ainda que concorrente. Não há, pois, belas almas, o que seus alunos a seguir não deixarão de lhe censurar, pois não tinha nada mais a lhes propor do que a honestidade intelectual: cada um deve dela deduzir sua moral.

- A descrição fenomenológica exaustiva de um caso (sua tese), dirá Lacan, levou-o à psicanálise; o único meio de determinar as condições subjetivas da prevalência do duplo na constituição do eu. Magnífica síntese de todas as aspirações freudianas e anti-organicistas da nova geração psiquiátrica francesa dos anos 1920, esse trabalho foi imediatamente considerado uma obra-prima por René Crevel (1900-1935), Salvador Dali (1904-1989) e Paul Nizan (1905-1940), principalmente, que apreciaram a utilização feita por Lacan dos textos romanescos da paciente e da força doutrinária de sua posição quanto à loucura feminina. No ano seguinte, na revista “Lê Minotaure”, Lacan dedicou um artigo ao crime cometido em Mans por duas domésticas (as irmãs Papin) contra suas patroas. Viu nesse ato, de uma intensa selvageria, uma mistura de delírio a dois, de homossexualidade latente, mas antes de tudo o surgimento de uma realidade inconsciente que escapava às próprias protagonistas. Desse drama Jean Genet (1910-1986) tirou uma peça, “Les Bonnes”, e Claude Chabrol um filme, sessenta anos depois, “La Cérémonie”.

- Lacan envia um volume de sua tese para Freud, recebendo como resposta apenas um cartão postal banal.


1932-1936
- Lacan era estimado como um brilhante intelectual fora dos meios psicanalíticos franceses, porém sofreu por não ser reconhecido pela Sociedade Psicanalítica de Paris (SPP), na qual seus trabalhos não eram levados em conta e seu anticonformismo causava irritação.

- Início de uma análise pessoal com Rudolph Loewentein (terminará em 1938-1939, culminando com um fracasso e um desentendimento duradouro entre ambos). Lacan descobre a originalidade da experiência analítica em relação à prática psiquiátrica.

- Clérambaut dá um parecer contrário a Lacan, negando a sua admissão como agregado na Universidade. Este relativo fracasso o impulsiona, tanto quanto sua curiosidade apaixonada e as mudanças da psicopatologia na França, a multiplicar suas atividades.

- Em 1934, Lacan decide orientar-se para a psicanálise. Nomeado médico dos Asilos, casa-se com Marie-Louise Blondin (1906-1983), irmã de seu amigo Sylvain Blondin (1901-1975), filha de um destaque em Medicina, com quem terá três filhos: Caroline (1937), Thibault (1939) e Sybille (1940). A viagem de núpcias foi na Itália. Pela primeira vez Lacan descobriu com encantamento a cidade de Roma, pela qual se apaixonou, como Freud. Mas a cidade antiga lhe interessava menos do que a Roma católica e barroca. Durante horas, contemplou os êxtases de Bernini e a arquitetura das igrejas e dos monumentos. Desde o início, o casamento foi insatisfatório. Marie acredita ter-se casado com um homem perfeito, cuja fidelidade conjugal estaria à altura de seus sonhos de felicidade. Lacan não era esse homem, nem nunca seria.

- Participa do grupo de médicos na “l’Évolution Psychiatrique” (EP), onde em 1936 irá ocupar o cargo de vice-presidente.

- Em 1934 adere (nomeado membro aderente) à “Sociedade Psicanalítica de Paris” (SPP), fundada em 1926.

- A passagem por Paris, em 1933, dos psicanalistas berlinenses (conhecidos como a Escola de Frankfurt) a caminho dos Estados Unidos, deu-lhe a ocasião de dirigir-se mais a R.Loewenstein do que a A. Hesnard, R. Laforgue, E. Pichon e até mesmo à princesa Bonaparte.

- Lacan e Freud nunca se encontraram, nem mesmo durante a breve passagem de Freud por Paris, quando da viagem de exílio de Viena para Londres. Freud recusou qualquer contato direto com o conjunto da Sociedade Psicanalítica de Paris (SPP), exceto com a Princesa Marie Bonaparte (membro da SSP), em cuja casa se hospedou antes de seu refúgio em Londres.


1936-1950
- Em 1936, obtém o título de Médico dos Hospitais Psiquiátricos.

- A partir de 1936, Lacan iniciou-se na filosofia hegeliana, no seminário que Alexandre Kojève (1902-1968) dedicou à “Fenomenologia do espírito”. Ficaram conhecidos Alexandre Koyré (1892-1964), Georges Bataille (1897-1962) e Raymond Queneau (1903-1976). Freqüentou a revista “Recherches Philosophiques” e participou das reuniões do Collège de Sociologie. Desses anos de grande riqueza cultural e teórica, tirou a certeza de que a obra freudiana devia se relida “ao pé da letra” e à luz da tradição filosófica alemã.

