Diz uma matéria recente no Jornal da Paraíba que neste mês de junho o número de celulares na Paraíba ultrapassará a marca dos dois milhões. Já é tempo de nós, jornalistas, começarmos a desalojar o microcomputador do seu trono de A Grande Revolução Tecnológica do Século 20, e começar a instalar ali esses curiosos aparelhinhos que estão se revelando como a primeira grande mutação dos micros. Sim, porque assim como um microcomputador doméstico não era apenas uma calculadora eletrônica, nem era apenas uma máquina de escrever, um celular há muito tempo deixou de ser um telefone. Ele é um micro-micro-computador multiuso: telefone, câmera fotográfica, plataforma para acesso à Internet, etc. Com a chegada da TV digital, em breve estarei assistindo ao Jornal Nacional ou um clássico no Maracanã enquanto passeio de metrô, com a telinha na mão.
O celular também está a caminho de absorver os cartões magnéticos de Banco. Por que não? Em vez de andar com um monte de visas e mastercards na carteira, bastar-me-á ter meu celular no bolso. Ao pedir a conta no restaurante, o garçom traz uma engenhoca na qual eu plugo meu aparelho, digito o número do meu Banco, da minha conta, a minha senha, e o valor da despesa, seja para débito imediato ou para cobrança na fatura do mês que vem.
Se eu tiver pachorra suficiente, posso também usar o celular como máquina de escrever. Estou no botequim, degustando minha cerveja gelada com miúdos de galinha, e tive uma idéia brilhante para um artigo? Não há problema. Ali mesmo, na tranqüilidade do meu recanto, vou digitando o texto, e quando o tenho pronto, ligo para o computador do jornal e subo o arquivo.
O celular é calculadora, é agenda, é despertador. É também controle remoto, porque em alguns lugares já é possível ligar para o número do microondas e botar para esquentar a sopa que tomarei daqui a dez minutos, ou ligar para a geladeira e consultar (mediante um código pré-estabelecido) se ainda tem cerveja lá dentro ou se preciso comprar, porque já está acabando.
O mais interessante é que a ficção científica nunca previu o celular, nunca previu os telefones pessoais, conduzidos no bolso. “Previu” coisas absurdas como helicópteros pessoais (uma espécie de mochila nas costas, com um motor e uma hélice), algo que se existisse transformaria o espaço aéreo das cidades num matadouro sanguinolento; mas não imaginou (pelo menos ao que eu saiba) que os telefones poderiam ser um dia despregados do fio e da parede, e conduzidos no bolso do usuário. Aqui e acolá viam-se “telefones de pulso” (como relógios) mas isso nunca se firmou. Em meu conto “Príncipe das Sombras” (1989) imaginei que o painel dos automóveis teria uma secretária eletrônica que receberia os recados quando o sujeito estivesse fora; retornando ao carro, ele ouviria as mensagens e se quisesse poderia fazer ligações “viva voz” enquanto guiava. Quem diria que o celular viraria pelo avesso, a tal ponto, as vidas de todos nós.