Estratégias para motivar os alunos

ENTREVISTADO:

SAUL NEVES DE JESUS

 Estratégias para motivar os alunos

 

 

SAUL NEVES DE JESUS*

 

RESUMO – Neste artigo sintetizamos as principais implicações práticas decorrentes de algumas

investigações anteriores que desenvolvemos sobre estratégias que os professores podem utilizar no sentido

de uma maior motivação dos alunos para a aprendizagem e para apresentarem comportamentos mais

adequados na sala de aula.

Descritores – Motivação; aprendizagem; disciplina; alunos

 

ABSTRACT – In this paper are pointed out the main practical implications from some previous researches

about student motivation to learn and to more appropriate behaviours in the classroom.

Key words – Motivation; learning; discipline; students.

��

* Professor Catedrático de Psicologia da Universidade do Algarve; Doutor em Psicologia da Educação; Director do Mestrado em Psicologia da Educação

e do Mestrado em Psicologia da Saúde. E-mail: .

Artigo recebido em: agosto/2007. Aprovado em: setembro/2007.

Este artigo foi escrito com um objectivo prático de

explicitar estratégias concretas que possam ser utilizadas

na prática pedagógica, ajudando os professores a encontrar

soluções para as situações de falta de motivação

dos seus alunos, as quais são cada vez mais frequentes e

com implicações por vezes graves, sobretudo ao nível

dos comportamentos de indisciplina na sala de aula.

No entanto, convém salientar que as estratégias

práticas aqui propostas não surgiram por acaso, sendo o

resultado de trabalhos de reflexão teórica e de investigação

empírica anteriores, os quais nos permitiram

formular um Modelo Integrativo da Motivação Humana

(JESUS, 1996a; JESUS e LENS, 2005), com base em

diversas teorias cognitivistas da motivação, nomeadamente

a Teoria Relacional de Nuttin (1980), a Teoria

da Atribuição Causal de Weiner (1985), a Teoria da

Auto-Eficácia de Bandura (1977), a Teoria do Locus de

Controlo de Rotter (1966) e a Teoria da Motivação

Intrínseca de Deci (1975).

Neste artigo, distinguimos uma parte que diz respeito

à apresentação de estratégias para motivar os alunos para

as aprendizagens escolares, de outra que se centra sobre

a problemática da indisciplina dos alunos na sala de aula,

uma das principais consequências da desmotivação dos

alunos, apresentando algumas estratégias que podem

ajudar o professor a resolver estas situações. Termina

com a apresentação de alguns aspectos de três filmes que

ilustram várias das estratégias que explicitamos.

Retomamos desta forma a dimensão mais prática de

trabalhos anteriores em que procurámos estudar este

tema da motivação dos alunos, em particular nos livros

“Influência do Professor sobre os Alunos” (JESUS,

1996), “Bem-Estar dos Professores” (JESUS, 1998),

“Motivação e formação de professores” (JESUS, 2000)

e “Psicologia da Educação” (JESUS, 2004).

1 ESTRATÉGIAS PARA MOTIVAR OS ALUNOS PARA

AS APRENDIZAGENS ESCOLARES

O professor na sala de aula é um líder, pois procura

influenciar os seus alunos para que estes se interessem

pelas aulas, estejam atentos, participem, apresentem

comportamentos adequados e obtenham bons resultados

escolares.

Neste contexto, importa analisar que factores podem

permitir aos professores influenciar os seus alunos ou,

no mesmo sentido, o que é que leva os alunos a deixarem-

se influenciar pelo professor.

Na linha de French e Raven (1967), podemos

distinguir quatro grandes factores de influência dos

professores sobre os alunos: o reconhecimento do

estatuto do professor pelos alunos; o reconhecimento

22 Saul Neves de Jesus

Educação, Porto Alegre, v. 31, n. 1, p. 21-29, jan./abr. 2008

pelos alunos da capacidade de recompensar ou de punir

do professor, através das avaliações e das estratégias de

gestão da indisciplina; o reconhecimento pelos alunos da

competência do professor nos conhecimentos que este

lhes pretende ensinar; o reconhecimento de certas qualidades

pessoais e interpessoais no professor, apreciadas

pelos alunos, desenvolvendo-se processos de identificação

(JESUS, 1996b).

No passado, os alunos deixavam-se influenciar pelo

professor por aceitarem pacificamente o seu estatuto, por

o considerarem competente na área de conhecimentos

que devia ensinar e também por lhe reconhecerem poder

para recompensar ou punir através das avaliações e das

estratégias de gestão da indisciplina, não sendo postas

em causa as decisões tomadas pelo professor a este nível.

Actualmente, devido a múltiplos factores (JESUS, 2002,

2003, 2007; LENS e JESUS, 1999), muitos alunos não

se deixam influenciar pelo professor apenas devido ao

facto de ser o “senhor doutor” ou “senhor professor” a

sugerir, desvalorizam a escola como fonte de acesso ao

saber ou conhecimento, colocando muitas vezes em

dúvida a competência do professor, para além deste

também ter vindo a perder poder no que diz respeito à

capacidade de gestão da aprendizagem e da disciplina

dos alunos. Inclusivamente, são freqüentemente contestadas

as suas decisões pelos próprios alunos e pelos pais

destes, para além de todo o trabalho burocrático exigido

ao professor nas situações em que pretende reprovar

algum aluno. Assim, dos quatro factores de influência

distinguidos, aquele que parece ter maior importância na

actualidade é a identificação do aluno com o professor.

Isto é, o sucesso do professor junto dos alunos passa

muito pelo reconhecimento de certas qualidades pessoais

e relacionais no primeiro que os últimos apreciam.