- O estádio do espelho - 1936

- O artigo “O estádio do espelho como formador da função do eu” foi apresentado, em 1936, ao Congresso internacional de psicanálise em Marienbad, promovido pela (API) Associação Psicanalítica Internacional, sem encontrar outro eco senão o toque de campainha do presidente Ernest Jones, cortando-lhe a palavra e interrompendo uma comunicação demasiado longa. Foi em seguida para Berlim assistir ao Jogos Olímpicos. O triunfo do nazismo provocou nele um sentimento de repugnância.

- O problema do estilo e a concepção psiquiátrica das formas paranóicas da experiência.

- Textos preparatórios de seu ensino.

- Além do “princípio de realidade”- 1936.

- Finalmente, graças à intervenção de Édouard Pichon, Lacan foi titularizado em 1938. Pichon reconhecia seu gênio e queria fazer dele, apesar de seu hegelianismo, o herdeiro de uma tradição “francesa” do freudismo. Lacan nunca obedeceria a essa injunção.

- Em 1938, a pedido de Henri Wallon (1879-1962) e de Luciene Febvre (1878-1956), fez um balanço sombrio das violências psíquicas próprias da família burguesa em um verbete da “Encyclopédie française”. Constatando que a psicanálise nascera do declínio do patriarcado, Lacan apelava para a revalorização de sua função simbólica no mundo ameaçado pelo fascismo.

- A família: o complexo, fator concreto da psicologia familiar. Os complexos familiares em patologia – 1938.

- Em 1938, torna-se membro da Sociedade Psicanalítica de Paris (SPP).

- Desde 1937, apaixonou-se por Sylvia Maklès-Bataille (1908-1993). Separada nessa época do escritor e filósofo Georges Bataille mas continuando a ser sua esposa, atuou em um filme de Jean Renoir (1894-1979), “Ume partie de campagne”. Era mãe de uma menina, Laurence Bataille (1930-1986), que se tornaria uma notável psicanalista. Proveniente de uma família judia romena, Sylvia Bataille integrou-se à alegre equipe do grupo Octobre, com Jacques-Bernard Brunius, Raymond Busseères e Joseph Kosma. Sob a direção de Jacques (1900-1977) e Pierre Prévert, os outubristas procuravam renovar o teatro popular, inspirando-se em Bertolt Brecht (1898-1956) e Erwin Piscator (1893-1966). A irmã mais velha de Sylvia, Bianca, casou-se com o poeta surrealista Theodor Frankel, a mais nova, Rose, com André Masson (1896-1987) e a terceira, Simone, com Jean Piel, diretor da revista “Critique”.

- Do impulso ao complexo – 1939.

- Na última edição da “Revue Française de Psychanalyse”, a única publicada em 1939, uma crítica de Pichon comenta o artigo de Lacan sobre “A Família”, publicado em “L’Encyclopédie française”, a pedido de Anatole de Monzie, deplorando nele um estilo marcado mais pelos idiomatismos alemães do que pela bem conhecida clareza francesa.

- Quando a guerra começou, Sylvia Bataille se refugiou na zona livre. A cada quinze dias, Lacan a visitava. Em Paris, ele interrompeu toda sua atividade pública, recebendo apenas sua clientela particular. Sem pertencer à Resistência, manifestou claramente hostilidade a todas as formas de anti-semitismo. Tinha horror do regime de Vichy e de tudo o que se referisse, de perto ou de longe, à Colaboração. Entretanto, era principalmente com sua vida privada que ele se preocupava durante os dois primeiros anos de guerra.

- Em setembro de 1940, Lacan encontrou-se em uma situação insustentável. Anunciou à sua mulher legítima, que estava grávida de oito meses, que Sylvia, sua companheira, também esperava um filho. Marie pediu o divórcio imediatamente e foi em plena crise de depressão que deu à luz, a 26 de novembro, uma menina: Sibylle. “Quando eu nasci, escreveria esta em 1994, meu pai não estava mais conosco. Até poderia dizer que, quando fui concebida, ele já estava em outro lugar [...]. Sou o fruto do desespero. Alguns dirão que sou fruto do desejo, mas não creio nisso.”

- Oito meses depois, em 3 de julho de 1941, Sylvia deu à luz a quarta dos filhos de Lacan, Judith, registrada com o sobrenome de Bataille. Só poderia usar o nome do pai em 1964. Essa impossibilidade de transmitir o sobrenome seria uma das determinações inconscientes da elaboração do conceito lacaniano de Nome-do-Pai. Judith se casaria futuramente com Jacques-Alain Miller, genro de Lacan e organizador de suas obras.

- No início do ano de 1941, Lacan instalou-se na rue de Lille nº5. Ficaria ali até a morte. Em 1943 Sylvia se instalou no nº3 da mesma rua com suas duas filhas, Laurence e Judith.

- 1945: O tempo lógico e a asserção de certeza antecipada. Um novo sofisma.

- 1946: O número treze e a forma lógica da suspeita.

- 1947: Propósito sobre a causalidade psíquica.

