Ministro Antônio de Sousa Martins
Ministro Antônio de Sousa Martins

Reginaldo Miranda[1]

 

Em 1829, nasceu na cidade de Oeiras o menino que recebeu na pia batismal o nome de Antônio e, mais tarde, seria notável jurista e magistrado, ministro do Supremo Tribunal Federal.

Era filho ilegítimo, como então se dizia, do brigadeiro Manuel de Sousa Martins, Barão, depois Visconde da Parnaíba, que governou o Piauí por largos anos, e de D. Mariana Joaquina Barbosa, natural e moradora na cidade de Oeiras, com quem aquela autoridade mantivera duradoura união estável. Neto paterno do açoriano Manuel de Sousa Martins e de sua esposa Ana Rodrigues de Santana. E pelo costado materno era neto de Francisco Vieira de Sá e de D. Josefa Maria do Espírito Santo[2].

Em Oeiras, então capital da província, enceta todos os seus estudos, mudando-se depois para Recife, onde conclui os preparatórios e ingressa na Faculdade de Direito de Olinda, bacharelando-se em ciências jurídicas e sociais no ano de 1853.

Regressando à terra natal, esta vivia um clima de tristeza e decadência, em face de ter perdido os foros de capital da província no ano anterior, ainda sendo grande o ressentimento popular. E seu pai, já velho e doente, vivendo no ostracismo político era o principal símbolo dessa decadência, vez que fora ele quem mais defendera os interesses da velhacap e mais se opusera à mudança da Capital. Também, sofria ação de interdição por alegação de demência movida por alguns ávidos parentes ansiosos para lançarem mão em seu rico patrimônio. Faleceria logo depois, o velho Visconde, em 20 de fevereiro de 1856.  Nessas circunstâncias, visando confortá-lo permaneceu Antônio de Sousa Martins em Oeiras, onde, em princípio de 1854, foi nomeado promotor público da vizinha Jaicós. Em 22 de dezembro do mesmo ano foi nomeado juiz municipal e de órfãos de Oeiras, em cujo exercício permaneceu até 29 de setembro de 1859, quando vai removido para a comarca de Santo Antônio da Patrulha, nas proximidades de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul.

Ascendendo em sua carreira profissional e depois de completar o quatriênio legal, foi nomeado por decreto de 16 de outubro de 1860, para o cargo de Juiz de Direito da Comarca de Alegrete e Urugaiana, também no Rio Grande do Sul, assumindo em 20 de dezembro do mesmo ano.

Por decreto de 12 de dezembro de 1862, foi nomeado chefe de polícia do Espírito Santo. Foi removido para o mesmo cargo na província de Minas Gerais por decreto de 22 de maio de 1863, onde tomou posse em 11 de junho do mesmo ano, permanecendo até 19 de maio de 1864, quando foi exonerado, a pedido. Mais tarde, ainda assumiria a chefatura de polícia do Rio Grande do Sul, nomeado por decreto de 7 de fevereiro de 1880, com posse em 24 de março e exoneração, também a pedido, em 31 de outubro do mesmo ano.

Em 21 de outubro de 1864, reassumiu suas funções na magistratura, tomando posse do cargo de Juiz de Direito da Comarca de Taubaté, em São Paulo. Em 10 de fevereiro de 1866, vai removido desta para a de Itapicuru-Mirim[3], no Maranhão, onde permanece até 29 de novembro de 1873, quando vai removido para o mesmo cargo na capital da Paraíba.

Não há dúvida, pois, de que Antônio de Sousa Martins era um magistrado de carreira, dedicando a força de sua inteligência aos estudos jurídicos, no que ia fazendo nome e adquirindo reconhecimento. Por isso, em 3 de agosto de 1878, ascendeu à segunda instância sendo nomeado desembargador da longínqua Relação de Cuiabá, de onde mais tarde passou para a de Belém do Pará. Entretanto, em 21 de outubro de 1880, foi removido, a pedido, para a Relação de Ouro Preto, em Minas Gerais, tendo nesta exercido o cargo de procurador da Coroa, Soberania e Fazenda Nacional.

Em outubro de 1881, vai removido desta para a Relação de Porto Alegre, onde conquista grande destaque e reconhecimento. Assumindo a presidência em 10 de dezembro de 1882, nesta permanece até o fim do regime imperial, sucessivamente reconduzido por decretos de 19 de dezembro de 1885 e 9 de setembro de 1888. Com a proclamação da República não sofre abalo em seu prestígio profissional nem na confiança de seus pares, que o mantêm no cargo por eleição realizada em sessão de 7 de março de 1890.

Entretanto, seu prestígio extrapolava as fronteiras gaúchas. Com a reorganização do Poder Judiciário a fim de atender às exigências do novo regime republicano, vai nomeado em 29 de janeiro de 1891, para o cargo de juiz da Corte de Apelação do Distrito Federal, então sediado no Rio de Janeiro, nome dado à antiga Relação do Império. Foi eleito seu vice-presidente.