A identificação do aluno com o professor passa

muito pela satisfação obtida na relação estabelecida. No

entanto, muitas vezes há uma insatisfação recíproca na

relação entre os professores e os alunos. Esta conclusão

foi obtida por Gilly (1976) quando investigou as representações

recíprocas dos professores e dos alunos, ao

verificar que o docente previligia na sua representação

dos alunos os aspectos cognitivos, enquanto estes

previligiam na sua representação dos professores os

aspectos afectivos e relacionais. Neste sentido, parece

haver um “mal-entendido” na relação pedagógica, sendo

importante que os professores se aproximem das necessidades

relacionais e de desenvolvimento dos alunos,

no sentido de os conseguirem influenciar ou motivar para

o alcance dos objectivos da educação escolar no plano

cognitivo. No passado, os alunos tinham que se adaptar

aos métodos dos professores, mas actualmente o

professor deve procurar ir ao encontro dos interesses e

da linguagem dos alunos, sendo flexível (de acordo com

o provérbio “professor, se eu não aprendo como tu me

ensinas, ensina-me de forma que eu aprenda”) e dando o

exemplo (um líder não pode funcionar segundo o

princípio “faz o que eu digo e não o que eu faço”).

Para potencializar a criação de “laços” com os alunos

e a motivação destes, os professores devem evitar o

distanciamento, a “neutralidade afectiva” e o autoritarismo,

devendo, ao contrário, fomentar uma “relação

de agrado” (RIBEIRO, 1991), caracterizada pelo diálogo,

pela negociação e pelo respeito mútuo.

Embora os professores tenham perdido poder nos

últimos anos, dificultando a utilização de alguns factores

de influência sobre os alunos que no passado resultavam,

continuam a possuir um instrumento fundamental para

conseguirem criar laços de identificação com os alunos,

influenciando-os: a linguagem utilizada na relação

pedagógica, quer verbal, quer não verbal.

Algumas das frases que o professor pode utilizar

para uma “relação de agrado” são as seguintes: “devias

estar orgulhoso dos teus resultados”, em vez de “estou

orgulhoso de ti” (no sentido de responsabilizar o aluno

pelo seu comportamento, indo ao encontro da sua

necessidade de auto-determinação); “estás quase lá”, em

vez de “está quase tudo errado” ou “não fazes nada de

jeito” (no sentido de promover uma percepção de

aperfeiçoamento pessoal e o esforço do aluno); “estejam

à vontade para perguntar sempre que não compreenderem

alguma explicação ou queiram apresentar

algum comentário relevante”, em vez de “não me

interrompam, se tiverem dúvidas perguntem no fim” (no

sentido de promover a participação dos alunos e a

compreensão e o acompanhamento das explicações do

professor); “vez como hoje te estás a portar bem”, em

vez de “para brincar estás sempre pronto” ou “tinhas que

ser tu” (no sentido de evidenciar os comportamentos de

disciplina dos alunos e não apenas os de indisciplina).

Também a aprendizagem e a motivação dos alunos

depende da identificação destes com o professor. No

entanto, verifica-se que muitos alunos apresentam

insucesso funcional, isto é, a sua aprendizagem ou saber

não corresponde ao que seria de esperar dado o nível

de escolaridade, e muitos encontram-se desmotivados

relativamente às tarefas escolares. Esta situação constitui

um dos principais problemas para os professores. Numa

investigação conduzida por Lens (1994), verificou-se

que a maioria dos professores considera que mais de

metade dos seus alunos se encontram desmotivados para

o estudo, sentindo que, mesmo que queiram, não conseguem

resolver este problema.

Com base nestes resultados, não obstante deverem

ser tomadas medidas que permitam restituir o poder aos

professores, nomeadamente serem definidos objectivos

mínimos de aprendizagem necessários para que os

alunos possam transitar para o ano lectivo seguinte e

serem tidas em conta as notas obtidas desde o início do

Estratégias para motivar os alunos 23

Educação, Porto Alegre, v. 31, n. 1, p. 21-29, jan./abr. 2008

percurso escolar dos alunos para o ingresso no ensino

superior, tornando-os mais responsáveis e motivados

para aprender logo desde os primeiros anos de escolaridade,

parece fundamental analisar algumas estratégias

que o professor pode utilizar para se confrontar de

forma mais autoconfiante e com sucesso perante as

situações de desinteresse dos seus alunos.

Especificamente, existem diversas estratégias que

os professores podem utilizar para motivar os seus

alunos para as tarefas escolares (ABREU, 1996; CARRASCO

e BAIGNOL, 1993; JESUS, 1996B; LENS e

DECRUYENAERE, 1991):

• manifestar-se entusiasmado pelas actividades

realizadas com os alunos, constituindo um modelo

ou exemplo de motivação para eles;

• clarificar, logo no início do ano lectivo, o

“porquê?” da seqüência dos conteúdos programáticos

da disciplina que lecciona, levando os

alunos a aperceberem-se da coerência interna

entre as matérias a aprender e a adquirirem uma

perspectiva global dessas aprendizagens;

• explicitar o “para quê?” das matérias do programa

da disciplina que lecciona, em termos da sua

ligação à realidade fora da escola e da sua relevância

para o futuro dos alunos;

• alargar a perspectiva temporal de futuro dos

alunos, levando-os a valorizar certas metas para

cujo alcance a escola constitui um meio ou

instrumento, contribuindo para que eles não se

limitem a uma atitude imediatista e consumista

face às alternativas facultadas pela sociedade

actual;

• salientar as vantagens que poderão advir para a

vida futura dos alunos se estudarem, comparativamente

às desvantagens se não estudarem,

embora actualmente haja uma grande incerteza

quanto às possibilidades de concretização dos

projectos pessoais;

• procurar saber quais são os interesses dos alunos

e o nome próprio de cada um deles;

• utilizar recompensas exteriores ao gosto e à

competência que a realização das próprias tarefas

poderiam proporcionar, indo ao encontro dos

interesses dos alunos, apenas no início do processo

de ensino-aprendizagem e quando os alunos

apresentam uma motivação muito baixa;

• deixar os alunos participarem na escolha das

matérias e tarefas escolares, sempre que possível;

• criar situações em que os alunos tenham um papel

activo na construção do seu próprio saber (de

acordo com o provérbio “se ouço esqueço, se vejo

lembro, se faço aprendo”);