- 1947: A psiquiatria inglesa e a guerra.

- 1948: A agressividade em psicanálise.

- 1948: Ensaio sobre as reações psíquicas do hipertenso.

- 1949: O estádio do espelho como formador da função do eu, tal como nos foi revelado na experiência analítica.



1950-1951
- 1950: Introdução teórica às funções da psicanálise em criminologia.

- Em 1950, Lacan começou esse retorno aos textos de Freud, baseando-se, ao mesmo tempo, na filosofia heideggeriana, nos trabalhos da lingüística saussuriana e nos de Lévi-Strauss. Da primeira, adotou um questionamento infinito sobre o estatuto da verdade, do ser e de seu desvelamento; da lingüística, extraiu sua concepção do significante e de um inconsciente organizado como uma linguagem; do pensamento de Lévi-Strauss deduziu a noção de simbólico, que utilizou em uma tópica (real, simbólico, imaginário: R.S.I.), assim como uma releitura universalista da interdição do incesto e do complexo de Édipo. Revalorizando o inconsciente e o isso, em detrimento do eu, Lacan atacou uma das grandes correntes do freudismo, a “Psicologia do Ego” (iniciada por Anna Freud, filha de Freud), da qual seu ex-analista se tornara um dos representantes, e que ele assimilava a uma versão edulcorada e adaptativa da mensagem freudiana. Chamava-a de “psicanálise americana” e lhe opunha a peste, isto é, uma visão subversiva da teoria freudiana, centrada na prioridade do inconsciente. Como fizera no período entre guerras, Lacan continuou então a estabelecer fortes relações fora do meio psicanalítico: com Roman Jakobson (1896-1982), Claude Lévi-Strauss, Maurice Merleau-Ponty (1908-1961). Graças a Jean Beaufret (1907-1982), de quem era analista, encontrou-se com Martin Heidegger (1889-1976).

- O seminário, (I). Seminários de textos freudianos: o Homem dos Ratos, o Homem dos Lobos, Dora.



1951-1963
- Em 1951, Lacan comprou uma casa de campo, a Prévôté, situada em Guitrancourt, a cerca de cem quilômetros de Paris. Retirava-se para lá aos domingos, para trabalhar e também para receber seus pacientes ou dar recepções. Adorava fazer teatro para os amigos, fantasiar-se, divertir-se e às vezes usar roupas extravagantes. Nessa casa, colecionou um número considerável de livros que, ao longo dos anos, formaram uma imensa biblioteca, cuja simples consulta demonstra o tamanho de sua paixão pelo trabalho intelectual. Em um cômodo que dava para o jardim, organizou um escritório repleto de objetos de arte. No jirau que dominava a peça única, pendurou o famoso quadro de Gustave Courbet (1819-1877) “A origem do mundo”, que comprou a conselho de Bataille e de Masson.

- Sua técnica envolvendo sessões cujo tempo não obedece ao designado pela API, gera controvérsias na SPP. Dá início aos Seminários, uma série de apresentações orais que constituirão o núcleo de seu trabalho teórico.

- XIV Conferência dos Psicanalistas de Língua Francesa sobre transferência.

- Como todos os outros países, depois da Segunda Guerra Mundial, a França freudiana entrou na era dos conflitos, das crises e das controvérsias. A primeira cisão francesa se produziu em 1953, e se desenrolou em torno da criação de um novo instituto de psicanálise e da questão da análise leiga. Tendo como líder Sacha Nacht, os adeptos da ordem médica se opunham aos universitários liberais, que cercavam Daniel Lagache e defendiam os alunos do instituto, revoltados com o autoritarismo de Nacht.

- Os trabalhos de Lacan, empreendidos no âmbito da Associação Internacional fundada por Freud, encontrariam os referenciais institucionais na sucessão dos grupos de que ele foi fundador e mentor através de uma série de cisões e inovações. Violentamente hostil a Lacan e impressionada com a agitação de seus alunos, Marie Bonaparte, mesmo favorável à análise leiga, deu apoio ao grupo de Nacht, provocando assim a partida dos liberais e da grande maioria dos alunos.

- Lagache fundou então a Sociedade Francesa de Psicanálise (SFP, 1953-1963), formada por Lacan, Dolto, Juliette Favez-Boutonier, e pelos principais representantes da terceira geração psicanalítica francesa: Didier Anzieu, Jean Laplanche, Jean-Bertrand Pontalis, Serge Leclaire, François Perrier, Daniel Wildlöcher, Jenny Aubry, Octave Mannoni, Maud Mannoni e Moustapha Safouan. A exceção de Wladimir Granoff, todos estavam (ou tinham estado) em análise ou em supervisão com Lacan. Era a primeira cisão do movimento psicanalítico francês.

