Quando Chico Buarque ganhou o prêmio Jabuti por seu livro “Leite Derramado”, houve protestos e inclusive uma petição contra a premiação, com grande repercussão nos blogs conservadores. A premiação, segundo eles, era política e indicava um domínio da “esquerda” nos meios culturais, que agia sorrateiramente calando as vozes contrárias e minando os valores e a moralidade tradicionais, subvertendo a ética.

Um pouco dessa visão foi novamente propagada na (falsa) polêmica sobre o livro do MEC que “ensinaria a escrever errado”. De nada adiantou desmontar essa tese tanto quanto ao real conteúdo do livro quanto ao que seria “certo e errado” . (Àqueles fizeram claque à polêmica, vos peço que escrevam como Camões ou Gil Vicente.)

Ontem, quinta feira (02), a Academia Brasileira de Letras aprovou o nome de Merval Pereira para a vaga de Moacyr Scliar. O agora imortal da literatura brasileira tem uma extensa obra de dois livros, um dos quais escrito em 1979 e fora de catálogo. O outro é uma compilação de pequenas colunas dedicadas a atacar o governo Lula.

É uma obra magnificente que deve ter seu próprio mérito enquanto arte pura, narrativa. Estamos vendo o nascimento tardio de um novo mestre, um Machado de Assis, só que ainda não percebemos e por isso as críticas desse pessoal recalcado da esquerda.

Assim sendo, como também colunista, lanço aqui minha futura candidatura à ABL. Tenho uns textos legais, e uns tuítes massa, com bastante informação e algumas ironias, como recurso estilístico que os bons escritores usam. Tenho também uma dissertação de mestrado, que um dia publicarei postumamente.

Adoraria tomar chá às 17h no Castelo, no Rio de Janeiro, mimetizando o hábito inglês. Adoraria também usar aquele fardão lindo e me sentir na companhia de Joaquim Nabuco, no fim do século 19. Melhor ainda é ser imortal. Realizaria o sonho da humanidade e daria um fim à própria finitude.

Mas parece que para ser da ABL nos dias de hoje precisaria fazer umas colunas que agradassem ao mainstream, que é senso-comum ao mesmo tempo, que sejam daquele “politicamente incorreto” tão em voga, daquele habitante da reaçolândia, como tão bem descreveu Marcelo Rubens Paiva.

E além dos bons chás, da beleza imponente do fardão, teria eu as agradáveis companhias de José Sarney (“Marimbondos de Fogo”), Marco Maciel (?) e do próprio Merval Pereira.

É, peço desculpas a Ariano Suassuna e Alfredo Bosi, mas nem a companhia deles e nem mesmo a imortalidade tão sonhada valeriam esse sacrifício. Assim sendo, melhor retirar a minha futura candidatura.