[Washington Ramos]               AQUELE  UMBIGO

     Vi-o sem querer, sem nem estar pensando se havia umbigo no mundo. Por isso me assustei quando o vi. Foi um susto bom. Fez-me bem. Foi assim: eu estava comprando arame farpado e arame de amarrar o farpado em estacas de cimento. Ora, vejam só quanta coisa dura, áspera, cortante, perfurante e amarrante. Quanta coisa contrastante com um delicado umbigo de mulher. Foi assim: ela pediu meu celular para fazer uma foto de um número de pix. Dei-lhe o celular. Ela, por trás de um balcão, num piso mais elevado do que o piso onde eu estava, levantou a blusa para limpar a lente da câmera do celular. Ficou menos de três segundos limpando. Mas foi o suficiente para eu ver aquele umbigo afundado naquela barriguinha sem proeminência nenhuma, mas sem magreza nem secura. Foi o bastante para eu ver aquelas preguinhas delicadas encurvadas lá para dentro daquele escurinho que me fez pensar no infinito. Foi o bastante para eu ver a maciez daquele ventre que abriga o umbigo de uma morena. Foi o suficiente para eu ver aquela pele moreno-clara que aparenta nunca ter sido tocada por mão de homem nenhum. Aquele umbigo e aquela tez parecem ter sido fabricados na forja de Deus para serem preservados para sempre.