Na ABL, FHC diz que falta "alma democrática" no Brasil
Ex-presidente ocupa cadeira n°36 sob olhares dos colegas de PSDB, como Geraldo Alckmin, Aécio Neves e José Serra. Também estiveram presentes o ministro do STF Marco Aurélio Melo e o cantor Gilberto Gil. Com homenagem a Ruth Cardoso, ele diz que “nossa cultura de favores e privilégios, de retraimento da responsabilidade pessoal e atribuição de culpa aos outros, principalmente ao governo e às coletividades, desobriga o cidadão a fazer sua parte, a sentir-se comprometido"¶ 247 - Na cerimônia de posse na Academia Brasileira de Letras, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso lembrou de sua mulher Ruth, falecida em 2008, e falou de carências da democracia em discurso.
"Desenvolvimento, demoracia, liberdade e igualdade eram e continuam a ser nossa obsessão. A esses objetivos dediquei meus esforços como intelectual e tentei alcançá-los em minha prática política", disse.
"A Ruth me ensinou muita coisa. Por exemplo, esses movimentos que a gente tem visto nas ruas, ou quando eu fui há 10 dias na (favela) da Maré (zona norte do Rio). Não é surpresa para mim, porque foi algo que a Ruth sempre me passou, ela tinha a mente mais aberta que a minha e me ajudou a ser menos acadêmico. Ela sempre foi mais voltada para as coisas concretas, é o que eu tento ser", explicou.
Segundo ele, houve avanços nas últimas décadas, mas afirmou que ainda falta "alma democrática" aos cidadãos: "Nossa cultura de favores e privilégios, de retraimento da responsabilidade pessoal e atribuição de culpa aos outros, principalmente ao governo e às coletividades, desobriga o cidadão a fazer sua parte, a sentir-se comprometido".
FHC fez referência aos protestos de junho. "A ampliação da democracia e da liberdade de informação choca-se com as insuficiências da República. À inadequação das instituições acrescenta-se sua desmoralização, agravada por episódios de corrupção. Esboça-se entre nós, como em outros países, uma crise da democracia representativa."
Vários políticos acompanharam a posse de FHC na ABL, entre eles, os colegas de PSDB Geraldo Alckmin - governador de São Paulo -, Aécio Neves, senador mineiro e presidente da sigla, José Serra, ex-governador de São Paulo, e Tasso Jereissati, ex-senador. Também estiveram presentes o ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Melo, o cantor Gilberto Gil e muitos acadêmicos.
Leia relato de sua posse da Agência Brasil:
Cristina Indio do Brasil
Rio de Janeiro - O ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso toma posse neste momento como membro da Academia Brasileira Letras (ABL), no centro da capital fluminense. A cerimônia ocorre no Salão Nobre do Petit Trianon. Ele vai ocupar a cadeira 36 que ficou vaga com a morte do jornalista João Scantimburgo, em 22 de março deste ano.
Fernando Henrique é o terceiro ex-governante do Brasil eleito para ABL. Em 1941, Getúlio Vargas assumiu a cadeira 37 e, em 1980, José Sarney tomou posse da cadeira 38. Na eleição foram 24 votos de acadêmicos presentes à sede da academia, no centro do Rio, e 14 por carta. Houve ainda uma abstenção. Fernando Henrique recebeu 34 dos 39 votos possíveis e concorreu com dez escritores.
O ex-ministro Celso Lafer, que ocupa a cadeira 14, e vai fazer a saudação ao novo imoral da academia. Ele disse à Agência Brasil que falará de sua amizade com Fernando Henrique. “Tenho uma amizade com ele de mais de 40 anos. Vou falar do que significa a amizade e o que representa a obra dele", declarou.
Fernando Henrique foi presidente da República por dois mandatos sucessivos, de 1995 a 2002. Ele nasceu no Rio de Janeiro em 18 de junho de 1931, é doutor em sociologia e professor emérito da Universidade de São Paulo (USP). Fora do país foi também professor em universidades como Stanford, Berkeley e Brown, nos Estados Unidos; Cambridge, no Reino Unido; Paris-Nanterre e Collège de France, na França, e Ipes/Cepal, em Santiago do Chile.
Com sua atuação política teve os direitos políticos cassados em 1964 pelo regime militar e exilou-se na Europa e no Chile. Quando voltou ao Brasil ingressou no então MDB e foi eleito senador por São Paulo. Em 1988, participou da fundação do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), do qual é presidente de honra. Antes de ocupar a presidência da República, Fernando Henrique foi ministro das Relações Exteriores e da Fazenda no governo Itamar Franco (1992-1994).