• aproveitar as diferenças individuais na sala de

aula, levando os alunos mais motivados, com mais

conhecimentos ou que já compreenderam as

explicações do professor a apresentarem os conteúdos

aos outros alunos com mais dificuldades,

contribuindo para uma maior compreensão e retenção

da matéria por parte dos primeiros e para a

modelação dos últimos;

• incentivar directamente a participação dos alunos

menos participativos, através de “pequenas” responsabilidades

que lhes possam permitir serem

bem sucedidos;

• fomentar o desenvolvimento pessoal e social dos

alunos, através de estratégias de trabalho autónomo

e de trabalho de grupo;

• utilizar metodologias de ensino diversificadas e

que tornem a explicação das matérias mais clara,

compreensível e interessante para os alunos;

• estabelecer as relações entre as novas matérias e

os conhecimentos anteriores;

• partir de situações ou acontecimentos da actualidade

ou da realidade circundante para ensinar as

matérias aos alunos;

• utilizar um ritmo de ensino adequado às capacidades

e conhecimentos anteriores dos alunos,

previligiando a qualidade à quantidade de matérias

expostas;

• criar situações de aprendizagem significativas

para os alunos, contribuindo para uma retenção

das aprendizagens a médio/longo prazo;

• evitar levar os alunos a estudar apenas na perspectiva

do curto prazo porque vão ser avaliados

sobre as matérias em causa;

• diminuir o significado ansiógeno dos testes de

avaliação, contribuindo para o potencializar das

qualidades dos alunos, para um maior empenhamento

destes noutras tarefas escolares e uma

menor ansiedade face às provas de avaliação;

• proporcionar vários momentos de avaliação formativa

aos alunos, levando-os a sentirem satisfação

por aquilo que já conseguiram aprender e

motivação para aprenderem as matérias seguintes;

• reconhecer o progresso escolar dos alunos, comparando

os seus conhecimentos actuais com os

seus conhecimentos anteriores, levando-os a percepcionar

as melhorias ocorridas e a acreditar na

possibilidade de ainda poderem melhorar mais os

seus desempenhos se se esforçarem;

• reconhecer e evidenciar tanto quanto possível o

esforço e a capacidade dos alunos, não salientando

sobretudo os erros cometidos por estes;

• ter confiança e optimismo nas capacidades dos

alunos para a realização das tarefas escolares,

explicitando-o verbalmente;

24 Saul Neves de Jesus

Educação, Porto Alegre, v. 31, n. 1, p. 21-29, jan./abr. 2008

• contribuir para que o aluno seja bem sucedido nas

tarefas escolares, aumentando a sua autoconfiança,

nível de excelência e “brio” na realização

escolar;

• promover a realização de tarefas de um nível de

dificuldade intermédio aos alunos, pois as tarefas

demasiado fáceis ou demasiado difíceis não fomentam

o envolvimento do aluno, nem a percepção

de competência pessoal na sua realização;

• levar os alunos a atribuir os seus fracassos a

causas instáveis (por exemplo, falta de esforço) e

não a causas estáveis (por exemplo, falta de

capacidade), de forma a que aumentem as expectativas

de sucesso e o empenhamento em

situações futuras;

• clarificar crenças inadequadas sobre os resultados

escolares que os alunos possuam e que possam

estar a contribuir para um menor esforço ou

empenhamento nas actividades de estudo (por

exemplo, “o professor não gosta de mim e, logo,

não vou conseguir obter boa nota”);

• ajudar os alunos a aproveitarem o esforço dispendido

nas tarefas de aprendizagem, através do

desenvolvimento de competências de estudo, pois

“mais vale estudar pouco e bem do que muito mas

mal”.

2 ESTRATÉGIAS PARA MOTIVAR OS ALUNOS PARA

A DISCIPLINA NA SALA DE AULA

A indisciplina dos alunos constitui, na actualidade,

o principal factor de mal-estar docente para muitos

professores, de acordo com os resultados obtidos em

diversas investigações (JESUS, 1996a).

Sobretudo nos últimos anos, tem-se verificado um

aumento da freqüência e da gravidade das situações de

violência nas escolas e de indisciplina dos alunos na sala

de aula, nomeadamente das agressões verbais e físicas

entre os alunos e destes aos professores e funcionários,

fomentando um clima de medo e insegurança entre os

alunos, sobretudo mais novos e disciplinados, os pais,

receando pelo que possa acontecer aos seus filhos na

escola, os professores e os funcionários, pela agressividade

que os alunos possam manifestar. Num estudo

recentemente realizado em Portugal, a pedido do Ministério

da Educação (Instituto de Inovação Educacional),

sobre “A violência nas escolas” (VALE e COSTA,

1998), em que participaram cerca de 5000 alunos dos 8º

e 11º anos de escolaridade, de 142 escolas, foram obtidos

resultados que traduzem as proporções que as situações

de indisciplina começam a ter no nosso país, nomeadamente

verificou-se que 42% dos alunos já ouviram

insultar um professor na escola.

Também numa outra investigação recentemente

realizada no nosso país (CURTO, 1998), com alunos do

7º ano de escolaridade, verificou-se que a maioria dos

alunos inquiridos consideram que as turmas de que

fazem parte são “pouco disciplinadas” (46%) ou “indisciplinadas”

(13.3%), comparativamente aqueles que

consideram as suas turmas “disciplinadas” (34.5%) ou

“muito disciplinadas” (3.5%).

Face a estas situações começam a ocorrer manifestações

de saudosismo relativamente às práticas utilizadas

no passado e, entretanto, criticadas e abandonadas

em países considerados dos mais desenvolvidos do

mundo e que constituem modelos de democracia, liberdade

e inovação. Nos EUA é onde estas manifestações

ocorrem de forma mais radical com a defesa do castigo

físico nas escolas por responsáveis políticos, a expulsão

da escola de uma criança de 6 anos por ter beijado na

face uma colega, e a oferta, por associações de professores,

de cursos de judô para que os professores se

defendam dos alunos. Também alguns responsáveis

políticos de países da Europa defendem a reintrodução

do castigo corporal, nomeadamente a Ministra da Educação

e do Emprego de Inglaterra. Em Portugal, embora

as situações de indisciplina (ainda) não tenham as proporções

que se verificam nestes países, já há manifestações

de saudosismo que apontam no mesmo sentido.

