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                           CONTATO  DE  QUINTO  GRAU

 

 

                  Miguel  Carqueija  e  Melanie  Evarino  

 

 

-         Ah, então o sinhô é reporti? Taí uma coisa que raramente aparece pru modo dessas banda...

-         Eu soube que o senhor teve uma experiência e tanto com UFOS, seu Jonas. Aliás essa é uma região onde eles aparecem muito.

-         Apareciam, seu moço. Acho que essa turma de americano esquisito num vorta por aqui tão cedo...

-         O senhor disse americanos? Não quer dizer alienígenas?

-         É isso mesmo, esses tais de “alienijas”, que são esses americano que pilota uns helicóteros esquisitões, redondos e sem hélice. Nós aqui acha que eles faz parte de algum programa assistencialista da terra deles...

-         Hein? Não entendi o que o senhor quis dizer.

-         Vancê num vê que esses alienijas são tudo deficiente físico?  Uns aleijões anãozinho, com cara de bulbo, de cebola, sei lá, e uns oiões que inté Deus duvida. Nós acha que eles ficam assim lá nos Estados Zunidos pruquê tem muita usina atômica e também pruquê aquela gente come muita gordura...

-         Você acha isso mesmo?

-         É claro! Vancê num tá pensando que nós semo inguinorante, num é mesmo? Uai, eu sou tão sabido que inté sei que a capitar dos Estados Zunidos é Uaxinguiton...

-         Seu Jonas, podemos ir ao que interessa? O seu contato com o UFO... olha, já estou com o gravador ligado...

-         Está bem, meu rapaz. Óia, a coisa aconteceu tem uns quinze dias. A patroa Gumercinda aqui... ó Gumercinda! Traz aqui um capilé pru moço, prá ele num achá que a gente semo mal-inducado!

         O repórter esquivou-se um pouco mas acabou por aceitar. Tudo para apressar a narração da história.

          E o que o “seu” Jonas narrou foi o seguinte:

          Certa noite, uns quinze dias antes, a vizinhança veio correndo chamar o Jonas, porque havia uma “mãe do ouro” ali perto, cercando umas pessoas. O Jonas correu para lá, levando a sua espingarda, secundado pela Gumercinda, que levava a vassoura e o rolo de pastel. Nas últimas semanas muitas histórias corriam pelas redondezas, a respeito de discos voadores. Mas o da clareira era muito real, luminoso, metálico, e quando Jonas chegou avistou logo os homenzinhos de cara de bulbo, três ao todo, que assistiam enquanto vários indivíduos e animais – cabras, bodes e até uma vaca -  eram puxados, sugados pelo ar, aos gritos, por uma estranha luz verde que emanava da parte inferior do imenso UFO.

-         Desci todo mundo de vorta, seus americano sem-vergonha!

         Eles se voltaram admirados e um deles falou em português, mas parecia um robô falando:

-         Não se intrometa, terráqueo. Esses que estamos abduzindo foram selecionados pelo nosso interesse superior...

-         Aqui o sinhô num vai “biduzir” ninguém. Desci logo os meus vizinho e os bicho, sinão eu derrubo o teu “helicótero”!

-         Isso é impossível. Uma arma desse tamanho não pode derrubar a nossa nave.

-         Vancê fala isso pruquê vancê ainda num conhece o trabuco do vovô Teodoro.

         E Jonas disparou, sem maiores cerimônias. Deu uns cinco balaços em direção à astronave, que pairava a baixa altura. Impossível ou não, parece que alguma bala atingiu um conduto vital, pois o UFO começou a soltar faíscas, a dar pequenas explosões e saracotear, e as pessoas e os bichos vieram descendo lentamente, acabada a força do raio trator. Por fim o disco desestabilizou-se e, soltando fumaça, foi se espatifar na escarpa da montanha ali perto, diante dos olhos horrorizados dos etês.

          Um deles, com seus olhões vermelhos de raiva, mirou Jonas:

-         Nós devíamos desintegrá-lo, mas agora como voltaremos para o nosso mundo?

-          É muito simples – respondeu o matuto. – Eu chamo o Maneco Faz-Tudo que ele dá uma ajudazinha pru modo de ocês voltarem lá pros Estados Zunidos. Mas antes ocês vão me ajudá na colheita desse mês qui nós tá cum farta de gente.

         Sem muita escolha, os “cabeça de cebola” (como disse “seu” Jonas) aceitaram o trato, mas com um pouco de desconfiança.

-         Pronto, já cabô! – concluiu o fazendeiro.

-         C-como? – gaguejou o repórter, sem entender nada.

-         Ué, vancê queria o que? Que tudo cabasse num “conto de fardas”?

-         Não é isso, seu Jonas. Eu só queria que o senhor me contasse TUDO que aconteceu com você e com o UFO... não me diga que isso é tudo?!

-         Bom, depois disso só posso dizer que eu chamei o Maneco Faz-Tudo prá dá um jeito naquele helicótero... só sei que a gente levamos o troço pra oficina dele e conseguimos dá cabo do probrema daquela coisa – disse tudo num só fôlego.

-         Mas, e o senhor, conseguiu que “eles” o ajudassem na colheita?

-         Ora essa, mas é claro que sim! Trato é trato. Ai deles se num cumprissem o acordo... eu ia explodir eles com o meu trabuco! – exclamou Jonas, assustando o repórter.

-         No que eles o ajudaram, seu Jonas? Até agora o senhor não disse nada... – cobrou a lógica do repórter.

-         Já que ocê tá tão curioso em sabê o que eu ganhei, vamu lá no celero pra eu te amostrá o equipamento – completou, levantando o repórter da cadeira e empurrando-o para fora em direção ao local indicado.

          Chegando lá o repórter quase entrou em choque quando se deparou com o tal equipamento: dois UFOS em forma de motocicletas, totalmente blindados e compactados, com espaço para duas pessoas cada um.

-         E o “cebolão” disse que eles faz o trabalho de vinte homens em dez minutos – orgulhou-se das máquinas.

-         M-mas ... isso é inédito, seu Jonas! – gaguejou o entrevistador, boquiaberto. – Eles deram para o senhor duas naves do arsenal deles.

-         O americano falou que eles são naves de fuga que serve prá colhê o milharal também.

-         Ainda não consigo acreditar nisso – falou o outro, tocando no motor exposto das “supostas motocicletas”. Elas só servem para a colheita, seu Jonas?

-         Bom, que eu saiba sim. Mas o bichinho corre que é uma beleza...

-         O senhor tem certeza disso? Porque com um motor desses pode-se fazer qualquer coisa...

-         Ahá, lembrei! – gritou o fazendeiro, assustando de novo o repórter.  – Já que vancê falou sobre isso, eu tinha esquecido de uma coisa...

-         O que é, seu Jonas? – a pergunta foi feita com plena curiosidade.

-         Esse tar de super-UFO também serve prá fazê capilé. E o pior é que o capilé sai gostoso, ocê num acha?

 

 

(Melanie Evarino é carioca e co-autora, com Miguel Carqueija, do romance de fantasia "O estigma do feiticeiro negro" editado em 2012 pela Editora Ornitorrinco.