Nas últimas festividades juninas, o pai, acamado, paciente de delicada patologia que, além de lhe impedir o deslocamento por seus próprios meios, ainda o obrigava a freqüentar sessões fisioterápicas, não pôde levar os filhos menores ou à esposa aos locais das festas. O filho maior, perfeitamente apto a substituí-lo nesse mister, refugou: ele é que não deixaria de se divertir por conta do estado de saúde do velho; tampouco, serviria de motorista à mãe e aos outros irmãos. Pelo contrário, como o carro da família não iria ser utilizado, melhor pegá-lo para, juntamente com amigos, fazer aquela viagem que, em anos passados,  diversas vezes, o pai fizera somente para agradar-lhe.

 Esquecera o filho ingrato de que, em igual período do ano anterior, o doente era  ele. Na ocasião, preocupado, o pai se dividira: ou levava os outros garotos para se divertirem, enquanto a mãe o acompanhava no hospital, ou ele mesmo fazia isso. Mas nada daquilo fora levado em consideração.

 Não é incomum, infelizmente, na condição de filhos, muitos quererem que todos os direitos lhes pertençam, ao passo que as obrigações são responsabilidade dos pais. Alguns até alegam que, por não terem pedido para nascerem, compete àqueles zelar para que nada de mal lhes aconteça. Como ninguém consegue impedir isso, atribuem aos velhos a culpa por seus fracassos ou desvios de rota. Não raro, chegam os mais recalcitrantes a imputar tudo isso ao descaso  ou à desatenção dos pais. Isso é assim desde que inventaram que o homem é um ser inteligente.

 Ocorre que a natureza, tão pródiga em dádivas, às vezes, sabe ser terrível madrasta. Um dos mais eficientes  cobradores ou fiscais de que dispõe é a consciência. Quem deve algo (e quem é que não deve?), em algum momento, ainda que pareça  obra do inconsciente, vai ser por ela molestado ou induzido a perceber que o que lhe estão exigindo não é algo injusto, mas uma contrapartida, o continente do  outro prato da balança; o valor contido na outra  face da moeda. Os maus, como os bons, sem nenhuma dúvida, uma hora descobrem porque estão sendo punidos ou premiados.

 Há, dentre os que agem, reiteradamente, com ingratidão ou sem compaixão, os que acreditam que precisam fazer isso para deixarem a condição de vítimas; esses, chegam a crer que o mundo, invariavelmente, lhes vira as costas. Idiotas, coitados, por estarem de olhos fechados, cegos para o que não querem, mas precisariam enxergar, não conseguem discernir a luz da escuridão.

 Muitos dos filhos que desrespeitam, machucam ou agridem seus pais, num dado momento, escutam a voz ou acatam aconselhamentos de sua consciência e mudam: estes se tornam ótimos pais. A outros, os que se negam, peremptoriamente, a ser bons filhos, o tempo, mestre maior da natureza, se encarrega de dar-lhes o que merecem.

  As festas da vida são mais animadas quando pais e filhos participam e se divertem juntos; as agruras e os sofrimentos, de uns e de outros, serão bem menos doídos, quanto maior o amor entre eles.

                                                                Antônio Francisco Sousa – Auditor Fiscal e escritor