O eleitor : um indeciso
Por Cunha e Silva Filho Em: 04/10/2012, às 13H11
O eleitor brasileiro: um indeciso
Cunha e Silva Filho
Uma vez, um padre brasileiro, após a liturgia da missa, afirmou pela tevê o seguinte: “Votem no candidato certo!” Minha mulher, então, fez a seguinte pergunta para sim mesma ou para quem a ouvisse: “E quem é, afinal, o candidato certo? Diz o Novo Testamento, pela boca de Cristo: “Amai o próximo como a ti mesmo.”. “Mas, quem é meu próximo?”, disse um homem da multidão.
Eis uma boa pergunta, difícil, contudo, de ser respondida. Os eleitores, durante um período determinado pelo Tribunal de Justiça Eleitoral, assiste à desacreditada “propaganda Eleitoral”, que alguém com espírito engraçado e malicioso - e com certa razão - a chamou uma vez de programa humorístico. Dizem as más línguas que grande parte do povão, e aqui incluo no bolo os diversos níveis sociais e culturais de telespectadores, logo que aparece o “obrigatório’ programa eleitoral, pega de um controle remoto e muda de canal, ou melhor, muda para os canais de assinatura a fim de se livrar de uma parte do programa eleitoral que não passa de mentiradas de alguns candidatos.
Seria o programa um mal necessário? Mesmo com todas as mentiras que não mais são engolidas pelo telespectador mais politizado, já é hora de o Tribunal de Justiça Eleitoral repensar uma outra forma de realizar a propaganda eleitoral. O mínimo que ela pode fazer para o telespectador até hoje é uma amostragem do variado nível de qualificação dos candidatos. Os eleitores, peneirando cuidadosamente alguns candidatos melhores, vão aos poucos anotando algumas ideias colhidas das apresentações de cada um deles, assim como o nome do partido e o nº do candidato a prefeito e a vereador. Talvez, sob este ângulo, a propaganda eleitoral de alguma maneira sirva para a orientação do eleitor.
Em assuntos de política de religião e de escola de samba, o ingrediente de fanatismo, de cegueira ainda impera e dita alguma direção para o eleitor. Entretanto, por ser imbuído de fanatismo, de parcialidade, de gosto individual, de simpatia pessoal, é que entra a figura do indeciso.
Os partidos brasileiros são numerosos, as siglas embaralham o eleitorado. Candidatos de partidos diferentes apresentam por vezes os mesmos programas, os mesmos projetos, as mesmas ideias. Tudo isso confunde a cabeça do eleitor e, por serem mostrados num programa televisivo, já por si só maçante, o eleitor indeciso, fica num mato sem cachorro, perdido que está em concepções diferentes de visão política que, divulgando ideias e correntes ideológicas, mais embarafustam a mente cansada do trabalhador ou de outro indivíduo de profissões variadas. Em síntese, o eleitor mergulha no seu mundo interior tentando buscar alguma coerência a que possa se agarrar para fazer uma opção de um candidato menos desastroso para dirigir sua cidade e sua Câmara Municipal.
Num contexto nacional em que decide no Supremo Tribunal Federal o destino do famigerado “Escândalo do Mensalão,” com a perspectiva de ainda o eleitor votar em candidato “ficha suja,” fica, por conseguinte, difícil fazer-se uma escolha menos traumática de alguns candidatos.
Uma coisa me parece certa, o eleitor bem intencionado fica remoendo mais ou menos nestes termos: este candidato é bom mas não tem experiência político-administrativa. Este outro está fazendo uma boa administração mas, politicamente, é ligado a políticos e governantes sobre os quais pesam suspeitas de corrupção. Direita, esquerda, centro, extrema direita, extrema esquerda, moderados, neoliberais, democratas sociais, anarquistas, são formas ideológicas que, cada vez mais, se esvaziam de seus princípios originais. De teorização ideológica estamos cansados. Queremos governos que se comprometam com a democracia social na prática, não na teoria nebulosa e sem pés fincados no chão do Brasil.
A profissionalização rasteira e nauseabunda tornou-se a regra no conjunto da política nacional. Nossos homens públicos, com raras exceção, só visam ao poder e às benesses que irão receber na condição de mandatos e de cargos legislativos. A oligarquia ainda se mantém forte num país politicamente provinciano como é o nosso.
Se nosso políticos exercessem sua atividade sem as regalias pantagruélicas próprias do Estado brasileiro, é provável que a Câmara Federal, o Senado, os governos estaduais, os deputados, as prefeituras, os vereadores sumissem como fumaça e as eleições se tornassem um enredo tragicômico de um romance de José Saramago (1922-2010). Daí que estão repletos de mediocridades e até de analfabetos e oportunistas os nossos poderes constituídos, que nos envergonham como brasileiros.
O brasileiro, eleitor indeciso, ainda vota em alguém em troca de favores ou porque o candidato é amigo de um amigo de um amigo, de um amigo, numa corrente contínua que me lembra o poema dummondiano “Quadrilha”, fazendo-se, é claro, as devidas modificações semânticas, mas sem retirar o lado irônico da afirmação e estendo-a não para as coisas do “amor,” mas da miséria de nossa politicalha. Que venham as eleições, mas junto delas eleitores de bem e amantes da democracia brasileira. Amém!