- O motivo do rompimento foi a decisão tomada pela Sociedade Parisiense de fundar um Instituto de Psicanálise, encarregado de ministrar um ensino regulado e diplomável, tendo como modelo o da faculdade de Medicina. No entanto, a ignoraria o caráter ambíguo e espontaneamente falacioso de nossa relação com o saber, quando ele é imposto? Mas a realidade sem dúvida, era mais banal: o seminário de Lacan, os cursos na Sorbonne de Legache e de Favez-Boutonier, o carisma de Dolto, atraíam a maioria dos estudantes, que, aliás, acompanharam-nos nesse êxodo. Este conheceu a atmosfera estimulante e fraterna das comunidades de liberados por sua partida. Quando do primeiro congresso da SFP, que se realizou em Roma em setembro de 1953, Lacan fez uma notável intervenção, “Função e campo da fala e da linguagem na psicanálise” (ou “Discurso em Roma”), na qual expôs os principais elementos de seu sistema de pensamento, provenientes da lingüística estrutural e de influências diversas, oriundas da filosofia e das ciências. Elaborou vários conceitos (sujeito, imaginário, simbólico, real, significante), que desenvolveria ao longo dos anos enriquecendo-os com novas formulações clínicas e depois lógico-matemáticas: foraclusão, Nome-do-Pai, matema, nó borromeano, sexuação.

- Desde seu ingresso na SPP em 1938, Lacan atraiu muitos alunos, fascinados pelo seu ensino e desejosos de romper com o freudismo acadêmico da primeira geração francesa. Começou então a ser reconhecido ao mesmo tampo como didata e como clínico. Seu senso agudo da lógica da loucura, sua abordagem original do campo das psicoses e seu talento lhe valeram, ao lado de Françoise Dolto, um lugar especial aos olhos da jovem geração psiquiátrica e psicanalítica.

- Ao deixar a SPP, contudo, os fundadores da nova SFP tinham perdido, sem se dar conta, sua filiação à API. A partir de 1953, iniciaram-se negociações com a executiva central, para que esse segundo grupo francês fosse filiado. Nessa época, ninguém pensava em se emancipar da legitimidade freudiana, muito menos Lacan. Apoiados por ele, Granoff, Leclaire e Perrier formaram uma “tróica”, cuja tarefa era negociar a reintegração da SFP à API.

- Em julho de 1953, divorciada de Georges Bataille desde agosto de 1946, Sylvia casou-se com Lacan, na prefeitura de Tholonet, perto de Aix-em-Provence. Durante muitos anos, a pedido de Marie, sua primeira esposa, Lacan não revelaria aos filhos de seu primeiro casamento a existência do segundo lar, onde criava duas filhas, a sua e a de Sylvia Bataille. Essa confusão teria conseqüências dramáticas para as duas famílias.

Contestado, ao longo dessa crise, pela sua prática das sessões de duração variável (ou sessões curtas), que questionavam o ritual da duração obrigatória (45-50 minutos), imposto pelos padrões da IPA, Lacan ficou do lado dos universitários. Certamente, mostrava-se favorável à análise leiga, mas não compartilhava nenhuma das teses de Lagache sobre a psicologia clínica. Recusando qualquer idéia de assimilação da psicanálise a uma psicologia qualquer, considerava os estudos de filosofia, de letras ou de psiquiatria como as três melhores vias de acesso à formação dos analistas. Reatou assim com o programa projetado por Freud, quando do congresso da IPA em Budapeste, em 1918.

- Conferência sobre “O simbólico, o imaginário e o real”. “Relatório de Roma” sobre “Função e campo da fala e da linguagem em psicanálise”.

- O mito individual do neurótico ou poesia e verdade na neurose.

- Função e campo da palavra e da linguagem em psicanálise. Discurso do congresso de Roma e resposta às intervenções – 1956.

- Graças a seu amigo Jean Delay, obteve um anfiteatro no Hospital Sainte-Anne. Durante dez anos, duas vezes por mês realizou ali seu seminário, comentando sistematicamente todos os grandes textos do corpus freudiano e dando assim origem a uma nova corrente de pensamento: o lacanismo. O “Discurso de Roma” foi publicado no primeiro número de “La Psychanalyse”, revista da SFP. A cada ano, Lacan daria a essa revista o texto de suas melhores conferências, que eram uma espécie de resumo dos temas do seminário. Também publicaria nela artigos de Martin Heidegger, Émile Benveniste, Jean Hyppolite (1907-1968) e muitos outros. Durante dez anos, o ensino de Lacan deu à comunidade freudiana francesa um desenvolvimento considerável: “nossos mais belos anos”, diriam os ex-combatentes desse grupo em crise e desse movimento em busca de reconhecimento.

- Seminário I: Os escritos técnicos de Freud - 1953

- Seminário II: O eu na teoria de Freud e na técnica da psicanálise – 1954.

- Variações da cura-tipo.

- A coisa freudiana ou sentida do retorno a Freud em psicanálise.

- Seminário III: As psicoses - 1955.

- Situação da psicanálise e formação do psicanalista em 1956.

- Seminário IV: a relação de objeto e as estruturas freudianas - 1956.