Nomeadamente, num estudo de opinião, metade dos

participantes defendem a reintrodução de reguadas pelos

professores (FERNANDES, 1996). Por seu turno, a

Confederação de Pais (CONFAP) considera que deveria

haver mais castigos nas escolas, afirmando que “as

estatísticas podem dar a ideia de que está tudo bem, o

que não é verdade” (LIMA, 1997, 20), pois em 1996, de

mais de um milhão de alunos das escolas públicas

portuguesas, houve apenas vinte e sete suspensões por

períodos iguais ou superiores a oito dias, quando a

frequência de situações de indisciplina graves, nomeadamente

a agressão aos professores, é muito superior.

Conforme já tivemos oportunidade de defender num

trabalho anterior (JESUS, 1996b), as estratégias punitivas,

aparentemente eficazes por provocarem medo nos

alunos, apenas apresentam efeitos a curto prazo, sendo

necessário aumentar a intensidade e a frequência da

punição para continuar a ter os mesmos efeitos sobre o

comportamento destes. Além disso, o professor funciona

como modelo agressivo quando deveria fornecer um

exemplo de estabilidade e serenidade aos seus alunos.

Por seu turno, as suspensões são entendidas por muitos

alunos indisciplinados como “uns dias de férias”, não

tendo as implicações correctivas que tinham no passado

ao nível do seu comportamento.

Tendo em conta que a realidade actual é completamente

diferente e que os problemas devem ser analisados

no contexto histórico-social em que ocorrem, não

Estratégias para motivar os alunos 25

Educação, Porto Alegre, v. 31, n. 1, p. 21-29, jan./abr. 2008

nos parece que o retorno às práticas de educação escolar

utilizadas no passado possa constituir a via mais adequada

para resolver os problemas que se colocam aos

professores na actualidade. Passámos de uma educação

escolar caracterizada por um elevado autoritarismo para

um sistema demasiado permissivo, sendo fundamental

encontrar um ponto de equilíbrio.

Especificamente, no que diz respeito à gestão da

indisciplina dos alunos, é necessária uma acção concertada

a vários níveis, em particular no plano sociopolítico,

no plano da organização e gestão das escolas, no

plano do trabalho dos professores em equipa e no plano

da colaboração entre professores e pais, para além das

estratégias que o professor pode utilizar na sala de aula.

De seguida, apresentamos algumas das estratégias

que os professores podem utilizar para prevenir e gerir

situações de indisciplina dos alunos:

• manter-se sempre calmo, sereno e seguro, no

sentido de modelar o comportamento dos alunos;

• ser flexível, desde que coerente e estável, na

forma de actuação, podendo alguma surpresa no

comportamento do professor em relação aos

alunos permitir uma maior eficácia na influência

sobre estes (por exemplo, o professor pode

aproveitar e manifestar humor nalgumas situações

inesperadas em vez de ficar perturbado com elas);

• evitar confrontos desnecessários, sendo mais

tolerante (por vezes, é preferível que o professor

faça que não percebe ou que deixe passar algumas

situações menos graves do que tentar controlar

todas as situações, pois pode perder a eficácia na

actuação quando realmente se justifica intervir);

• nunca se esquecer que também já foi aluno,

criança ou adolescente, e que também gostava de

brincar;

• evitar categorizar ou rotular os alunos indisciplinados,

pois pode estar a contribuir para a manutenção

do comportamento destes (por exemplo,

não dizer “tinhas que ser tu”);

• não se distanciar dos alunos indisciplinados,

apenas estabelecendo relação com eles quando

apresentam comportamentos de indisciplina, pois

nenhum aluno é sempre indisciplinado durante

todos os minutos em que decorrem as aulas;

• tendo em conta que os comportamentos de

disciplina também podem ser aprendidos, enfatizar

os aspectos positivos do comportamento e da

aprendizagem dos alunos, encorajando os seus

progressos e fomentando uma expectativa de autoconfiança

(por exemplo, dizer “sei que és capaz”),

não estabelecendo interacção apenas quando o

comportamento é incorrecto ou quando há insucesso

na aprendizagem;

• dialogar com os alunos indisciplinados, procurando

compreender os motivos que estiveram na

base dos comportamentos identificados e fazendo

com que estes alunos também compreendam o

papel do professor, mas sobretudo que o professor

também é uma pessoa (também é “de carne e

osso”) que deve ser respeitada;

• fazer com que os alunos voltem a acreditar que

podem vir a alcançar resultados escolares positivos;

• orientar a participação dos alunos para as matérias

em análise, valorizando e incentivando essa participação;

• delegar funções de “assistente” no líder informal

da turma, para a gestão da indisciplina na sala de

aula;

• separar os alunos que perturbam;

• repreender os alunos em particular e apenas

quando tal atitude é efectivamente necessária;

• identificar os casos de alunos com problemas

familiares (por exemplo, agressividade na família

ou alimentação deficiente) e tentar contribuir para

a resolução de tais situações;

• nos questionários feitos no início do ano lectivo, a

todos os alunos que entram no ensino básico ou

secundário, colocar questões sobre violência

escolar, nomeadamente sobre motivos e formas

de resolução que os alunos têm para propôr no

sentido de diminuir a ocorrência e gravidade

destas situações;

• estabelecer contratos (gestão de contingências)

que identifiquem os comportamentos a corrigir

pelos alunos, no sentido de os responsabilizar

e de os levar a desenvolver uma “disciplina

interior”.

• Aliás, o desenvolvimento da autodisciplina deve

ser o objectivo de qualquer estratégia para gerir

a indisciplina dos alunos (ARENDS, 1995;

ESTRELA, 1992).

