LER OU ESCREVER

Há escritores que leram muito. Guimarães Rosa, por exemplo. Há outros que pouco leram, com Barthes. Este, disse uma biógrafa, leu pouco, pois escreveu sobre tudo o que leu. Rosa era um erudito, dominava vários idiomas. Como Borges. Há quem passe horas lendo. Como Foucault. De quem se disse que era o primeiro que chegava e o último que saía da Biblioteca Nacional. E tinha memória fotográfica. Ele certa vez ouviu uma conferência de Ricoeur às gargalhadas. Estava no fundo da sala, com seus admiradores. Debochava, irônico (era terrível). No outro dia, mostrou que tinha gravado na memória tudo o que foi dito e sobre isto deu uma aula, desmontando, ponto por ponto, o assunto. Ele era assim, segundo seu biógrafo. Péssimo caráter. Detestado por todos (no meio acadêmico todos se detestam entre si). Mas “era o homem mais inteligente que já apareceu”, disse um crítico. Estava à esquerda da esquerda. Portanto há quem leia muito e quem leia pouco, mas bem. Uma hora por dia. Como o sábio erudito Gaston Paris, que era enciclopédia viva. Quando perguntaram qual o segredo de sua imensa cultura, ele respondeu: “Leio uma hora por dia”. Há, por fim, escritores que leram muito e escreveram pouco. E outros, ao contrário, que preferiam escrever a ler.
Há uma fórmula americana de como ler, que diz: “SurveyQ3r”. A primeira leitura é “survey”, de pesquisa, uma olhadela geral rápida. Folhear o livro. O “Q” é de “question”, dúvidas, derivadas dessa pesquisa rápida. Aí vem 3 “r”. O primeiro é de ler (read), o segundo é de reler, o terceiro de resumir. Mas cada um tem seu jeito.