- Introdução e resposta ao comentário de Jean Hypolite sobre a “verneinung” de Freud –1956.

- O seminário sobre a carta roubada – 1957.

- A psicanálise e seu ensino. –1957.

- A instância da letra no inconsciente ou a razão desde Freud.

- Seminário V: As formações do inconsciente - 1957.

- De uma questão preliminar a todo tratamento possível da psicose – 1958.

- Juventude Gide ou a letra e o desejo.

- A direção da cura e os princípios de seu poder.

- Seminário VI: o desejo e sua interpretação - 1958.

- Seminário VII: a ética da psicanálise - 1959.

- À memória de Ernest Jones: sobre sua teoria do simbolismo – 1960.

- Observação sobre a exposição de Daniel Lagache.

- Seminário VIII: a transferência em sua disparidade subjetiva – 1960-1961.

- A metáfora do sujeito – 1961.

- A posição humanista de Merleau- Ponty – 1961.

- Seminário IX: A identificação - 1961.

- Seminário X : a angústia - 1962.

- Seminário X bis : Os nomes do Pai – 1963

- Kant com Sade – 1963

- Em 1963, após cerca de dez anos de discussão e intercâmbio (desde 1953), o comitê executivo da API admite a filiação da SFP, mas recusou a Lacan e a Dolto o direito de formar didatas. As razões dessa recusa eram complexas. Lacan era acusado de transgressão das regras técnicas, principalmente das que determinavam a duração das sessões. Quanto a Dolto, o problema era, em parte, sua maneira de praticar a psicanálise de crianças, mas também sua formação didática: nessa época, os alunos de René Laforgue foram convidados a fazer uma nova análise. Assim, a segunda cisão (“excomunhão”, como diria Lacan) do movimento psicanalítico ocorreu durante o inverno desse ano. Foi vivida como um desastre por todos os membros da SFP, tanto pelos alunos quanto pelos negociadores: Leclaire, Lacan, Granoff, Perrier, e Pierre Turquet pela Grã-Bretanha.



1964-1969
- 1964: Retira-se da Sociedade Francesa de Psicanálise, mediante um rompimento definitivo com a API, enquanto a maioria de seus melhores alunos se posicionou ao lado de Lagache, na Associação Psicanalítica da França (AFP), mantendo o reconhecimento pela API. Eis a segunda cisão do movimento psicanalítico francês.

- 1964 funda a Escola Freudiana de Paris (EFP). Seguiram-no a esse novo deserto um punhado de amigos como Françoise Dolto, Maud e Octave Mannoni, Serge Leclaire, Moustapha Safouan e François Perrier, e alguns alunos isolados. Graças a seu trabalho, iria se revelar de uma fecundidade excepcional. Obrigado a deslocar seu seminário, Lacan foi acolhido, graças à intervenção de Louis Althusser, em uma sala da Escola Normal Superior (ENS), na rue d’Um, onde pôde prosseguir seu ensino.

- Na ENS, Lacan conquistou um novo auditório, uma parte da juventude filosófica francesa, à qual Althusse confiou o cuidado de trabalhar seus textos. Entre eles, encontrava-se Jacques-Alain Miller, que se casou com Judith Lacan em 1966. Tornou-se redator dos seminários do sogro, seu executor testamentário e o iniciador, a partir de 1975, de uma corrente neolacaniana no próprio interior da Escola Freudiana de Paris (EFP).

- Em um artigo de 1964, Althusser fez um belo retrato de Lacan, bastante preciso. Apreendeu muito bem suas grandezas e fraquezas, seu rigor teórico, sua dor nos combates: “Daí a paixão contida, escreveu ele, a contenção apaixonada da linguagem de Lacan, que só pode viver e sobreviver em estado de alerta e prevenção. Linguagem de um homem assediado e condenado, pela força esmagadora das estruturas e das corporações, a prever seus golpes, a pelo menos fingir que responde a eles antes de recebê-los, desencorajando assim o adversário de abatê-lo [...]. Tendo que ensinar a teoria do inconsciente a médicos, analistas ou analisados, Lacan lhes dá, na retórica de sua fala, o equivalente mimético da linguagem do inconsciente, que é, como todos sabemos, em sua essência última, trocadilho, metáfora, bem ou malsucedida: o equivalente da experiência vivida em sua prática, seja ela de analista ou de analisado.”

- Seminário XI: Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise – 1964.

- Seminário XII: Problemas cruciais para a psicanálise - 1964.

- Propósitos diretivos para um congresso sobre a sexualidade feminina. – 1964.

- Seminário XIII : O objeto da psicanálise - 1965.

- Em 1965, com o estímulo da François Wahl, Lacan fundou a coleção “Champ Freudien” nas Éditions du Seuil.

- A significação do falo – 1966.

- Subversão do sujeito e dialética do desejo no inconsciente freudiano – 1966.

- Do “trieb” de Freud e do desejo do psicanalista.

- Posição do inconsciente – 1966.