• Os exercícios de simulação são fundamentais

para o desenvolvimento de competências profissionais

ao nível da formação inicial (ESTEVE e

FRANCCHIA, 1986). No entanto, ao nível da

formação contínua de professores parece-nos que

o desenvolvimento profissional passa sobretudo

pelo trabalho em equipa, envolvendo a troca de

experiências, num clima de autenticidade, empatia

e cooperação.

A existência de regras implica o trabalho em equipa

pelos professores de uma mesma escola, para troca de

experiências, definição de perspectivas de intervenção e

encontrar consensos quanto aos comportamentos que

devem ser considerados de indisciplina. A indisciplina

26 Saul Neves de Jesus

Educação, Porto Alegre, v. 31, n. 1, p. 21-29, jan./abr. 2008

integra todos os comportamentos que os alunos apresentam

na sala de aula que perturbam o trabalho que

o professor pretende realizar, podendo uns professores

considerar que certos comportamentos constituem

indisciplina e outros não (por exemplo, bocejar, mastigar

pastilhas elásticas, usar boné, participar sem pedir a

palavra ou distrair-se facilmente). É necessário que os

professores se reunam para encontrar consensos e definir

regras claras sobre os comportamentos aceitáveis e os

não aceitáveis, evitando que os alunos possam argumentar

“mas o professor X deixa fazer”. Estas regras

devem ser apresentadas pelo Directores de Turma aos

alunos logo na primeira aula e explicar-lhes porquê que

são necessárias, podendo também, inclusivamente, ser

afixadas nas salas de aula.

Tivemos oportunidade de verificar na Escola EB 2+3

de Santa Iria em Tomar, em que estava afixado um

documento, elaborado pelo Conselho Pedagógico, que

definia as regras de actuação do aluno na sala de aula,

sendo distinguido o que ele deve fazer (por exemplo,

“entrar/sair ordenadamente”, “ser pontual”, “sentar-se

correctamente” e “aguardar a sua vez de falar”) e o

que ele não deve fazer (por exemplo, “trazer pastilhas

elásticas”, “levantar-se sem autorização” e “danificar o

material escolar”).

Também numa outra escola, a Escola C+S Dr. João

Rocha-Pai de Vagos, havíamos verificado que havia um

documento afixado nas diversas salas de aula sobre

“Aprender a aprender”, no sentido de ajudar os alunos

a identificar e a desenvolver competências de métodos

de estudo que lhes permitissem aproveitar as suas

capacidades e obter melhores resultados escolares. Esta

metodologia de afixar e distribuir documentos, com

indicações que podem ajudar o aluno a orientar o seu

comportamento, parece-nos ser um exemplo a seguir

pelas diversas escolas.

Na elaboração do regulamento de disciplina interno

também poderiam participar os próprios alunos, bem

como os funcionários da escola e os encarregados de

educação, tornando o estabelecimento de regras mais

participado, permitindo aumentar a responsabilização

pela sua concretização por todos os intervenientes.

Muitos professores, quando os alunos apresentam comportamentos

de indisciplina, por vezes, questionam-os

sobre as consequências esperadas (por exemplo, perguntam

ao aluno “o que é que tu merecias?”), ficando

surpreendidos com o nível de exigência que eles apresentam

relativamente às consequências que deveriam

decorrer do seu próprio comportamento de indisciplina,

revelando que os alunos também poderiam ser envolvidos

neste processo de definição de regras de

disciplina.

Esta abertura dos professores ao feedback fornecido

pelos alunos pode ser um factor essencial do

desenvolvimento e da aprendizagem dos professores, no

sentido de regularem e aperfeiçoarem as suas próprias

práticas educativas. A investigação conduzida por Curto

(1998) permitiu verificar que os alunos consideram que

os professores têm muita influência no potencializar de

situações de indisciplina. Nomeadamente, a maioria

dos alunos considera que “a indisciplina depende do

professor” e que “a simpatia do professor diminui a

indisciplina dos alunos”.

No âmbito de um projecto de investigação que

coordenámos (JESUS e XAVIER, 1997) foram obtidos

resultados que evidenciam que o diálogo com os alunos

sobre estratégias para gerir a indisciplina destes últimos

pode ser factor de desenvolvimento, aprendizagem e

aperfeiçoamento profissional. Inclusivamente, começa a

ser proposta (CARITA e FERNANDES, 1997) que não

sejam apenas os professores a identificar os comportamentos

indesejáveis dos alunos e a formularem regras

no sentido de evitar a sua ocorrência, mas que também

sejam os alunos a identificar os comportamentos de

professores que perturbam o desenrolar de processos de

ensino e aprendizagem.

Em todo o caso, a adequação das estratégias utilizadas

pelos professores depende também do nível

de desenvolvimento psicossocial e moral dos alunos

(GOMEZ, MIR e SERRATS, 1993; SPRINTHALL e

SPRINTHALL, 1993). Por exemplo, enquanto na fase

em que a criança frequenta o jardim de infância pode

ter sentido a utilização da força física, não enquanto

agressividade, mas sim para restaurar o controlo da

situação pelo educador, no 1º Ciclo parece ser mais

relevante o uso de reforços materiais, sobretudo positivos,

e no 2º e 3º Ciclos pode ser utilizada a força do

grupo social, em termos de aprovação ou desaprovação.

A formulação de regras com a participação de todos os

intervenientes, no sentido de aumentar a responsabilização

pela sua concretização, requer que os participantes

se encontrem no nível pós-convencional do

desenvolvimento moral, o que ocorre durante o Ensino

Secundário. Assim, a análise da gestão da indisciplina

deve pressupor uma abordagem desenvolvimentista que

se traduza na sugestão de estratégias diferenciadas para

cada nível de ensino (JESUS e XAVIER, 1998).