O novo membro da ABL é autor ou coautor de livros de sociologia e de análise de sua atuação como político, além de artigos acadêmicos. Uma de suas obras, Dependência e Desenvolvimento, escrita em coautoria com Enzo Falletto, publicada originalmente em espanhol, em 1969, é considerada marco nos estudos sobre a teoria do desenvolvimento. O livro teve dezenas de edições, em 16 idiomas.
O último livro, lançado em junho deste ano, Pensadores que Inventaram o Brasil, revê textos de autores como Florestan Fernandes, Celso Furtado, Gilberto Freyre. Os temas tratam de democracia, de desenvolvimento econômico e de promoção da justiça social, entre outros.
Edição: Aécio Amado
Em cerimônia concorrida, FHC toma posse na Academia Brasileira de Letras
Entre os convidados presentes estavam o ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello, o cantor Gilberto Gil e os principais nomes do PSDB, partido do ex-presidente, como o governador Geraldo Alckmin, o senador Aécio Neves e o ex-governador José Serra.
O evento aconteceu no salão nobre do Petit Trianon, o prédio histórico que serve de sede para a Academia, no centro do Rio. Vestindo o tradicional fardão de acadêmico, o ex-presidente iniciou seu discurso falando sobre a "importância dos rituais", como aquele de que tomava parte, e comparou a sucessão na ABL à passagem da tocha olímpica de mão em mão.
"Ao passar os diplomas de uns a outros, seus membros mostram a continuidade do respeito à cultura e às realizações que constroem a história do país. Como não sentir emoção neste ato?", disse o ex-presidente.
"Agradeço, comovido, a honra de me sentar em tão ilustre companhia. Não fosse eu algo treinado em antropologia e não houvesse sido casado por tantas décadas com destacada antropóloga, poderia talvez desconsiderar a importância dos ritos que conformam a existência humana, que são elemento insubstitutível na tessitura da memória, a que nos agarramos na medida em que o tempo nos consome."
Seguindo a praxe, Fernando Henrique também usou seu discurso para homenagear cada um dos ocupantes anteriores da cadeira 36, que tem como patrono o poeta maranhense Teófilo Dias (1854-1889) e foi ocupada por imortais como o poeta e jornalista mineiro Afonso Celso (1860-1938) e o diplomata, filósofo e sociólogo José Guilherme Merquior (1941-1991).
Na segunda metade de sua fala, que durou cerca de uma hora, FHC repassou sua trajetória e suas ideias políticas. "Desenvolvimento, democracia, liberdade e igualdade eram e continuam a ser nossa obsessão. A esses objetivos dediquei meus esforços como intelectual e tentei alcançá-los em minha prática política."
Fez ainda referências elogiosas a outros governantes. "O crescimento da nossa economia, embora nem sempre satisfatório, as pressões dos cidadãos que ansejavam por democracia e o aperfeiçoamento das políticas públicas vêm permitindo uma considerável redução da pobreza e a melhoria das condições de vida. Seria injusto imaginar que tal esforço começou há dez ou há 20 anos, ele vem de mais longe."
Fernando Henrique elogiou os avanços democráticos das últimas décadas, mas também fez ressalvas. "Se a arquitetura institucional está quase acabada, falta o essencial, falta a alma democrática. Nossa cultura de favores e privilégios, de retraimento da responsabilidade pessoal e atribuição de culpa aos outros, principalmente ao governo e às coletividades, desobriga o cidadão a fazer sua parte, a sentir-se comprometido", disse, sendo interrompido por aplausos da plateia.
Ao fim do discurso, FHC assinou o livro de posse e recebeu os tradicionais adereços que compõem o figurino da ABL: o colar com uma medalha, entregue por Nélida Piñon, o diploma de integrante da casa, entregue pelo historiador José Murilo de Carvalho, e a espada, entregue por Eduardo Portela -- que substituiu na função o decano da ABL, José Sarney, que não pôde participar por motivos de saúde.
Terceiro presidente a integrar a Casa de Machado --após Getúlio Vargas (eleito em 1941) e José Sarney (eleito em 1980)-- o novo imortal se junta a dois membros graduados de seu governo, o vice-presidente Marco Maciel, 72 (eleito em 2004), e o ex-Ministro das Relações Exteriores Celso Lafer, 71, eleito em 2006 e responsável por receber o novo integrante da casa.
