Marcos Antônio de Macedo
Por Reginaldo Miranda Em: 09/06/2018, às 14H22
Reginaldo Miranda*
A nascente[1] freguesia de N. Sra. das Mercês, hoje cidade de Jaicós, naquele tempo pertencente ao termo de Oeiras, é o berço de Marcos Antônio de Macedo[2], notável magistrado, político e escritor brasileiro. Ele nasceu em 18 de junho de 1808, filho de Antônio de Macedo Pimentel e de sua esposa, Maria Joaquina de Santana, ambos oriundos da vizinha vila do Crato, no Ceará, onde descendiam de ilustradas estirpes[3].
Em 1820[4], com 12 anos de idade, muda-se para a fazenda Boa Esperança, cursando o ensino primário com o padre Marcos de Araújo Costa, afamado pároco e educador nordestino, que o educou com desvelo. Aluno invulgar, desde cedo conquistou a estima e admiração do ilustrado mestre, que devotou-lhe amor filial[5] e muito bem o encaminhou na vida profissional. Foi o mais destacado aluno de Boa Esperança e aquele que mais longe chegou no campo da cultura.
Mais tarde, segue para Pernambuco, e depois de frequentar o curso jurídico, recebeu o grau de bacharel em Direito pela Faculdade de Olinda, no ano de 1836.
Depois de formado, fixa residência no Ceará, onde inicia carreira no ministério público[6] e na magistratura, como juiz municipal e de órfãos. Todavia, culto, inteligente, comunicativo, com noções de outros idiomas hauridas nas aulas de Boa Esperança e no Recife, ainda em 1836, ao tempo da primeira administração de José Martiniano de Alencar na presidência da província foi designado para arregimentar colonos artífices na Europa. Foi e se houve muito bem em sua missão. No entanto, sempre ávido de conhecimento, permaneceu por algum tempo em Paris, dedicando-se aos estudos de ciências naturais, sobretudo Química. De regresso ao Ceará em janeiro de 1838, trouxe consigo 16 artífices franceses que foram entregues ao governo provincial.
Retomou a carreira na magistratura, onde caracterizou-se por seu caráter sério e sisudo, honradez, inteireza e probidade[7], logo assumindo o cargo de juiz municipal e de órfãos da vila de São João do Príncipe, hoje Tauá, nos Inhamuns, depois passando para a do Crato. Em 14 de novembro de 1846, tomou posse interinamente no cargo de juiz de direito da referida comarca de Crato. No entanto, depois de cumprir o quatriênio necessário, por decreto de 18 de junho de 1847, foi nomeado para o cargo de juiz de direito da comarca de Icó[8]. Retornou para a do Crato por ato de 24 de agosto de 1848[9], em cujo cargo se demorou por largos anos. No mês de agosto de 1853, ainda se encontrava na titularidade dessa comarca, quando correspondeu-se com o diretor do Museu Nacional, Frederico Burlamaqui, sobre a descoberta de peixes fósseis naquele distrito, enviando-lhe preciosa contribuição. Neste mesmo ano integrou comissão responsável pela abertura de estrada da vila do Crato para a cidade de Icó.
Por portaria de 15 de fevereiro de 1855, foi removido para a comarca de Icó, também no Ceará, passando, assim, a atuar neste termo pela segunda vez (O Cearense, 6.12.1846, 6.3.1873; Pedro II, 7.2.1855; 24.10.1855).
No entanto, por decreto de 19 de setembro de 1857, foi removido e assumiu o cargo de juiz de direito da comarca de Vassouras, no Rio de Janeiro, onde passou a atuar por quase quatro anos. Nesta, foi aposentado, a pedido, por decreto de 24 de maio de 1861 (A Pátria, 26.9.1857; O Cearense, 25.6.1861; Diário do Rio de Janeiro, 7.6.1861).
Exercendo forte influência na região do Cariri, elegeu-se deputado provincial em duas legislaturas. Em 1846 foi eleito por seus pares para 2.º secretário da mesa diretora da Assembleia Legislativa Provincial.
No período de 7 de setembro de 1847 a 14 de março de 1848, presidiu a província do Piauí[10], onde realizou importante gestão administrativa. Nesse tempo, promulgou a Resolução n.º 220, de 20 de setembro de 1847, que criou na capital uma escola para formação de alunos artífices, voltada para a educação de crianças pobres. Ao fim dessa gestão retorna ao Ceará, realizando estudos técnicos de cujo resultado apresenta projeto de transposição das águas do rio São Francisco para o Jaguaribe através da abertura de um canal.
Em 1848, seria eleito deputado geral pelo Piauí, juntamente com o dr. Antônio Borges Leal Castelo Branco[11].