As estratégias, atrás apresentadas, são algumas que

os professores podem utilizar no sentido de uma maior

facilidade na gestão da disciplina dos alunos na sala de

aula. No entanto, não há receitas universais e cada

professor deve procurar aprender a partir da própria

experiência, sendo coerente consigo próprio. Fundamentalmente,

se o professor quer ser respeitado pelos seus

alunos, tem que ele próprio respeitar-se e apreciar as suas

qualidades pessoais e profissionais. Assim, uma das

regras que o professor deve ter em conta é tentar analisar

o seu próprio comportamento face às situações de

Estratégias para motivar os alunos 27

Educação, Porto Alegre, v. 31, n. 1, p. 21-29, jan./abr. 2008

indisciplina dos alunos e procurar aprender com essas

experiências, no sentido de um maior autoconhecimento

e aperfeiçoamento progressivo.

3 ABORDAGEM DE FILMES QUE ILUSTRAM

ESTRATÉGIAS PARA MOTIVAR OS ALUNOS

Algumas das estratégias para motivar os alunos

referidas anteriormente encontram-se explicitadas em

três filmes (“Clube dos poetas mortos”, “O professor” e

“Mentes perigosas”), que ilustram possíveis formas

de estabelecer “laços” ou desenvolver processos de

identificação que possam contribuir para a motivação

dos alunos.

Tendo em conta que os professores têm poucas

oportunidades para serem confrontados com o desempenho

de colegas na sala de aula, os filmes em causa

podem constituir bons exemplos a reter, pelo que iriamos

passar a destacar alguns dos aspectos que, neste âmbito,

nos parecem mais relevantes.

No “Clube dos poetas mortos” é notória a diferença

entre Mr. Keeting e os professores que aparecem no

início do filme. Estes últimos, para além duma atitude

que traduz pouca motivação para ensinar, enfatizam a

avaliação dos conhecimentos como a finalidade do

processo de ensino-aprendizagem, devendo os alunos

estudar as matérias porque vão ser avaliados sobre elas.

Mr. Keeting apresenta uma postura de grande entusiasmo

e gosto pela docência, procurando contribuir para o

desenvolvimento pessoal e social dos seus alunos. Este é

um dos grandes objectivos da educação escolar na

actualidade pelo que, não obstante este filme procurar

retratar a realidade educativa dos anos 60 num colégio

tradicional dos EUA, a atitude do Mr. Keeting permanece

bastante actual, constituindo um bom exemplo

para muitos professores. Especificamente, este professor

procura desenvolver o espírito crítico dos alunos perguntando-

lhes constantemente “porque é que o autor diz

isto?”. Inclusivamente, a situação em que se coloca em

cima da secretária e convida os alunos a fazerem o

mesmo tem este objectivo: “Estou em cima da secretária

para me lembrar que devemos olhar constantemente as

coisas de forma diferente. Não tenham só em mente o

que o autor pensa. Pensem no que vocês pensam.

Esforçem-se por encontrar a vossa própria voz”. Mas a

parte do filme que parece melhor ilustrar o papel que o

professor pode desempenhar a este nível é a situação em

que no início da aula Mr. Keeting solicita a um aluno

(Mr. Anderson), cujo comportamento revela alguma

timidez e falta de confiança em si próprio, para apresentar

o poema que todos os alunos deveriam ter feito

como trabalho de casa e este aluno não o havia realizado.

Habitualmente, o que acontece nestas circunstâncias

é o professor passar a um aluno seguinte até encontrar

algum que tenha feito o “TPC” e a partir daí continuar a

sua aula. Este tipo de alunos são categorizados como

“calados”, mas até correspondem a alunos que os

professores gostam de ter nas suas turmas porque não

são indisciplinados e até estão com atenção e obtêm

positiva nos testes de avaliação. Só que, embora estes

alunos até adquiram alguns conhecimentos curriculares,

no plano do seu desenvolvimento pessoal e social pouco

acontece, continuando “calados” nos anos lectivos seguintes.

Mr. Keeting revela ter uma sensibilidade particular

para esta situação (“Mr. Anderson pensa que tudo

dentro de si é inútil e embaraçoso. Engana-se, tem algo

dentro de si com grande valor”), incentivando este aluno

para deixar emergir o seu potencial criativo ao levá-lo a

ser capaz de criar um poema espontaneamente na sala de

aula que surpreendeu o próprio aluno e os seus colegas.

Além disso, outra particularidade, nesta situação, é

o facto de Mr. Keeting no final ir junto deste aluno

dizendo-lhe ao ouvido “nunca te esqueças deste momento”.

Fundamentalmente, o que todas as pessoas

procuram são experiências de vida positivas. Também os

alunos apresentam este objectivo, devendo o professor

tentar proporcionar-lhes este tipo de vivências, pois estas

também representam experiências gratificantes para os

próprios professores.

O filme “O professor” apresenta a particularidade de

traduzir uma situação cada vez mais frequente, aquela

em que o professor inicia esta actividade profissional de

forma transitória e com pouca motivação. É o caso de

Mr. Holland que foi ser professor porque pensava que

esta actividade lhe permitia ter mais “tempo livre” para

escrever as suas músicas, conforme refere logo no início

a um colega professor. A desmotivação de Mr. Holland é

bem manifesta na relação distante que mantém com os

alunos, estando apenas preocupado em cumprir o

programa e manifestando-se “irritado” quando os alunos

apresentam baixos resultados nos testes. Inclusivamente,

refere à sua mulher que quando era aluno queria estar

noutro sítio qualquer, mas nunca pensou que os professores

sentissem o mesmo, acrescentando inclusivamente

o seguinte: “Odei-o ensinar. Ninguém consegue

ensinar aqueles alunos”. Até que resolve começar a ir ao

encontro dos interesses dos alunos, verificando que estes

e ele próprio gostaram mais desta aula do que das

anteriores. Faz então esta opção por tornar as aulas mais

interessantes para os alunos e para si próprio, constituindo

um bom exemplo de uma atitude fundamental a

tomar por qualquer professor, a de tentar tornar as

experiências ocorridas no âmbito do processo de ensinoaprendizagem

tão satisfatórias quanto possível e de as

vivenciar com alegria. E parece valer a pena, pois no

final do filme, quando lhe é feita uma festa surpresa de

despedida, são significativas as palavras de uma ex-aluna

sua: “Mr. Holland teve uma profunda influência na

28 Saul Neves de Jesus

Educação, Porto Alegre, v. 31, n. 1, p. 21-29, jan./abr. 2008

minha vida. Em muitas vidas. Contudo sinto que ele

considera grande parte da sua vida disperdiçada. Ele

estava sempre a trabalhar na sua sinfonia. Ela ia torná-lo

famoso, rico. Provavelmente as duas coisas. Mas Mr.

