Ler Maiakóvski
Em: 07/07/2010, às 20H18
Bráulio Tavares
O mundo comemora os 80 anos da morte de Vladimir Maiakóvski, um dos maiores poetas que já existiram, ao menos pelo meu gosto. Conheci sua obra numa edição dos anos 1960, com traduções de Augusto & Haroldo de Campos e Boris Schnaidermann. A edição atual deste volume, Poemas, é da Ed. Perspectiva (São Paulo, 2002, Coleção Signos). Traz um bom número de poemas traduzidos, vários pequenos ensaios biográficos e críticos, e o texto completo de Eu Mesmo, um saboroso conjunto de fragmentos autobiográficos do poeta. É sua melhor coletânea de poemas traduzidos.
Depois, veio um volume que hoje é relativamente raro: Maiakóvski – Vida e Obra de Fernando Peixoto (José Álvaro Editor, 1969). Faz parte de uma inestimável coleção de capas amarelas, lançada nessa época, que também teve volumes sobre Sartre, Kafka, Brecht, Henry Miller... O livro de Fernando Peixoto, que é um homem de teatro, tem a vantagem de dar muito espaço ao trabalho de Maiakóvski no teatro e no cinema, onde ele foi muitíssimo atuante. E de dar traduções alternativas para inúmeras estrofes. Maiakóvski era um poeta complexo, fazia intrincados jogos de rimas, assonância, métrica, etc. Cada tradutor é forçado a puxar para um lado ou para outro, ao adaptar seus versos. Se o leitor não sabe russo (como eu), quanto mais traduções diferentes ler, mais tem uma idéia do que é o poema original, pois cada tradução o vê de um ângulo diferente.
O terceiro volume essencial para entender o poeta é A Poética de Maiakóvski de Boris Schnaidermann (também da Ed. Perspectiva, São Paulo). Schnaidermann faz uma detalhada e anotadíssima análise da obra do poeta, dando-lhe um contexto amplo e minucioso. E transcreve numerosos artigos do próprio Maiakóvski, entre eles a mesma versão de Eu Mesmo já referida acima, e uma versão completa do Como fazer versos?, o livrinho em que Maiakóvski explica seu modo de ver a poesia, suas técnicas, seus truques, seu processo de criação. É uma das melhores coisas já escritas sobre poesia por um poeta.
Se alguém pretende ser um poeta, a sério, irá ganhar muito não apenas lendo estes três livros, mas relendo-os a vida inteira, como tenho feito. Não que isto possa tornar a gente um grande poeta (no meu caso, por exemplo, não tornou – considero-me um poeta mediano, no contexto do meu Estado e da minha geração). Mas nos dá algo que pra mim é muito mais importante do que ser um Grande Poeta: ser capaz de entender um Grande Poeta. Em outros termos: ser um grande leitor de poesia. Porque nem todo mundo nasceu para escrever, não é verdade? Uns nascem para ser médicos, outros músicos, engenheiros, futebolistas, administradores, dentistas, o escambau. Nem todo mundo precisa ser Poeta. Mas todo mundo pode ser um Grande Leitor de Poesia. No momento de ler um poema de Maiakóvski, cada um de nós vive alguns minutos de ser Maiakóvski. E isto não tem preço.