A próxima eleição na ABL deve acontecer em novembro, para a sucessão do teólogo e escritor Luiz Paulo Horta, morto no mês passado.
"Desenvolvimento, demoracia, liberdade e igualdade eram e continuam a ser nossa obsessão. A esses objetivos dediquei meus esforços como intelectual e tentei alcançá-los em minha prática política", disse.
"A Ruth me ensinou muita coisa. Por exemplo, esses movimentos que a gente tem visto nas ruas, ou quando eu fui há 10 dias na (favela) da Maré (zona norte do Rio). Não é surpresa para mim, porque foi algo que a Ruth sempre me passou, ela tinha a mente mais aberta que a minha e me ajudou a ser menos acadêmico. Ela sempre foi mais voltada para as coisas concretas, é o que eu tento ser", explicou.
Segundo ele, houve avanços nas últimas décadas, mas afirmou que ainda falta "alma democrática" aos cidadãos: "Nossa cultura de favores e privilégios, de retraimento da responsabilidade pessoal e atribuição de culpa aos outros, principalmente ao governo e às coletividades, desobriga o cidadão a fazer sua parte, a sentir-se comprometido".
FHC fez referência aos protestos de junho. "A ampliação da democracia e da liberdade de informação choca-se com as insuficiências da República. À inadequação das instituições acrescenta-se sua desmoralização, agravada por episódios de corrupção. Esboça-se entre nós, como em outros países, uma crise da democracia representativa."
Vários políticos acompanharam a posse de FHC na ABL, entre eles, os colegas de PSDB Geraldo Alckmin - governador de São Paulo -, Aécio Neves, senador mineiro e presidente da sigla, José Serra, ex-governador de São Paulo, e Tasso Jereissati, ex-senador. Também estiveram presentes o ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Melo, o cantor Gilberto Gil e muitos acadêmicos.
Leia relato de sua posse da Agência Brasil:
Cristina Indio do Brasil
Rio de Janeiro - O ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso toma posse neste momento como membro da Academia Brasileira Letras (ABL), no centro da capital fluminense. A cerimônia ocorre no Salão Nobre do Petit Trianon. Ele vai ocupar a cadeira 36 que ficou vaga com a morte do jornalista João Scantimburgo, em 22 de março deste ano.
Fernando Henrique é o terceiro ex-governante do Brasil eleito para ABL. Em 1941, Getúlio Vargas assumiu a cadeira 37 e, em 1980, José Sarney tomou posse da cadeira 38. Na eleição foram 24 votos de acadêmicos presentes à sede da academia, no centro do Rio, e 14 por carta. Houve ainda uma abstenção. Fernando Henrique recebeu 34 dos 39 votos possíveis e concorreu com dez escritores.
O ex-ministro Celso Lafer, que ocupa a cadeira 14, e vai fazer a saudação ao novo imoral da academia. Ele disse à Agência Brasil que falará de sua amizade com Fernando Henrique. “Tenho uma amizade com ele de mais de 40 anos. Vou falar do que significa a amizade e o que representa a obra dele", declarou.
Fernando Henrique foi presidente da República por dois mandatos sucessivos, de 1995 a 2002. Ele nasceu no Rio de Janeiro em 18 de junho de 1931, é doutor em sociologia e professor emérito da Universidade de São Paulo (USP). Fora do país foi também professor em universidades como Stanford, Berkeley e Brown, nos Estados Unidos; Cambridge, no Reino Unido; Paris-Nanterre e Collège de France, na França, e Ipes/Cepal, em Santiago do Chile.
Com sua atuação política teve os direitos políticos cassados em 1964 pelo regime militar e exilou-se na Europa e no Chile. Quando voltou ao Brasil ingressou no então MDB e foi eleito senador por São Paulo. Em 1988, participou da fundação do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), do qual é presidente de honra. Antes de ocupar a presidência da República, Fernando Henrique foi ministro das Relações Exteriores e da Fazenda no governo Itamar Franco (1992-1994).
O novo membro da ABL é autor ou coautor de livros de sociologia e de análise de sua atuação como político, além de artigos acadêmicos. Uma de suas obras, Dependência e Desenvolvimento, escrita em coautoria com Enzo Falletto, publicada originalmente em espanhol, em 1969, é considerada marco nos estudos sobre a teoria do desenvolvimento. O livro teve dezenas de edições, em 16 idiomas.
O último livro, lançado em junho deste ano, Pensadores que Inventaram o Brasil, revê textos de autores como Florestan Fernandes, Celso Furtado, Gilberto Freyre. Os temas tratam de democracia, de desenvolvimento econômico e de promoção da justiça social, entre outros.
