No leito fundo em que descansas, 
em meio às larvas e aos livores, 
longe do mundo e dos terrores 
que te infundia o aço das lanças; 
 
longe dos reis e dos senhores 
que te esqueceram nas andanças, 
longe das taças e das danças, 
e dos feéricos rumores; 
 
longe das cálidas crianças 
que ateavam fogo aos corredores 
e se expandiam, quais vapores, 
entre as alfaias e as faianças 
 
de tua herdade, cujas flores 
eram fatídicas e mansas, 
mas que se abriam, fluidas tranças, 
quando as tangiam teus pastores; 
 
longe do fel, do horror, das dores, 
é que recolho essas lembranças 
e as deito agora, já sem cores, 
no leito fundo em que descansas. 
 

Ivan Junqueiro, in 'A Sagração dos Ossos'