- Seminário XIV: A lógica do fantasma – 1966.

- “O psicanalista só pode se autorizar por si mesmo.”

- Homenagem feita a Marguerite Duras, do deslumbramento de Lol V. Stein.

- O lugar da psicanálise na medicina ou psicanálise e medicina.

- A ciência e a verdade – 1966.

- Em outubro de 1966 Lacan foi aos Estados Unidos, convidado para o simpósio sobre o estruturalismo organizado por René Girard e Eugenio Donato, na Universidade Johns Hopkins, de Baltimore: “Em Baltimore, escreveu Derrida, ele me falou sobre como pensava que o leriam, especialmente eu, depois de sua morte [...]. A outra inquietação que ele me confidenciou se referia aos “Écrits (Escritos)”, que ainda não tinham sido publicados, mas que logo o seriam. Lacan estava preocupado, um pouco descontente, pareceu-me, com aqueles que, na editora, lhe aconselharam reunir tudo em um único volume [...]. Você verá, disse ele, fazendo um gesto com a mão, vai soltar.”

- Em 15 de dezembro de 1966, publicou os “Escritos”. A obra mostrava os vestígios de sua difícil elaboração: reescrita do próprio Lacan, correções múltiplas de Wahl, comentários de Miller. Lacan recebeu enfim a consagração esperada e merecida: 5.000 exemplares foram vendidos em 15 dias, antes mesmo que aparecessem resenhas na imprensa. Mais de 50.000 exemplares foram vendidos na edição comum e a venda da edição de bolso bateria todos os recordes para um conjunto de textos tão difíceis: mais de 120.000 exemplares o primeiro volume, mais de 55.000 o segundo. Doravante, Lacan seria reconhecido, celebrado, odiado ou admirado como um pensador de envergadura, e não mais apenas como um mestre da psicanálise. Sua obra seria lida e comentada por inúmeros filósofos, entre os quais Michel Foucault (1926-1984) e Gilles Deleuze (1925-1995).

- Seminário XV : o ato psicanalítico - 1967.

- Propõe a criação do "passe", dispositivo regulador da formação do analista.

- Seminário XVI : De um Outro ao outro - 1968.

- 1968: Lançamento da revista Scilicet, do Campo Freudiano.

- O equívoco do sujeito suposto saber.

- De Roma 53 a Roma 67: a psicanálise. Razão de um fracasso.

- Da psicanálise em suas relações com a realidade.

- Pequeno discurso aos psiquiatras.

- Discurso de encerramento das jornadas sobre as psicoses da criança.

- Proposição de 9 de outubro de 1967 sobre o psicanalista na escola.

- Apresentação da tradução de P. Duquenne das memórias de um neuropata (Schreber).


1969-1971
- Apresentação da publicação dos Escritos I – 1969

- Seminário XVII – O avesso da psicanálise - 1969.

- A sexuação, o gozo, o discurso.

- O nó borromeano, o Sinthoma.

- A terceira cisão da história do movimento francês, marcou a entrada da EFP em uma crise institucional que resultou em sua dissolução a 5 de janeiro de 1980, e depois na dispersão do movimento lacaniano em cerca de vinte associações. Confrontado com o gigantismo da EFP, Lacan tentou resolver os problemas de formação com a introdução do passe, novo procedimento de acesso à análise didática. Aplicado a partir de 1969, provocou a partida de um grupo de analistas oponentes (Perrier, Piera Aulagnier, Jean-Paul Valabrega), que formaram uma nova escola: a Organização Psicanalítica de Língua Francesa (OPLF) ou Quarto Grupo.

- Transfere seu seminário para a Universidade do Panthéon, onde a multidão se apressa em segui-lo.

- Alocução pronunciada para o encerramento do congresso da EFP em 19 de abril de 1970, por seu diretor.

- Radiofonia – 1970

- Prefácio ao livro de A.Rifflet-Lamaire: Jacques Lacan – 1970

- Lituraterra – 1971 (Literatura e psicanálise).

- Seminário XVIII: De um discurso que não seria do semblante - 1971.


1971-1979
- Seminário XIX, XIX bis, XIX integrado: ...Ou pior – 1971-1972

- Seminário XX: Mais, ainda – 1972

- Seminário XXI: Os incautos não erram (os nomes do pai)– 1973.

- O aturdido –1973 ( condensar: dito, o não- dito e o dizer).

- Televisão – 1973

- A psicanálise neste tempo -1973

- 1973: Publicação da transcrição do Seminário XI, Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise, realizado em 1964. A partir daí, os seminários passam a ser editados segundo esse procedimento. Nesse mesmo ano, sua filha Caroline morre num acidente de automóvel.

- O despertar da primavera – 1974

- Em 1974, Lacan dirigiu, na Universidade de Paris-VIII, no departamento de psicanálise, fundado por Serge Leclaire em 1969, um ensino do “Campo freudiano”, cuja responsabilidade confiou a Jacques-Alain Miller. Encorajou então a transformação progressiva de sua doutrina em um corpo de doutrina fechado, enquanto trabalhava para fazer da psicanálise uma ciência exata, baseada na lógica do matema e na topologia dos nós borromeanos.

