Cunha e Silva


                    Qualquer pessoa minimamente consciente do que ocorre pelo mundo afora, sabe que a roda do planeta não vai bem no que tange à tranquilidade do indivíduo. Como não podemos, neste espaço de artigo, abarcar toda história da violência que algumas nações estão sofrendo, fiquemos, por ora, com a situação preocupante do que anda acontecendo com a Venezuela e o Brasil, dois países que detêm posições de altíssimo nível, no sentido de violência como sinônimo de criminalidade, de atos bárbaros, de assaltos, e de mortes de inocentes que caiam nas mãos de bandidos, sobretudo nas ruas dos dois países. 
                   Quem acompanha como eu, seja pela imprensa, seja principalmente pela televisão através de programas especificamente destinados a apresentar a realidade espantosa e crudelíssima da violência e crime no Brasil, bem sabe que não estou exagerando ou transformando esse tema em sensacionalismo como fazem/faziam velhos jornais cariocas de pequeno porte, os quais, segundo, uma afirmação feita de humor bem carioca, se fossem espremidos, jorrariam sangue...
A realidade da violência dos dois países em questão em bem semelhante conforme se pode ver deste pequeno trecho extraído do primeiro parágrafo de uma reportagem de Paula Daibert publicada em O Globo (22/09/2012): “Duas crianças brincam em uma favela de Caracas. Em uma troca de tiros, um dos meninos é atingido nas costas e morre. Uma imagem de sangue invade as ruas da capital venezuelana.” A reportagem , baseada em dados colhidos da OVV ( ONG Observatório Venezuelano da Violência) constata que o ano de 2011 foi “o ano mais violento da história do país”. São as seguintes as estatísticas: 19.459 homicídios, o que corresponde a 1.621 vítimas por mês, 53 por dia , ou como declara a jornalista, “... a cada meia hora um venezuelano é morto! O Brasil, por sua vez, anda bem próximo disso. 
                Resta agora, refletir sobre o tema e a urgência de soluções que se devem tomar em ambos os países. São inúmeros os tipos de violência que resultam na morte de contingentes da população desses países. Mas, há três grandes fatores que concorrem para a ausência de medidas que seriam fundamentais para frear esta escalada diabólica de criminosos:a) a falta de vontade política dos governos federal e estaduais para atacar o problema da criminalidade; b) a facilidade na aquisição de armas por diversos modos de acesso; c) a falta de maior sentimento nacional de indignidade da população de cada país exigindo permanentemente, por diversos canais de união de forças sociais, que as autoridades apresentem planos de alta envergadura técnica e estratégica a fim de efetivamente redundar em soluções realistas com vistas a diminuir significativamente os níveis de crimes no país.
             Tentemos refletir sobre o primeiro dos três fatores discriminados acima.
Ninguém mais atento a questões sociológicas pode ignorar que, no exemplo brasileiro, país de dimensões continentais, com profundas deficiências no seu sistema carcerário, sobretudo caracterizado pela superlotação das prisões e de outras deficiências de infra-estrutura do sistema penal, lerdeza da justiça no andamento dos processos e outros males específicos reconhecidos pelos especialistas do assunto, vários tipos de crimes poderiam ser considerados em suas causas e consequências. Porém, um componente na complexidade do universo do crime e da lei, não pode ser minimizado. Ele prende-se a um fato determinante: o país é demasiado leniente com os criminosos de qualquer espécie. O passo decisivo a ser dado só se efetivaria caso houvesse alterações substanciais no Código Penal, cuja reforma e atualização estão em processo de formação. Só pediria que os juristas encarregados dessa reforma, não excluíssem do seu debate e das suas preocupações, a possibilidade, posto que por tempo provisório, da instituição da pena de morte para casos de crimes de extrema hediondez e da absoluta segurança de que o acusado foi o autor do crime. No caso de não instituirmos essa penalidade extrema, que, pelo menos, seja implantada a prisão perpétua cumprida na íntegra.
           Só mudanças deste calibre poderiam, ao longo de sua vigência em lei, se refletir na consciência da população, fazendo com esta reduza o seu poder de ousadia criminosa e fique certa de sua punição real caso cometa ações delituosas bárbaras ou de crimes de menor grau de violência. Isso funcionaria como fator inibidor a se infiltrar culturalmente no seio da sociedade. Em outras palavras, o criminoso, seja de que condição social for, está ciente de que irá ser julgado e a pena ser-lhe-á aplicada com o rigor da lei, o que acabaria com os excessos de brechas e de benéficos de que ainda desfrutam os criminosos brasileiros e certamente os venezuelanos.
        O segundo fator, o da questão das armas, merece toda a atenção de nossos governantes. Vários setores de segurança do governo poderiam ser empregados no combate sem tráfico de armas por criminosos: a polícia Federal e as Forças Armadas, principalmente, que atuariam junto às fronteiras do país, estacando toda tentativa de criminosos transferir de seus países, por terra, água e ar, arsenais de armas pesadas destinadas a suprir grupos do crime organizado. Seria uma espécie de plano-piloto dedicado à solução do tráfico de armas no país. Mas, para isso, o governo federal teria que fazer acordo de cooperação com os estados a fim de que as ações federais de combate à venda ilícita de armas de ponta se realizassem harmonicamente com um corpo de elite de policias militares estaduais, bem preparados e bem remunerados, numa ação conjunta empregando todos os recursos tecnológicos e de logística de que os serviços de segurança dos países adiantados já dispõem.
      O terceiro e último fator caberia à sociedade civil que, no Brasil, por exemplo, não vejo assim tão unida como em outras nações, por exemplo, a Argentina, a Espanha, a Grécia, entre outras. O país se ressente de maior sentimento de  união entre seus habitantes. Somos uma sociedade muito fragmentada, pelo menos em três grupos maiores, os ricos, a classe média e os pobres.Não há nenhuma canal de comunicação entre estes três níveis da pirâmide social.
    O sentido pleno de fraternidade civil, do que seja ser compatriota está ausente no país por uma série de razões culturais e de níveis de escolaridade. Só com o avanço de uma educação aprimorada para, pelo menos, a maioria da população, possivelmente nos tornaríamos mais solidários. Só com uma conscientização política mais elevada o nosso povo se mostraria mais unido para enfrentar os grandes desafios que ainda temos pela frente. A modernidade no Brasil só atingiu alguns níveis restritos da nossa sociedade.

   O país ainda se defronta com práticas arcaicas e costumes embrutecedores em várias regiões brasileiras e o fenômeno se dá tanto ainda nas capitais quanto no interior. Neste estágio assimétrico de sociabilidades não é possível convivermos solidariamente e reivindicarmos as mudanças esperadas por todos a fim de minimizar a escalda da violência de nosso cotidiano. A mesma coisa se aplicaria, guardadas as diferenças culturais e avanços econômicos, sociais e políticos, ainda profundos, entre o Brasil e a Venezuela. Na violência, contudo, infelizmente estamos praticamente no mesmo barco da insegurança, da impunidade e no medo de enfrentarmos a rua, à luz do sol ou da noite enluarada.