ELMAR CARVALHO

 

 

Na última quinta-feira, ao acordar, por volta de três horas da madrugada, na casa em que moro, no Condomínio Pingo d' Água, em Regeneração, senti um forte cheiro de flores, como se a fonte do perfume estivesse perto de mim. Estranhei, mas não tive medo. Fui ao banheiro, e imediatamente voltei a dormir. Fazia um mês e dez dias do falecimento de minha mãe. Creio que o cheiro fosse um misto de flor de laranjeira, jasmim, rosa e lírio de São José. Ao menos são esses os odores de minha predileção. Quando senti esse inebriante perfume, como se alguém tivesse espargido essas essências odoríferas perto de mim, lembrei-me de mamãe.

 

Ao sair para o trabalho, cedo da manhã, encontrei numa área do condomínio dona Toinha, esposa do irmão Rodrigo, minha vizinha. Sem delongas, perguntei-lhe se na noite ou na madrugada daquele dia ela não havia sentido algum cheiro de flores, talvez trazido pelo vento de algum quintal da vizinhança.

 

Ela respondeu que não, e logo disse que o perfume que eu sentira fora minha mãe que me visitara. De fato, devo dizer que a explicação de cheiro trazido pela brisa não me convencia, uma vez que a janela do quarto estivera fechada, e o aroma parecia evolar de um local muito perto de minha rede, como se a fonte de onde ele emanava estivesse no centro do quarto.

 

Contou-me ela que fora muito ligada a sua avó materna, e que a visitava diariamente. Ela faleceu aos 95 anos de idade, se não me falha a memória. Era lúcida, saudável e ativa. Costumava fazer trabalhos manuais, como crochê, renda de bilro e uma espécie de bordado, além de outros artesanatos com tecidos, apenas como passatempo, já que não vivia disso. A professora Toinha ficou ao pé de seu leito, quando ela faleceu. Dias após a morte da avó, ela teve uma experiência semelhante à que eu tive, e teve a nítida sensação de que fora visitada por sua ancestral.

 

Quando retornei a Teresina, tratei de contar o caso a minha mulher. Mal comecei a falar, ela logo me perguntou se eu havia sentido cheiro de flores. Assenti. Ela então me contou que na tarde de quarta-feira, em nosso quarto, por volta de três horas da tarde, aspirou um agradável cheiro, que parecia proveniente de muito perto de si; chegou a cheirar o próprio braço, para constatar se estaria perfumada, mas verificou que o odor não era proveniente de sua pessoa.

 

Não vou aqui, neste pequeno registro, levantar hipóteses, nem irei derrubar leis e teorias. Direi apenas que nunca havia sentido, na casa de Regeneração, esse perfume anteriormente, nem tampouco a minha mulher, em nosso quarto. Deixo que cada um encontre a sua própria explicação. Apenas peço que ninguém vá, depois, “enfeitar” o caso, dizendo que vi alma. Por outro lado, quando um amigo me perguntou se eu não tive medo, respondi que não; que eu teria me assombrado se porventura tivesse sentido catinga de enxofre.

 

Apenas lembro aos céticos ou pseudorrealistas, mormente aqueles que pretendem desqualificar essas experiências com o uso da própria Bíblia, que Cristo asseverou que na casa de seu Pai havia muitas moradas, e que ele foi protagonista do episódio da transfiguração, em que apareceram figuras bíblicas que há muito haviam morrido, no caso, Moisés e Elias. Seu rosto brilhava como o sol e as suas vestes se tornaram resplandecentes.

 

Encerro dizendo que a mecânica quântica nos acena com a possibilidade de várias dimensões. E o velho Shakespeare dizia que havia mais mistério entre o céu e a terra do que poderíamos imaginar. Minha mãe amava as plantas e as flores, as cultivava, e admirava a beleza do céu e da natureza. Transmitiu isso aos filhos, e talvez essa admiração contemplativa fosse uma das suas maneiras de orar, em sua fé singela, mas firme. Nada mais direi. Saber dizer, é também saber calar.