Holland não está rico. E não é famoso. Pelo menos fora

da nossa pequena cidade. Portanto seria natural ele

considerar-se um falhado. Mas estaria enganado. Porque

eu acho que ele alcançou um êxito muito superior à

riqueza e fama. Olhe à sua volta. Não há uma vida nesta

sala que não tenha influenciado. E cada um de nós é uma

pessoa melhor graças a si. Nós somos a sua sinfonia Mr.

Holland. Nós somos as melodias e as notas da sua obra.

Nós somos a música da sua vida”.

Por seu turno, o filme “Mentes perigosas” pretende

ilustrar a realidade cada vez mais actual das nossas

escolas, com turmas constituídas por alunos desinteressados

e indisciplinados. Esta situação provoca um

“choque com a realidade” da Mrs. Louene, professora

em início de carreira que nunca pensou vir a encontrar

uma turma com estas características. Face à situação

geral de indisciplina dos alunos evidenciada na primeira

aula, esta professora tenta utilizar uma estratégia que

havia lido num livro sobre formas de lidar com a

indisciplina, concretamente escrever o nome do aluno

mais indisciplinado no quadro. No entanto, esta estratégia

não resultou, ficando Mrs. Louene desesperada

com o facto de não conseguir controlar a situação.

Convém salientar que o problema não está nos livros,

mas no aproveitamento que deles é feito, pois as

sugestões apresentadas para a resolução de situaçõesproblema

devem ser encaradas como meras hipóteses de

solução e não como receitas universais. Isto é, qualquer

estratégia para resultar tem que ser integrada no estilo

pessoal do professor que a vai utilizar e na situação em

causa, tendo em conta os alunos envolvidos.

Nesse sentido, o aproveitamento da experiência e das

qualidades pessoais por cada professor é fundamental

para gerir situações de indisciplina. No caso de Mrs.

Louene ela tenta chamar a atenção dos alunos ou criar

laços de identificação com eles indo ao encontro dos seus

interesses, ao salientar o facto de já ter sido fuzileira e de

os alunos também poderem vir a ser bons fuzileiros,

sendo a partir daquele momento cada um deles um

aspirante. Inclusivamente, refere aos alunos que “a partir

deste momento todos têm 20 valores, só tendo que se

esforçar para manter a nota”. Este discurso vai levar estes

alunos a entender o sentido da escola de forma completamente

diferente, voltando a acreditar na possibilidade

de obter sucesso escolar e, logo, a apresentar

comportamentos mais adequados para que a aprendizagem

pudesse ocorrer.

A tentativa de ir ao encontro dos interesses, vivências

e linguagem dos alunos também é evidente nos

poemas que começa por analisar com eles. Esta é uma

estratégia que muitos professores, sobretudo de português,

poderiam utilizar na actualidade, aproveitando as

letras de algumas músicas de que os alunos gostam, em

vez de rejeitarem à partida o interesse destas músicas,

porque “é só barulho”. Este ir ao encontro dos interesses

dos alunos é fundamental para que o professor consiga

fazer com que os alunos se interessem pelas matérias que

efectivamente pretende que eles aprendam. Concretamente,

Mrs. Louene procura levar os alunos a fazerem

essa transferência de interesses através do concurso

“Dylan-Dylan”. Os vencedores deste concurso teriam

uma recompensa. Este é outro aspecto particularmente

relevante nas estratégias para motivação dos alunos

evidenciadas neste filme. Isto é, a utilização de recompensas

pode resultar numa fase inicial quando os alunos

apresentam uma motivação muito baixa para as actividades

escolares. No entanto, quando os alunos começam

a envolver-se nestas actividades, as estratégias

deverão ser diferentes, incentivando a sua motivação

intrínseca. Foi o que Mrs. Louene fez, pois numa situação

seguinte em que sugeriu aos alunos a realização de

uma tarefa escolar, quando um aluno lhe perguntou qual

era o prémio por realizarem essa actividade, ela respondeu:

“aprenderem a ler e compreenderem é o

prémio”. Depois fundamenta esta posição utilizando um

exemplo e uma linguagem compreensível para os alunos:

o cérebro é como um músculo e, tal como eles correrão

melhor e mais depressa se treinarem a corrida, também

poderão usar melhor o pensamento se aprenderem as

matérias escolares (“Cada nova ideia constrói um novo

músculo. São esses músculos que vos podem tornar

poderosos. São as vossas armas. E neste mundo inseguro

têm que andar armados”). Além disso, acentua o facto

de os alunos terem que ir à escola e já que assim é devem

aproveitar para aprender (“Tentem. De qualquer forma

já estão aqui. Se no fim do período não forem mais

rápidos, fortes e espertos não perderam nada. Mas se isso

acontecer vão ser mais díficeis de derrubar”). É também

particularmente interessante a forma como Mrs. Louene

contacta os pais de um aluno suspenso, procurando-os

para evidenciar o potencial e as qualidades positivas

do seu filho, contribuindo para a criação de “laços”

afectivos também com as famílias. Assim, também sobre

a forma de abordar e chamar as famílias a participar no

processo de educação e de desenvolvimento dos seus

filhos, pela positiva e em colaboração e sintonia com os

professores, Mrs. Louene constitui um bom exemplo.

