Assembleia Legislativa do Piauí - 180 anos
Por Reginaldo Miranda Em: 09/05/2017, às 14H47
Era o dia 4 de maio de 1835. Na cidade de Oeiras, antiga capital do Piauí, grande era a movimentação. De várias partes haviam chegado as pessoas mais gradas da província para a solenidade de instalação da Assembleia Legislativa Provincial e posse dos vinte deputados eleitos em escrutínio secreto. Desde o dia primeiro chegavam os deputados para as sessões preparatórias que se desenrolaram nos dois dias anteriores à instalação, onde compareceram inicialmente onze dos vinte deputados, aqueles que residiam mais próximo, chegando os demais em dias subsequentes. Essas duas sessões preparatórias foram presididas pelo deputado Pedro Antônio Pereira Pinto do Lago, escolhido por aclamação.
À sessão inaugural comparece o presidente da província Manuel de Sousa Martins, então barão, depois visconde da Parnaíba, tomando assento igual ao do presidente da assembleia e à sua direita. Então, depois de abertos os trabalhos, na forma constitucional, dirige sua fala à nova casa legislativa, dizendo do estado dos negócios públicos e das providências a serem tomadas, em seguida retirando-se formalmente, acompanhado da mesma deputação que o levou ao recinto dos trabalhos. Sua fala foi seguida pela do presidente da Câmara Municipal de Oeiras, saudando o nascente poder legislativo.
Em ato contínuo passam os deputados recém-empossados à eleição da mesa diretora. Para presidente foi eleito o veterano de outras pelejas Manuel Pinheiro de Miranda Osório, derrotando três outros candidatos, inclusive seu irmão José Francisco de Miranda Osório; para vice-presidente foi eleito José Luís da Silva, o primeiro médico do Piauí, em acirrada disputa e já em segundo escrutínio de desempate; para primeiro e segundo secretário foram eleitos, respectivamente, Ignácio Furtado de Loiola e Ignácio de Loiola Mendes Vieira; ficaram posicionados como suplentes da mesa, Francisco de Sousa Mendes e Amaro Gomes dos Santos, este último redator do primeiro jornal de Oeiras e do Piauí, em 1832, denominado O Piauiense.
Depois de eleita e empossada a mesa diretora, foram formadas as comissões de Política e Especial, esta última por sugestão do deputado José Francisco de Miranda Osório, para emitir parecer sobre comissões permanentes necessárias às atividades legislativas. É com essa estrutura que têm início os trabalhos legislativos na província do Piauí, sob a direção do tenente-coronel Manuel Pinheiro de Miranda Osório, militar oeirense e um dos principais pugnadores nas lutas pela adesão do Piauí à Independência do Brasil. Inicialmente, funcionou a Assembleia Legislativa com o regimento do Conselho Geral, em seguida elaborando o seu, tendo aquele como referência.
Segundo a referida Lei n.º 16, de 12 de agosto de 1834, o juramento dos deputados, a polícia e economia interna, entre outros, far-se-iam na fora dos regulamentos e interinamente na forma do regimento do Conselho Geral.
Para complementar esse estudo, lembramos que esse juramento era feito pelos deputados ainda na fase preparatória, perante o Bispo ou primeira dignidade religiosa do lugar, na igreja matriz, depois das ações religiosas, fazendo primeiro o presidente e os mais de dois em dois, repetindo em alta voz com a mão direita sobre o Missal, o seguinte: “Juro aos Santos Evangelhos promover fielmente, quanto em mim couber, o bem geral desta província do Piauí, dentro dos limites marcados pela Constituição do Império. Assim Deus me ajude”. Cantado o hino Veni Sancte Spiritus e prestado o juramento retornaram todos à sala das sessões. Era a força da tradição católica.
A eleição desses deputados deu-se em clima de absoluta tranquilidade, em 29 de dezembro do ano anterior, dando-se a apuração dos votos somente em primeiro de fevereiro do ano da posse. Embora o processo fosse democrático, naquele tempo só votavam aqueles que tivessem certa renda e pertencessem aos estratos mais elevados da sociedade. O voto era censitário e o processo eleitoral realizado em dois turnos: eleições primárias, para a formação de um colégio eleitoral que, nas eleições secundárias elegeria os senadores e deputados gerais e provinciais. Basta dizer que apenas 113 eleitores de paróquia (eleitos em eleições primárias, em suas paróquias ou distritos) elegeram os vinte deputados.
Para o registro da história, foram eleitos os membros da aristocracia rural piauiense, com a inserção de uns poucos elementos urbanos, entre padres e profissionais liberais. Foram esses os primeiros deputados do legislativo piauiense, com a respectiva votação: Manuel Pinheiro de Miranda Osório, 95; Francisco de Sousa Mendes, 94; Raimundo de Sousa Martins, 91; José Luís da Silva, 87; José Monteiro de Sá Palácio, 86; Ignácio Francisco de Araújo Costa, 86; Marcos de Araújo Costa, 84; Pedro Antônio Pereira Pinto do Lago, 84; Arnaldo José de Carvalho, 83; José Francisco de Miranda Osório, 75; Amaro Gomes dos Santos, 75; Ambrósio Machado Wanderley, 70; Justino da Silva Moura, 68; Tomé Joaquim Gomes Teixeira, 66; Joaquim de Sousa Martins, 64; Antônio Raimundo Dias de Seixas e Silva, 62; Ignácio de Loiola Mendes Vieira, 61; Manuel Clementino de Sousa Martins, 55; Francisco Serafim de Jesus, 52; e, Ignácio Furtado de Loiola, 48 votos (BRANDÃO, Wilson de Andrade. História do poder legislativo da província do Piauí. Teresina: 1997). É essa a primeira deputação do Piauí. Em outro espaço poderemos fazer uma análise das ligações genealógicas entre os membros, existindo caso de pais e filhos, irmãos, sobrinhos, primos e parentes afins na mesma legislatura, num clube de poucas famílias.
Vale ressaltar que a criação da Assembléia Legislativa Provincial era uma exigência da Lei n.º 16 de 12 de agosto de 1834, verdadeiro ato adicional à Carta Constitucional de 25 de março de 1824, para suceder em suas atribuições o Conselho Geral da Província. Essa modificação na Carta Constitucional do Império foi proporcionada pela Lei de 12 de outubro de 1832, que deu aos deputados eleitos na legislatura seguinte poderes constituintes para reformarem alguns artigos da Constituição. E assim o fizeram.
Portanto, no último de 4 do corrente mês completaram-se 180 anos de trabalhos legislativos no Piauí, feito este comemorado pela atual diretoria com histórica sessão na velha capital. Ao longo desse tempo a Assembleia Legislativa teve altos e baixos, mas nunca arredou do compromisso constitucional de bem servir ao povo piauiense. Parabéns.
(Diário do Povo, 6.5.2015).
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* REGINALDO MIRANDA, autor de diversos livros e artigos, é membro efetivo da Academia Piauiense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Piauí e do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-PI. Atual presidente da Associação de Advogados Previdenciaristas do Piauí. Contato: [email protected]