O artista sem corpo
Por Bráulio Tavares Em: 03/09/2012, às 20H19
[Bráulio Tavares]
Quem é Marc-Albert Santillo? Citando fatos decorados e repetindo interpretações alheias qualquer pessoa é capaz de conversar meia hora sobre a vida deste artista de vanguarda que durante a última década sobressaltou a vida cultural do Rio de Janeiro. Fala-se que era neto de diplomata estrangeiro, e que, após a mudança da capital para Brasília sua família decidira continuar vivendo no Rio. Marc-Albert queria ser artista, teve acesso aos melhores cursos e a professores particulares. Conquistou menções honrosas, e segundos e terceiros lugares em alguns Salões. Isto o ajudou a conseguir a bolsa que lhe proporcionou doze anos entre Paris (onde preferia morar) e Londres (onde realizou seus trabalhos mais importantes).
Nas entrevistas, sentavam-se para responder, lado a lado, um jovem de barba rala e cabelos longos; outro rapaz, louro, de rosto quadrado e maneiras irrepreensíveis; um mulato envolto em roupas orientais e com expressão pétrea; uma mocinha magra, de óculos, postura agressiva; um rapaz gordo e com um raciocínio mais rápido do que aparentava; outro rapaz de rosto sardento, redondo, que falava com veemência. Havia outros, mas eram estes os que mais vezes apareciam nas ocasiões públicas, encarnando o espírito de Marc-Albert Santillo. “Ele não existe,” diziam; “é apenas um personagem que criamos, um artista cujas idéias inventamos em conjunto, e somos nós que escrevemos suas falas, produzimos suas obras”. Nas entrevistas, dependendo da pergunta, entreolhavam-se por alguns segundos, e então um deles se inclinava para o microfone e produzia uma resposta cabal, definitiva, arrasadora. Santillo era apenas um espírito criado e mediunizado por eles, e o mais impressionante era como sempre pousava em apenas um deles por vez. Algumas interpretações radicais chegavam a afirmar que o Santillo original morrera e havia sido fisicamente canibalizado pelo grupo.