DEMOCRACIA?

     Que democracia é essa que, em trinta anos, já destituiu dois chefes da nação e agora ameaça destituir mais um? Será que vamos ter um presidente defenestrado a cada dez anos? Que democracia é essa que, nos últimos trinta anos, a frase que mais temos ouvido é Fora, Collor! Fora, FHC! Fora, Lula! Fora, Dilma! Fora, Temer! Fora, Bolsonaro! ??? Será que somos muito ruins tanto como eleitores como candidatos? Será que temos o prazer mórbido de querer tirar da presidência qualquer um que chegue lá democraticamente? Será que temos arraigado, na maioria de nossa população o desejo doentio, por ditaduras?

     São muitas as perguntas e poucas as respostas.

     De 1992 pra cá, já tivemos mais de 130 pedidos de impeachment protocolados no Congresso Nacional, além da tentativa de formação de um governo paralelo a um democraticamente eleito. Há algo de muito errado com nosso comportamento político. E olhe que esses pedidos de afastamento de presidentes não são, em sua maioria, formulados por causa do povo na rua, não. São formulados por instituições tidas como respeitáveis como OAB, ABI, e por políticos de oposição.

     Esses pedidos de impeachment têm sua razão de ser, mas, se olharmos o histórico de cada um, veremos que não há coerência entre eles ( esclareço que não defendo nenhum dos ex-presidentes nem o atual ). As razões que levaram ao afastamento de Collor e Dilma são irrelevantes se comparadas com o que aconteceu nas gestões de FHC, Lula, Temer e no que está ocorrendo na administração do atual presidente. São escândalos os mais vergonhosos possíveis.

     São muitas e variadas as causas de termos uma democracia tão conturbada. Talvez a mais forte seja o fato de cada presidente que se elege não levar consigo uma boa base parlamentar e se vê obrigado, então, a se unir com a banda podre das elites política e financeira do país e também do exterior, para conseguir aprovar no Congresso projetos importantes e administrar bem o país, sem ser chantageado. Collor, FHC e Lula se uniram com a jagunçada política brasileira e, antes do início de seus mandatos, foram tomar a bênção aos patrões do mercado financeiro internacional nos EUA. Collor, por não querer se coligar com a jagunçada, e Dilma, por não querer beijar a mão de ninguém em Nova York, foram impedidos de continuar governando.

     Outra razão é que cada presidente, após eleito, acha que é o dono do mundo, que pode tudo, que está acima do bem e do mal. O ego infla desmedidamente, e eles começam a falar e a fazer muitas tolices. FHC, que era ateu, na presidência chegou a afirmar que estava com Deus introjetado em si. Lula disse que ninguém o impediria de fazer uma excelente gestão. Ademais eles fecham os olhos para as patifarias que seus aliados começam a aprontar. Os próprios presidentes, cheios de si, muitas vezes se corrompem também. Esquecem que a mídia e seus tribunais na internet vivem de escândalos, sempre alerta para, ao menor descuido, armarem o maior escarcéu com julgamentos implacáveis e ultrarrápidos. Cada presidente e seus ministros não têm muita cautela ao celular ou ao falarem com a imprensa. Nas redes sociais também postam bobagens e coisas comprometedoras.

     Esse comportamento é típico de quem está inebriado pelo poder e lembra bem o Tartaruga, pai de Capitu no romance Dom Casmurro, que, pela ausência do chefe, assume um posto mais alto na repartição onde trabalha, melhora de vida e fica deslumbrado. Mas, quando o titular do cargo retorna, o Tartaruga entra em desespero e pensa em suicídio. A grande diferença é que parlamentares e governantes brasileiros não entram em desespero, pois hoje estão protegidos pelo excesso de mordomias e de imunidades, excrescências que não devem existir num regime verdadeiramente democrático e republicano, um regime que não devia ser refém de uma jagunçada, nem dos tubarões do mercado financeiro internacional, nem de um povo que parece gostar de ditaduras.

                                       Washington Ramos.