CASAMENTO E OUTRAS LEMBRANÇAS
Por Elmar Carvalho Em: 21/06/2012, às 14H49
ELMAR CARVALHO
Meses atrás, o advogado da Eletrobrás/Piauí Alfredo da Paz Neto, um amigo de várias décadas, ao telefone, pediu-me para celebrar o casamento de sua filha. Prontifiquei-me a desempenhar esse ofício, que foi realizado neste sábado. Revi alguns amigos, meus e deles. Entre outros, ali estavam o senhor Silvério, sua mulher Maria Dalva e a filha do casal, Rosário. Silvério foi por muitos anos administrador da empresa Marc Jacob em Campo Maior. Conversamos sobre o fastígio e queda dessa tradicional loja de departamento, bem como de suas concorrentes Casa Inglesa e Casa Almendra, ambas já inativas há várias décadas.
Conversei, também, com o Gregório Paranaguá da Paz, filho do tenente Jaime da Paz, operoso e probo prefeito de Campo Maior, e de dona Mariema, digna mestra de várias gerações de campomaiorenses. Gregório é engenheiro e um dos diretores da Eletrobrás/Piauí. Ainda entretive rápida prática com o Milton Higino, gerente do BNB em Água Branca, e que presidiu o Comercial Atlético Clube, que já conquistou o campeonato piauiense, e vem fazendo uma boa campanha no certame do corrente ano. Gostou da referência que fiz ao saudoso atacante Edgar Pinto, em minha prédica casamenteira. Vi também o Diogo da Paz, verdadeiro alquimista ao improvisar um coquetel, ou ao bolar, por mero esporte, uma iguaria exótica.
No meu “sermão”, citando Rui Barbosa, que dissera ser a pátria uma família amplificada, eu disse que a sociedade é um somatório das famílias, e que, se entendemos que a sociedade não está bem ou que esteja violenta, também estamos a admitir que a família não está saudável, vez que aquela é apenas uma amplificação desta. Portanto, adverti que os pais devem se esforçar para bem criar os filhos, através do exemplo e da disciplina, para que eles, desde bem crianças, conheçam os seus limites e as regras básicas de convivência, para que não venham a se tornar adultos intolerantes e tendentes a não aceitar os limites da lei, da ética e das normas sociais para uma boa convivência.
Aduzi que se uma criança é acostumada a ter os seus caprichos e chiliques satisfeitos, a sair de casa no momento em que bem entende, a voltar na hora que lhe der na telha, a não cumprir seus deveres escolares, quando o pai ou a mãe quiser lhes impor horários e modos de comportamento, por volta dos dez/doze anos, talvez já seja tarde demais, porquanto esse garoto já está habituado à plena liberdade e indisciplina. Por conseguinte, esses controles, disciplina e orientações devem ser ministrados nos primeiros anos de vida, para que a criança tenha uma noção clara do que pode ou não pode fazer, e que existe o poder familiar de seu pai e de sua mãe.
Entre outros lugares comuns, repetidos em esponsais, adverti os noivos dos desgastes naturais que a convivência muitas vezes produz. Por isso, lhes disse que deviam exercitar sempre o perdão e a tolerância, pois todos temos a nossa quota de defeitos. Enfrentei a perícopa bíblica de que a mulher teria sido extraída de um osso da costela de Adão, fazendo referência à parte recitada de uma música antiga de Silvinho, em que é dito que a mulher foi formada desse osso para que ela não se sentisse superior nem inferior ao homem; para que fosse efetivamente sua companheira. Acrescenta os versos que ela foi formada de um local próximo ao coração do homem, para que este a amasse e a protegesse, o que nos dias das patrulhas do “politicamente correto” implica em dizer que a recíproca deve ser verdadeira. E deve mesmo, convenhamos.
Após fazer essas e outras considerações e advertências, que são de praxe, e que julguei ser meu dever funcional fazê-las, disse que eles através do amor e da compreensão venceriam todas essas mazelas e percalços, mesmo porque o noivo, sendo coerente com o seu nome – Jorge Daniel – seria um santo guerreiro, o são Jorge, vencedor do temível dragão da Capadócia, ou o profeta Daniel, destemido pela fé inabalável em Deus, que não se acovardou quando foi jogado na cova dos leões. Por outro lado, falei que o nome da noiva – Jamylle – significa beleza plena, e que ela, tendo beleza plena, certamente teria beleza espiritual, ou seja, seria uma mulher virtuosa. Por conseguinte, saberão ambos, com as suas qualidades, superar as vicissitudes que a vida oferece, e que nos servem de advertência e exemplo, para que nos aperfeiçoemos, como deve ser o desiderato maior de todos nós.
Ao cabo dessas palavras mais sérias, mais severas, proclamei que aquele era um momento de alegria, um momento festivo e de congraçamento dos esposos com seus pais, familiares e amigos, antes de partirem para a constituição de seu próprio lar. Lembrei-me de um saudoso amigo, o Balula, recentemente falecido, que em outras eras, quando nas alegres libações da juventude, gostava de recitar um poema, em cujo final apoteótico, falava que iria quebrar a taça da amargura, e literalmente espatifava a mais rica taça de cristal da casa em que se encontrava, para o mais efusivo aplauso de seus ouvintes, e para a profunda tristeza da dona do lar, que ficava com a sua coleção desfalcada.
Asseverei, porém, que ali estávamos para celebrar a felicidade, tal como nas bodas de Caná, em que o próprio Cristo, a pedido de sua mãe, operou o seu primeiro milagre, transformando alquimisticamente água em vinho da melhor qualidade, para que aquela festa esponsalícia não perdesse o brilho, com a falta dessa substância do espírito. E pedi que erguêssemos a taça da ventura, e não a da amargura, como no poema melodramático do repertório do Balula.