Breve bateria de poemas de Carlos Gramoza
Em: 22/05/2019, às 17H58
1 - Ponteio
( ausências)
Só nas lembranças minhas
Existe você ainda
Esqueça não de mim
Não deixe de vir
Mesmo em forma de memória
Abro a porta
De dentro prá fora
Só me entram ausências
Os sorrisos que imaginava
Calaram-se em meu coração
Em cada parada
Bélicas fumaças
Estão a verdade matando
Sei que de repente
Naquele arvorejado recanto
Despertam-se vozes e cantos
Em barulheiras
Em lembranças de mim
Salgadas revivências
Com a embriaguês
Dos cheiros de mel quente
Do jasmim
Completo acho-me
Em forma deixa-me
Nessas salmouras
E despertam-me
Em permanente sortida
Fornida manhã
Que só nas lembranças
Tão ainda existem
Tomando-me o sol
Todo os lábios
Nela e em mim
Melieiros sopros gerais
Incessantes torrenciosas
Boas águas
Por bilhas a pontearem
E servi-las.
Carlos Gramoza Vilarinho
20-5-2019
2 - Suplícios tantálicos
Com iguais atributos
Como que deserdados
Invisíveis
No seu rincão
Para outros meios
Desertados
Forçadas saídas
Como inevitáveis
Evacuações.
Por uma nata
Que auto degrada-se
Na bitola
No rés do chão
Do seu mundinho vilão.
Nessa manhã
Vi esses olhos
Falando dessas feridas
Na pele,
Das suas cicatrizes,
Das provações,
Das saudades,
Dos tantálicos suplícios,
Do presente.
Dos louros em lugares outros,
Alcançados
As elevadas auto-estima.
Nessa manhã
Despertaram ventos canteiros
Que resistem ainda
Dentro neles e em mim.
Carlos Gramoza Vilarinho
11-5-2019
3 - Degradação
Em altas ondas
Pelos fortes ventos
Se levanta o mar.
Desde onde alongo os olhos
E não vejo
Aguço os ouvidos
E não ouço
De lá chegam desses outros
Em profusões
Em um eu amontoando
Em fluxos e refluxos
Surgem de todos as direções
De todos lados
No mar de roucas vozes.
Dores
Esqualidezes
Turbulências
Ansiedades.
Passos deambulando
Sem luar
Sem farois
Insolados
Nesgas de devaneios
De sonho.
Por espermas
Não esquálidos espermas
Um outro fecundado melieiro
Mundo
Extirpado o mundo outro
Esse
O mar em êxtase
Permanente orgasmos de virações.
Carlos Gramoza Vilarinho
4 - Gesto Essencial
A insensibilidade
Olhos que só olham
Nada mais
Em loucura
Em mim
Petrificado Jasmim
Angustiadas calmarias
Expressão dura no semblante
Reação nenhuma
Como o tempo
Parece que como em mim
Está enfermo tudo
De pernas pro ar
Roucos veículos
Voam na avenida
Rompi o silêncio
Que quiseram pra mim.
Dentro em mim esse vazio
Como esse copo que não bebi.
Beijos nesses lábios
Que não foram meus
A voz que não saiu
Esses braços
Que seu corpo não abraçaram
Sua primeira vez
Que não foi minha
Que jamais as outras serão
Esses seus prazeres
Que comigo nunca foram
Nem serão
O mutismo desses olhos
Quando os seus encontravam
Distante eco na memória
Tempo que virou silêncio.
Mais que de repente
O preparo
Nuvens se formando
Chuva que sempre chega
Engravida as entranhas
Frutas maduras no coração
Sempre sedento
Enquanto chuva houver
E sol em conjunção
Servidas taças de canções
Lançadas na mesa do mundo.
Carlos Gramoza Vilarinho
2-5-2019
5 - Inverno 1987
Uma caçada: uma fogueira acesa
Cachorro para farejos, e acuos.
Vaga-lumes na escuridiça
Voos de corujas,
Uma lanterna para focar,
Noite passada, toda, no mato.
Mas hoje não é dia:
O relâmpago
As nuvens se formando.
- hoje eu tive olhando
Um pedaço de roça:
Que eu botei, o arroz, outros legumes
Tive olhando assim pra eles...
Se não chover nesses dias;
Não vão aguentar não,
Tá tudo perdido.
-quem botou em beira de brejo,
Já está fazendo uma apanha
Mas quem botou em costaneira,
- a coisa tá feia, outra perca.
- as chuvas causando estragos no sul
- estão em tudo as agoniações;
Apertados os cercos
Em todo lugar.
- Naqueles dias, daquelas chuvadas:
Até que fizeram uma animação,
Alvoroçaram de um jeito...
Que fiquei olhando,
Pra eles assim!
Com esperança mesmo.
Carlos Gramoza Vilarinho
25-5-99
6 - Canto Vasqueiro
Badalos de bem longe...
Chegam de distante...
Chocalhos: que estes outros
Alguns despertam
Eco na memória.
E berros e cantos
E ecos em variações.
Despelada a caatinga nos ossos,
Estorricadas, horas antes lhe furava
Toda, com violência o sol a pino.
Sombras do mato, e do tempo
Se achegando, apanhando-me
Calma faz-se tardezinha, horas seis.
O impossível do vedar a vazadura
No poço da memória.
- hora qualquer da manhã
Sol fora há poucas horas.
As chuvas chegaram
Mas o sol nesta manhã está fora:
Tanto mais forte brilha o sol
Tanto mais verde ainda as folhas,
E soltam os seus cheiros ativos de mato,
Frutas, flores, legumes, nuns ventos leves,
Que tocam suaves a corredeira
Do riacho Mulato
De água barrenta e escura.
Uns ventos que em afagos matriciais
Nos revolvem.
E há chocalhos e berros e cantos
E variantes de ecos.
E reencontro-me com o eterno, leve,
E a benquerença. As verdes frondes pulam,
E vão por dentro crescendo,
E sobem por mim em seus viços,
Sobre as branduras,
Depois das curtidas e difíceis deslembranças.
Perenes fossem esses viços
Da caatinga que pulam nesses momentos.
E se abrissem esses viços, em outros
Aos olhos, afora pelas vastezas:
Sumidos andantes
Apertados os cercos
As agoniações estão em tudo:
Em vasqueiras direções.
Carlos Gramoza Vilarinho
04-02-99
Carlos Gramoza Vilarinho é natural de Amarante-PI. Publicou três livros: “Tempos Perplexos” (com prefácio de Virgílio Queiroz) e “Passos Oblíquos” (com prefácio de Clóvis Moura) e Ressacas (com prefácio de Cunha e Silva Filho).