Depois de aposentado na magistratura e afastado da vida pública, dedica-se aos seus estudos e investigações científicas, mudando para o velho continente e fixando residência em Stuttgart, então capital de Württemberg, na Alemanha. De lá, em 1867 envia alguns exemplares de suas obras ao Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. E faz excursões científicas, sobretudo de caráter etnológico, por diversos países da Europa, descendo o Danúbio até o mar Negro; integrando uma caravana da França, formadas por 25 membros, inclusive dois brasileiros[12], penetra no Oriente Médio, inclusive Síria e Turquia, e passando à África, sobe o Nilo desde o Egito até a Núbia,
Como resultado desses estudos e investigações científicas, publicou as seguintes obras: Mapa topográfico da comarca do Crato, província do Ceará, indicando a possibilidade de um canal tirado do rio São Francisco, no lugar Boa Vista, para comunicar com o rio Jaguaribe, pelo riacho dos Porcos e rio Salgado(1848); Descrição dos terrenos carboníferos da comarca do Crato (Trabalho da Sociedade Velosiana, 1855. P. 23-27); A canalização do rio S. Francisco ao Ceará (Revista da Academia Cearense, 1897); Pelerinage aux Lieux-saints, suivi d’une excursion dans Le Basse Egypte, em Syrie et á Constantinople (1867), narrando aspectos pitorescos de uma viagem; Notice sur le palmier carnahube (1867), precioso trabalho publicado na França, em que detalha os processos e combinações químicas para purificar, embranquecer e abrandar a cera da carnaubeira; O enigma comercial do café de Moka patenteado na exposição de Paris de 1867 (1868); Observações sobre as secas do Ceará e meios de aumentar o volume das águas nas correntes do Cariri (1871). E dado o reconhecimento e notoriedade que adquiriu em face de seus estudos, foi convidado a colaborar, e assim o fez, na Grand dictionari universel du XIX secle, de Lorousse.
Faleceu esse notável piauiense em 15 de dezembro de 1872, em Stuttgart, na Alemanha, vítima de apoplexia, com 64 anos de idade, quando estava no auge de seus estudos científicos e muito ainda poderia contribuir com a sociedade. Coligimos essas notas para a reconstituição de sua biografia num preito de justa gratidão a quem dedicou a mais substanciosa parte de sua vida a serviço do bem-estar da humanidade, assim enchendo de orgulho à terra piauiense.
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* REGINALDO MIRANDA, autor de diversos livros e artigos, é membro efetivo da Academia Piauiense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico Piauiense e do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-PI. Contato: [email protected](Meio Norte, 08.05.2015).
[1] O Bispo do Maranhão, D. Luiz de Brito Homem autorizou a criação da freguesia no ano de 1801, no entanto, o ato somente foi promulgado em 12.7.1805 e a freguesia solenemente instalada em 25.9.1806.
[2] Era irmão do tenente-coronel João de Macedo Pimentel, militar que lutou na Guerra do Paraguai, abolicionista, comendador da Ordem da Rosa de Cristo e do Cruzeiro, ajudante de ordens do conde d’Eu, oficial de registro de hipotecas da cidade de São Paulo, natural da cidade do Crato, falecido na cidade de São Paulo, em 14 de dezembro de 1887. Era também irmão de Antônio de Macedo Pimentel, o moço, que fora casado com d. Maria Araripe de Macedo, irmã de Tristão de Alencar Araripe, ambos filhos de Ana Porcina Ferreira de Lima e de seu esposo, o tenente-coronel Tristão Gonçalves Pereira de Alencar, um dos chefes da malograda Confederação do Equador, na província do Ceará, este filho do português José Gonçalves dos Santos e de sua esposa, Bárbara Pereira de Alencar, velha matriarca cearense cujo nome figura entre as heroínas da pátria; filhos: Joaquim de Macedo Pimentel e Tristão de Araripe Macedo (Gazeta Nacional – órgão republicano, 16.12.1887; O Cearense, 11.1.1888; Gazeta do Norte, 2.1.1888; Constituição, 4.1.1888).
[3] Existe uma informação que não se confirma pelas notas de jornais contemporâneos, de que sua mãe fora uma indígena acoroá, embora esta pudesse ter ascendência indígena cruzada com ascendentes lusitanos.
[4] Segundo os registros históricos foi neste ano que o padre iniciou a sua escola em Boa Esperança.
[5] O Pe. Marcos de Araújo Costa, não o adotou formalmente, como registram alguns cronistas. Encontramos diversas notas na imprensa local e cearense, noticiando sua nomeação e posse na presidência da província do Piauí, quando então exercia o cargo de juiz de direito da comarca de Icó, no Ceará. Diversas delas mencionam o seu nascimento no Piauí e a origem familiar no Crato, mas nenhuma faz menção à adoção pelo Padre Marcos, o que seria relevante para aquele momento, caso este fato fosse verídico.
[6] Foi promotor público do Crato.
[7] O Cearense, 22.4.1847; 12.7.1847.
[8] Diário do Rio de Janeiro, 1.7.1847.
[9] O Cearense, 20.11.1848.
[10] Nomeado por carta imperial de 23.6.1847 (O Cearense, 12.7.1847).
[11] Foram derrotados neste pleito Zacarias de Goes Vasconcelos e Francisco de Sousa Martins (O Cearense, 17.1.1848.
[12] O outro foi o padre Manoel de Medeiros, do Ceará (Pedro II, 22.5.1863).
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* REGINALDO MIRANDA, autor de diversos livros e artigos, é membro efetivo da Academia Piauiense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico Piauiense e do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-PI. Contato: [email protected](Meio Norte, 08.05.2015)