Louro da Banca, patrimônio cultural parnaibano
Por Elmar Carvalho Em: 06/06/2018, às 05H10
LOURO DA BANCA, PATRIMÔNIO CULTURAL PARNAIBANO (*)
Elmar Carvalho
Nesta temporada parnaibana, fui algumas vezes à banca do Louro, para comprar jornal e ver os livros de autores parnaibanos, que ali são expostos e vendidos. Esse ritual é bom porque em torno da banca sempre encontro algum conhecido dos velhos tempos. Numa dessas idas encontrei o Emanuel, meu colega do Campus Ministro Reis Velloso – UFPI, curso de Administração de Empresas, que me cumprimentou efusivamente e com bastante jovialidade.
No final dos anos setenta, fui com ele a Tutoia, seguindo pelo Delta do Parnaíba, num desses barcos toc-toc ou chalana, que faziam linha para essa cidade maranhense. Ficamos hospedado numa casa de sua família, que ficava à beira-mar, em amplo terreno, com várias plantas e coqueiros. Ficava numa enseada da praia Andreza. Corria a lenda de que uma moça, que desaparecera ou fora arrebatada na praia de Amarração, na cidade de Luís Correia, várias décadas atrás, ali aparecia como um ente encantado.
Ouvindo o vento a farfalhar nos coqueiros e nas outras árvores e escutando o marulho das ondas, colhi inspiração para alguns de meus poemas marítimos ou parnaibanos. Nesse passeio a Tutoia, terminei encontrando o jornalista e professor Antônio Gallas Pimentel, tutoiense, mas meu amigo de Parnaíba, em cuja companhia terminei fazendo um périplo pelos points da cidade, no anglicismo de hoje, que consigno em sua homenagem, já que ele é um mestre em Inglês e fala fluentemente essa língua.
Já o Louro é uma instituição da Praça da Graça, e deveria ser tombado como um patrimônio vivo do município. Conheço-o desde o final da década de setenta e nunca ouvi o menor comentário que pudesse desabonar a sua pessoa. Muito pelo contrário, a sua conduta foi sempre correta, tanto que entra prefeito e sai prefeito e o Louro continua inabalável em sua banca de revistas.
Faça chuva ou faça sol, seja sábado, domingo ou feriado, lá está ele a mourejar em seu estabelecimento, com a sua cordialidade e alegria de sempre, a vender os jornais e livros da terra, e os jornais e revistas de circulação nacional, assim como os editados em Teresina. Embora correndo o risco de ser perseguido por algum alcaide fustigado pelas catilinárias do Inovação, sempre vendeu esse jornal, durante todo o tempo em que ele circulou. Por isso mesmo tinha a consideração e o respeito de todos que faziam parte desse bravo periódico.
Para mim o Louro foi sempre o Louro da banca de revistas da Praça da Graça. Por essa razão, não obstante a estima que lhe tenho, sequer sabia o seu nome. Telefonei-lhe, para lhe colher o nome completo, que agora declino, como uma homenagem a um cidadão honrado: Francisco das Chagas Sampaio. Ele, um homem de bem, cordato, vestia uma camisa preta, com a palavra PAZ, em letras brancas, estampada no peito. Ou seja, o Louro, literalmente, veste a camisa da PAZ.
(*) Há poucos dias o professor e escritor Antônio Gallas me deu uma boa notícia: os (poucos) exemplares de Histórias de Évora que estavam à venda na Banca do Louro haviam sido comercializados. Assim, em minha próxima ida a Parnaíba, providenciarei mais alguns exemplares para as suas prateleiras.
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O FILHO DE SANDOVAL
Quando estive na lanchonete do senhor José dos Santos para tomar o seu afamado caldo, vi do lado de fora um homem todo sujo de goma, principalmente no cabelo e no rosto. Logo vi que não se tratava de um folião extemporâneo, mas de um alcoólatra. Quis saber como se chamava, mas ninguém o conhecia pelo nome. O Canindé informou-me que ele era filho do Sandoval, que eu conheci como guardador de carros dos universitários, no Campus Ministro Reis Velloso.
O Sandoval era um homem bom e tinha a estima dos acadêmicos e dos professores. Já é falecido. O poeta Alcenor Candeira Filho, que exerce o magistério no Campus, dedicou-lhe um poema, em que lhe relata as virtudes e a ocupação. Dizíamos, brincando, que o Sandoval fora o seu “muso”. Agora, com tristeza, vejo o seu filho como mendigo e alcoólatra. Quando lhe perguntei o nome, disse tê-lo esquecido, e disse o nome de seu pai.
Era como se quisesse esquecer de si próprio, em sua solidão e tristeza. Segundo o Canindé ele trabalhara num Condomínio da rua Pedro II, mas a dipsomania terminava por lhe fazer faltar ao trabalho, razão pela qual foi demitido. Com a demissão, apegou-se mais ainda ao vício. Quando fui tirar sua fotografia, para ilustrar o blog em que este diário é publicado, inicialmente, fingiu esconder o rosto, numa brincadeira ou na vontade inconsciente de se manter incógnito, sem ser visto e sem ser lembrado, numa espécie de exílio de si mesmo.
Depois, se deitou na calçada, e levantou os braços e as pernas, como se fosse uma criança em seu berço, talvez no desejo recôndito de voltar a ser bebê, quando certamente recebeu cuidados e foi amado por seus pais. Ao final, terminou dizendo chamar-se João. Um João só, um João a mais na multidão e na solidão. Aproveito para pedir perdão por tantas e involuntárias rimas em ão.
16 de fevereiro de 2010