Edição: Aécio Amado
Em cerimônia concorrida, FHC toma posse na Academia Brasileira de Letras
DO RIO
Na cerimônia de posse mais concorrida dos últimos anos na Academia Brasileira de Letras, o sociólogo e ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, 82, assumiu na noite desta terça (13) a cadeira nº 36, sucedendo ao jornalista João de Scantimburgo (1915-2013), morto em março deste ano. Entre os convidados presentes estavam o ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello, o cantor Gilberto Gil e os principais nomes do PSDB, partido do ex-presidente, como o governador Geraldo Alckmin, o senador Aécio Neves e o ex-governador José Serra.
O evento aconteceu no salão nobre do Petit Trianon, o prédio histórico que serve de sede para a Academia, no centro do Rio. Vestindo o tradicional fardão de acadêmico, o ex-presidente iniciou seu discurso falando sobre a "importância dos rituais", como aquele de que tomava parte, e comparou a sucessão na ABL à passagem da tocha olímpica de mão em mão.
FHC na Academia Brasileira de Letras
Daniel Marenco/Folhapres
O sociólogo e ex-presidente Fernando Henrique Cardoso aguarda para tomar posse de cadeira na Academia Brasileira de Letras, em cerimônia no Salão Nobre do Petit Trianon, no Rio
"Ao passar os diplomas de uns a outros, seus membros mostram a continuidade do respeito à cultura e às realizações que constroem a história do país. Como não sentir emoção neste ato?", disse o ex-presidente.
"Agradeço, comovido, a honra de me sentar em tão ilustre companhia. Não fosse eu algo treinado em antropologia e não houvesse sido casado por tantas décadas com destacada antropóloga, poderia talvez desconsiderar a importância dos ritos que conformam a existência humana, que são elemento insubstitutível na tessitura da memória, a que nos agarramos na medida em que o tempo nos consome."
Seguindo a praxe, Fernando Henrique também usou seu discurso para homenagear cada um dos ocupantes anteriores da cadeira 36, que tem como patrono o poeta maranhense Teófilo Dias (1854-1889) e foi ocupada por imortais como o poeta e jornalista mineiro Afonso Celso (1860-1938) e o diplomata, filósofo e sociólogo José Guilherme Merquior (1941-1991).
Na segunda metade de sua fala, que durou cerca de uma hora, FHC repassou sua trajetória e suas ideias políticas. "Desenvolvimento, democracia, liberdade e igualdade eram e continuam a ser nossa obsessão. A esses objetivos dediquei meus esforços como intelectual e tentei alcançá-los em minha prática política."
Fez ainda referências elogiosas a outros governantes. "O crescimento da nossa economia, embora nem sempre satisfatório, as pressões dos cidadãos que ansejavam por democracia e o aperfeiçoamento das políticas públicas vêm permitindo uma considerável redução da pobreza e a melhoria das condições de vida. Seria injusto imaginar que tal esforço começou há dez ou há 20 anos, ele vem de mais longe."
Fernando Henrique elogiou os avanços democráticos das últimas décadas, mas também fez ressalvas. "Se a arquitetura institucional está quase acabada, falta o essencial, falta a alma democrática. Nossa cultura de favores e privilégios, de retraimento da responsabilidade pessoal e atribuição de culpa aos outros, principalmente ao governo e às coletividades, desobriga o cidadão a fazer sua parte, a sentir-se comprometido", disse, sendo interrompido por aplausos da plateia.
Ao fim do discurso, FHC assinou o livro de posse e recebeu os tradicionais adereços que compõem o figurino da ABL: o colar com uma medalha, entregue por Nélida Piñon, o diploma de integrante da casa, entregue pelo historiador José Murilo de Carvalho, e a espada, entregue por Eduardo Portela -- que substituiu na função o decano da ABL, José Sarney, que não pôde participar por motivos de saúde.
Terceiro presidente a integrar a Casa de Machado --após Getúlio Vargas (eleito em 1941) e José Sarney (eleito em 1980)-- o novo imortal se junta a dois membros graduados de seu governo, o vice-presidente Marco Maciel, 72 (eleito em 2004), e o ex-Ministro das Relações Exteriores Celso Lafer, 71, eleito em 2006 e responsável por receber o novo integrante da casa.
A próxima eleição na ABL deve acontecer em novembro, para a sucessão do teólogo e escritor Luiz Paulo Horta, morto no mês passado.