- A Terceira – 1975 (A terceira retorna, é sempre a primeira).

- Seminário XXII: Real, Simbólico, Imaginário - RSI -1975

- Talvez em Vincennes – 1975 : Lacan expõe as condições necessárias para um verdadeiro ensinamento da psicanálise.

- Conferências nos Estados Unidos – 1975.

- O Seminário XXIII – O sintoma - 1975.

- Seminário XXIV – O não-sabido que sabe/ o não-insabido que é - 1976.

- Resposta de Lacan a uma pergunta formulada por Marcel Ritter -1976

- Abertura da seção clínica em Vincennes -1977

- Exposição sobre o inconsciente: “É a leitura de Freud...” – 1977

- Seminário XXV – O momento de concluir – 1977

- Conferência para o professor Deniker no Hospital Sainte-Anne. Se o inconsciente é “o que se constrói com a linguagem, é uma trapaça: a associação de idéias, é a entrega à sorte; é pela via do acaso que se procede para libertar alguém disto que chamamos de sintoma. Então, avaliação de fracasso quando já é tarde demais?”.

- Seminário XXVI: A topologia e o tempo - 1978.


1980-1981
- Como resquício da terceira cisão e aos primeiros sinais da doença do fundador, alguns seguidores seriam tomados pela agitação, o que o levou Lacan a dissolver sua Escola. Anuncia a dissolução da EFP e funda em outubro a Escola da Causa Freudiana. A intenção de Lacan foi assegurar à psicanálise um estatuto científico que teria protegido suas conclusões da malversação dos taumaturgos e também o teria imposto ao pensamento ocidental.

- Na dissolução, em 5 de janeiro de 1980, Lacan redige uma carta onde pronuncia a dissolução da EFP. Ao mesmo tempo, chama a “se associar de novo” aqueles que querem “prosseguir com Lacan”. Para a nova Escola que virá, Lacan fará a seleção das demandas. Na ambigüidade, ele parece querer partir – “a fim de ser Outro finalmente” – e a fim de que o “Outro falte” – e já prevê uma nova organização.


- O seminário de Caracas em julho de 1980. Lacan anuncia a criação de “minha causa freudiana”. “Cabe a vocês serem lacanianos, se quiserem. Eu, eu sou freudiano”. O que não impede que Lacan marque nitidamente as diferenças entre as duas teorias.

- Últimas cartas públicas: elas saúdam a nova escola criada em seu nome. “Meu forte é saber o que esperar significa”.

- Conferência: Propósito sobre a histeria – 1981

- Conferência na Universidade de Louvain -1981

- O saber do psicanalista – 1981

- Nota Italiana – 1981

- Depois de passar sozinho um final de agosto, atingido por distúrbios cerebrais e por uma afasia parcial, morre Lacan aos 80 anos de idade, em 9 de setembro de 1981, na Clínica Hartmann de Neuilly, depois da ablação de um tumor maligno do cólon, tendo sido enterrado com uma discrição que não permitiu que muitos de seus alunos mais próximos rendessem a ele a homenagem que lhe deviam.

     
 
 
*                    *                    *

Dentre os grandes intérpretes da história do freudismo, Jacques Lacan foi o único a dar à obra freudiana uma estrutura filosófica e a tirá-la de seu ancoramento biológico, sem com isso cair no espiritualismo. O paradoxo dessa interpretação inovadora única é que ela reintroduziu na psicanálise o pensamento filosófico alemão, do qual Sigmund Freud se tinha voluntariamente afastado. Essa poderosa contribuição fez de Lacan o único verdadeiro mestre da psicanálise na França, o que lhe valeu muita hostilidade. Mas se alguns de seus ferozes adversários foram injustos, ele se prestou à crítica ao cercar-se de discípulos pedantes, que contribuíram para obscurecer um ensino certamente complexo e muitas vezes enunciado em uma língua barroca e sofisticada, mas perfeitamente compreensível (pelo menos até 1970).

Lacan sofria de inibições na escrita e precisou de ajuda para publicar seus textos e transcrever o famoso seminário público, que se realizou de 1953 a 1979. Nove seminários entre vinte e cinco foram “estabelecidos” e publicados por seu genro, Jacques-Alain Miller, entre 1973 e1995. O vigésimo sexto seminário, do ano 1978-1979, é “silencioso”, pois Lacan não mais podia falar.

