Querida Mãe. Há quanto tempo não recebe uma carta de alguém? De um filho, então, lembra-se da última? É que vivemos a época das mensagens eletrônicas, do contato telefônico, muito mais prático e rápido. Por que escrever, se podemos dizer tudo o que queremos falando diretamente com a pessoa com quem desejamos conversar, às vezes, pagando tão pouco, menos de cinco centavos de real por minuto de bate-papo?
     Não aceito e, portanto, não vou colaborar para a extinção da carta. Entendo que ela serve mais do que para dar notícias, permitir contato ou trocar informações; por meio dela, podemos fazer chegar às pessoas a quem amamos ou de quem gostamos, até mesmo nosso cheiro: basta espalharmos sobre o papel um pouco do perfume preferido pelo ente querido.
A carta nos possibilita dizer muito mais do que diríamos por telefone, mensagem de celular, ou pelas redes sociais: ela prova e comprova que o que está escrito, está dito, ainda que sem esgotar o assunto em pauta, pleno de realidade, verdadeiro. Escrevem-na os amantes, os amigos, mesmo os inimigos, para dizerem ao destinatário o que sentem e pensam, sem que aquilo possa ser desdito. Não consegue o missivista remetente apagar ou “deletar” o que está na carta. Ainda que não seja verdade o que escreveu, fez que fosse verdadeiro; se não o sentimento que embasou as palavras, o resultado, que se tornou real, definitivo. Apenas o destinatário da carta pode transformar em nada tudo o que lhe disse ou quis dizer quem a enviou, destruindo-a.
     Por saber quanto poder tem a carta, valho-me dela, não somente para matar saudade da própria letra manuscrita – conforme está na original enviada à senhora -, que há tempo apenas confeccionava ao assinar algum documento que não podia ser assinado digital ou virtualmente. É que, hoje, mãe, muitos equipamentos eletrônicos são dotados, mais que de teclados inteligentes, de programas de reconhecimento de voz, o que faz com que, praticamente, não precisemos manuscrever nada. Sirvo-me dela, ainda, para dizer-lhe que o que aqui vai escrito, mais que verdadeiro, é verdade pura. Você é mesmo insubstituível, e olhe que cheguei a essa conclusão depois de vivenciar o afeto, o reconhecimento, a dedicação, o desprendimento, a valorização e o amor que algumas mulheres demonstraram sentir por mim. O amor de esposa, de filha ou irmã tem características diversas das do seu; valores diferentes. É que a cumplicidade sem receio, a desmesurada entrega; o perdão absoluto, só você, mãe, e o Criador são capazes de proporcionar; e, por serem atos inexplicáveis do ponto de vista humano, apenas o amor divino explicaria.
     Aproveito a oportunidade desta carta, mãe, para reafirmar minha convicção de que você não é importante por ser insubstituível, nem que é insubstituível em razão de sua importância. Acontece que não se pode substituir o que é único, nem atribuir outra importância, se não a máxima, a quem contém a matéria-prima e é detentor da fórmula do amor pleno, inteiro, unívoco.
     Mãe, encerro por aqui estas poucas linhas, por entender que não há mais nada a dizer ou ressaltar em relação a um ser que, desprovido de quereres particulares mesquinhos, faz da simplicidade sua verdadeira e sublime vaidade. Que o Pai de todos nós proteja você para sempre.
     Antônio Francisco Sousa – Auditor-Fiscal e filho da mãe ([email protected])