Em 12 de setembro de 1891, abandona aquela Corte de Apelação porque foi nomeado ministro-adjunto do Conselho Supremo Militar, atual Superior Tribunal Militar (STM), na vaga aberta com a aposentadoria de José da Mota Azevedo, tomando posse em 16 do mesmo mês e ano.

Depois de prestar relevantes serviços naquele Conselho, vai nomeado ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), por decreto de 19 de setembro de 1894, tomando posse em 10 de outubro do mesmo ano. E por decreto de 20 do referido mês de outubro foi nomeado Procurador-Geral da República, passando a acumular as duas funções, em cujo exercício permanece até o fim de sua vida.

Foi, também, agraciado com o título de Conselheiro, por decreto imperial de 11 de agosto de 1883.

Faleceu esse distinto magistrado em 25 de dezembro de 1896, na cidade do Rio de Janeiro, então Distrito Federal, sendo sepultado no cemitério de São João Batista, em cova rasa, conforme pediu nas últimas disposições. Foi casado com a sobrinha Gertrudes de Athayde Martins[4], com quem teve quatro filhos que lhes sobreviveram: a) Dr. Raul de Sousa Martins, juiz federal da 1ª vara do Rio de Janeiro, suicidou-se em 21 de novembro de 1920, após ver uma sentença de sua lavra reformada no Supremo Tribunal Federal; foi casado em 23 de maio de 1896, com a carioca Lucila Ewerton Martins, filha do conselheiro José Ignacio Ewerton de Almeida e de sua mulher Eugênia da Gama Cochrane de Almeida; b) Marianna Martins do Valle (Maranhão, 1875 – Rio, 8.9.1951), casada com o advogado gaúcho Palemon do Valle, filho de Manoel P. do Valle e d. Antônia Caetano do Valle; c) Ilza Martins Macedo, casada com o capitão médico Luiz Macedo; e d) Theonila de Sousa Martins Athayde (Porto Alegre, 10.11.1889 - ?), casada com o engenheiro civil Gastão Sarayba de Athayde.

Com essas notas prestamos justa homenagem à memória desse velho magistrado, ministro da mais alta corte do país, cujo legado muito honra à terra piauiense.

 

 

 


[1] REGINALDO MIRANDA, advogado especialista em Direito Constitucional e em Direito Processual, foi membro do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-PI, da Comissão de História, Memória, Verdade e Justiça, assim como cofundador e presidente da Associação de Advogados Previdenciaristas do Piauí. É membro da Academia Piauiense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico do Piauí. E-mail: [email protected]

[2] No termo de batizados da filha Fidelcina, lavrado em 19 de julho de 1884, na igreja catedral de Nossa Senhora Madre de Deus da cidade de Porto Alegre, onde o genitor exercia o cargo de desembargador da Relação do Rio Grande do Sul, consta que a menor era filha do desembargador Antônio de Sousa Martins e de sua esposa Gertrudes de Athayde Martins, naturais do Piauí; sendo avós paternos o Visconde da Parnaíba Brigadeiro Manuel de Sousa Martins e Mariana Joaquina Barbosa; e maternos o bacharel Eleutério Augusto de Athayde e Maria Amélia de Sousa Athayde (Oeiras,1803 – Rio, 28.11.1895). Padrinhos: Eugênio Marques de Holanda e sua mulher Emília Ferreira de Holanda, representados por seus procuradores Arthur de Sousa Martins e Mariana Martins. A mesma informação se repete no termo de batizado da filha Theonila, lavrado na mesma igreja, em 28.2.1890, recebendo por padrinhos os procuradores do termo anterior. No termo de óbito de D. Maria Amélia de Sousa Athayde, lavrado no Rio de Janeiro, em 29.11.1895, informa o declarante Dr. Raul de Sousa Martins, seu neto, que ela era filha do Visconde da Parnaíba, sendo, assim, irmã paterna do genro, que casara com uma sobrinha; deixou três filhos maiores.

[3] Na vila de Itapecuru-Mirim, suicidou-se na madrugada de 6 de outubro de 1867, o negociante João Alves dos Santos, contrariado com os comentários de que sua esposa mantinha relações ilícitas com o juiz Antônio de Sousa Martins, com que ele próprio mantinha relações de amizade, deixando 4 filhos menores. Às 6 horas da manhã daquele dia, encontrou-se o corpo pendurado em uma árvore no quintal, tendo ao lado uma carta, tendo em cima o óculos, caixa de rapé e lenço. O caso teve ampla repercussão, sendo objeto de folhetos e poesias contra Martins, assacando-se-lhe outros casos de desonra de família naquela localidade. No folheto é ele referido por neto do visconde da Parnaíba, em evidente equívoco. Talvez, a circunstância de filho bastardo tenha gerado a dúvida dos detratores (ESPÍRITO SANTO, EZEQUIEL. Alicantinas do Bacharel Antônio de Souza Martins. Maranhão, 1869)

[4] Filha do bacharel Eleutério Augusto de Athayde e de sua esposa Maria Amélia de Sousa Athayde, esta filha de Mariana Joaquina Barbosa e de Manuel de Sousa Martins (Visconde da Parnaíba), portanto, irmã inteira e sogra do magistrado Antônio de Sousa Martins.