Em conjunto, estes três filmes ilustram que as aulas

tanto podem ser “chatas” ou “uma perda de tempo”,

como interessantes, evidenciando a importância da motivação

dos professores para o seu próprio sucesso e

realização profissional e também para a motivação dos

alunos. No entanto, não há receitas, devendo cada professor

descobrir o seu caminho, tendo em conta as suas

Estratégias para motivar os alunos 29

Educação, Porto Alegre, v. 31, n. 1, p. 21-29, jan./abr. 2008

experiência e qualidades pessoais, “fazendo uso de si

mesmo como instrumento” (COMBS, BLUME, NEWMAN

e WASS, 1979).

Os professores são diferentes e devem aceitar essa

diferença com naturalidade, tentando aproveitá-la na sua

prática pedagógica. As diferenças manifestam-se na

própria interpretação dos acontecimentos, quanto mais

na forma de actuação. Por exemplo, face à mesma

situação, “um aluno ri na sala de aula”, diferentes

professores podem apresentar interpretações diferentes

como sejam: “aquele aluno está a gozar comigo, vou

repreendê-lo”; “aquele aluno está satisfeito, deve ter

entendido a explicação que estou a dar”; “alguém deve

ter-lhe contado alguma coisa engraçada”; “aquele aluno

ri sem razão, deve ter algum problema psicológico”.

Não há um perfil universal de “bom professor”, tal

como não há um perfil de “líder universal”. Por exemplo,

o Modelo Situacional de Liderança, de Blanchard,

Zigarmi e Zigarmi (1986), considera que o estilo de

liderança mais adequado depende do grau de competência

e de motivação dos sujeitos que o líder pretende

influenciar. Neste sentido, distingue entre quatro estilos

de liderança: direcção, orientação, apoio e delegação. Na

sala de aula, a adequação e eficácia do estilo a adoptar

pelo professor também depende muito dos alunos e,

inclusivamente, diferentes alunos preferem diferentes

estilos de professor. Numa investigação realizada por

Villa (1985), em que distinguiu sete tipos de professor –

o didáctico (pela clareza da explicação), o organizado

(pela metodologia utilizada), o dominante (pela exigência),

o fisico (pela aparência), o cordial (pelo humor),

o afectivo (pela atenção personalizada) e o entusiasta

(pela motivação expressa) – verificou-se que todos

os tipos são considerados importantes pelos alunos,

consoante o estilo do próprio aluno, o seu nível de ensino

e as situações concretas. Inclusivamente, o mesmo aluno

pode preferir um estilo de professor num dado momento

e outro estilo noutro momento do mesmo ano lectivo.

Por exemplo, os estilos cordial e afectivo podem ser mais

valorizados no início do ano lectivo, enquanto os estilos

didáctico e organizado podem ser preferidos mais no

final do ano lectivo ou na proximidade de situações de

avaliação de conhecimentos.

O que é importante é o professor ter uma perspectiva

global das hipóteses de trabalho ou estratégias possíveis

para poder decidir por aquela que considere mais adequada

num determinado momento, em sintonia com o

seu estilo pessoal e as situações com que se confronta.

REFERÊNCIAS

ABREU, M. V. Pais, professores e psicólogos. Coimbra:

Coimbra Editora, 1996.

ARENDS, R. Aprender a ensinar. Lisboa: McGraw-Hill,

1995.

BANDURA, A. Self-efficacy: Toward a Unifying Theory of

Behavioral Change. Psychological Review, n. 84, p. 191-215,

1977.

BLANCHARD, K.; ZIGARMI, P.; ZIGARMI, D. O líder “um

minuto”. Lisboa: Editorial Presença, 1986.

CARITA, A.; FERNANDES, G. Indisciplina na sala de aula:

Como prevenir? Como remediar? Lisboa: Editorial Presença,

1997.

CARRASCO, J.; BAIGNOL, J. Técnicas y recursos para

motivar a los alumnos. Madrid: Ediciones Rialp, 1993.

COMBS, A.; BLUME, R.; NEWMAN, A.; WASS, H. Claves

para la formación de los profesores. Un enfoque humanístico.

Madrid: Editorial Magisterio Español, 1979.

CURTO, P. A escola e a indisciplina. Porto: Porto Editora,

1998.

DECI, E. Intrinsic Motivation. New York: Plenum Press, 1975.

ESTEVE, J. M.; FRACCHIA, F. B. Inoculation against stress:

a technique for beginning teachers. European Journal of

Teacher Education, n. 9, p. 261-269, 1986.

ESTRELA, M. T. Relação pedagógica, disciplina e indisciplina

na escola. 3. ed. Porto: Porto Editora, 1992.

FRENCH, J.; RAVEN, B. As bases do poder social. In:

CARTWRIGHT, D.; ZANDER, A. (Ed.). Dinâmica de grupo:

pesquisa e teoria. São Paulo: Herder, 1967.

GILLY, M. A propos des rapports enseignant-enseigné: la

représentation réciproque maître-élève repose-t-elle sur un

malentendu? Congrès Lápport des sciences fundamentales aux

sciences de l’education. Actes... Paris: Ed. de L’Épi, 1976.

v. II, p. 453-459.

GOMEZ, M.; MIR, V.; SERRATS, M. Como criar uma boa

relação pedagógica. Porto: Porto Editora, 1993.

JESUS, S. N. A motivação para a profissão docente.

Contributo para a clarificação de situações de mal-estar e para

a fundamentação de estratégias de formação de professores.

Aveiro: Estante Editora, 1996a.

______. Influência do professor sobre os alunos. Porto:

Edições ASA, 1996b.

______. Bem-estar dos professores. Estratégias para realização

e desenvolvimento profissional. 2. ed. Porto: Porto Editora,

1998.

______. Motivação e formação de professores. Coimbra:

Quarteto Editora, 2000.

______. Perspectivas para o bem-estar docente. Porto: ASA

Editores II, 2002.

______. La motivación de los profesores. Revisión de la

literatura. In: GARCÍA-VILLAMISAR, D.; FREIXAS, T.

(Ed.). El estrés del profesorado. Valência: Promolibro, 2003.

p. 116-139.

______. Psicologia da Educação. Coimbra: Quarteto Editora,

2004.

______. Professor sem stress. Realização e bem-estar docente.

Porto Alegre: Editora Mediação, 2007.