Jacques Lacan redigiu cerca de 50 artigos, em geral oriundos de conferências: 34 deles, os mais importantes, foram reunidos pelo editor François Wahl em 1966, em uma imponente obra de 900 páginas, intitulada “Escritos”, à qual se devem acrescentar as “variantes” realizadas em 1994 por Angel de Frutos Salvador. Um grande artigo de Lacan, publicado em 1938, foi editado em livro por Jacques-Alain Miller em 1984 (Os Complexos Familiares), outro, “O aturdido”, foi publicado na revista “Scilicet”, fundada por Lacan. Enfim, duas entrevistas foram realizadas, uma por Robert Georgin para a Rádio Televisão Belga (“Radiophonie”), outra por Jacques-Alain Miller, para um filme do serviço de pesquisas da ORTF, realizado por Benoit Jacquot (Télévision). Jacques Lacan escreveu apenas um livro, sua tese de medicina de 1932 publicada sob o título “Da psicose paranóica em suas relações com a personalidade, na qual relatou o caso de Marguerite Anzieu.

Seus outros artigos, assim como suas numerosas intervenções em colóquios ou na École Freudienne de Paris (EFP) estão dispersos em várias revistas. Sua correspondência é quase inexistente: 247 cartas recenseadas por Elisabeth Roudinesco em 1993. A obra de Lacan está traduzida em 16 línguas, e Jöel Dor realizou a melhor bibliografia do conjunto de títulos, publicados e inéditos.

Jacques Lacan reinterpretou quase todos os conceitos freudianos, assim como os grandes casos (Herbert Graf-Hans, Ida Bauer, Serguei Constantinovitch Pankejeff, Ernst Lanzer e Daniel Paul Schreber) e acrescentou ao corpus psicanalítico sua própria conceitualidade.
Existem dois dicionários dos conceitos lacanianos: um em inglês, realizado por Dylan Evans, outro em espanhol, por Ignácio Garate e José Miguel Marinas. Alguns dos mais belos comentários da obra de Lacan foram escritos por filósofos: Louis Althusser (1918-1990), Jacques Derrida, Christian Jambet, Jean-Claude Milner e Bernard Sichère.




Bibliografia

MARINI, MARCELE- Lacan a trajetória do seu ensino – Artes Médicas, RS-1991

NASIO, J-D - Introdução às Obras de Freud, Ferenczi, Groddeck, Klein, Winnicott, Dolto, Lacan, Jorge Zahar Editor, RJ-1995

ROUDINESCO, ELISABETH - Dicionário de Psicanálise, Jorge Zahar Editor, RJ-1997

CHEMAMA, ROLAND - Dicionário de Psicanálise Larousse, Artes Médicas, RS-1995

LAPLANCHE E PONTALIS – Vocabulário da Psicanálise, Martins Fontes, SP-2000

KAUFMANN, PIERRE – Primeiro Grande Dicionário Lacaniano, Jorge Zahar Editor, RJ-1996
 
 
 
 
 
CRONOLOGIA DOS SEMINÁRIOS  (1953-1980)
 
 
 
 
 
 
- Seminário 1 - “Os escritos técnicos de Freud” (1953-1954).

- Seminário 2 - “O eu na teoria de Freud e na técnica da psicanálise” (1954-1955).

- Seminário 3 - “As psicoses” (1955-1956).

- Seminário 4 - “A relação de objeto” (1956-1957).

- Seminário 5 - “As formações do inconsciente” (1957-1958).

- Seminário 6 - “O desejo e sua interpretação” (1958-1959).

- Seminário 7 - “A ética da psicanálise” (1959-1960).

- Seminário 8 -“A transferência” (1960-1961).

- Seminário 9 - “A identificação” (1961-1962).

- Seminário 10 - “A angústia” (1962-1963).

- Seminário 10 bis – “Os nomes do Pai” (1963).

- Seminário 11 - “Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise” (1963-1964).

- Seminário 12 - “Problemas cruciais para a psicanálise” (1964-1965).

- Seminário 13 - “O objeto da psicanálise” (1965-1966).

- Seminário 14 - “A lógica do fantasma” (1966-1967).

- Seminário 15 - “O ato psicanalítico” (1967-1968).

- Seminário 16 - “De um Outro ao outro” (1968-1969).

- Seminário 17 - “O avesso da psicanálise” (1969-1970).

- Seminário 18 - “De um discurso que não fosse semblante” (1970-1971).

- Seminário 19 - “...Ou pior” (1971-1972).

- Seminário 19 bis – “...Ou pior. O saber do psicanalista” (1971-1972).

- Seminário 19 Integrado – “...O pior (O saber do psicanalista)” (1971-1972).

- Seminário 20 - “Mais, ainda” (1972-1973).

- Seminário 21 - “Os incautos não erram (os nomes do pai)” (1973-1974).

- Seminário 22 - “R.S.I.” (1974-1975).

- Seminário 23 - “O sinthoma” (1975-1976).

- Seminário 24 - “L’insu que sait de l’une bévue s’aile à mourre” (1976-1977).

- Seminário 25 - “O momento de concluir” (1977-1978).

- Seminário 26 - “A topologia e o tempo” (1978-1979).

- Seminário 27 - “Dissolução” (1979-1980)."
 
 
 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

(http://circulodepsicanalise.blogspot.com.br/p/lacan_26.html)