A pergunta boba
Por Bráulio Tavares Em: 20/12/2010, às 08H43
[Bráulio Tavares]
Todos nós, profissionais calejados, rimos quando vemos na TV a jovem repórter principiante (sim, minhas amigas, não é preconceito meu, mas geralmente é uma mulher) perguntando ao entrevistado famoso quem ele levaria para uma ilha deserta ou qual a sua cor favorita. São perguntas idiotas, mas no estreito mundinho mental em que ela foi forçada a viver, o das revistas-para-meninas e revistas-para-moças, essas perguntas são feitas com enorme frequência. Ela cresceu ouvindo-as e certamente imagina viver numa cultura em que não apenas todo mundo tem uma cor favorita, mas todo mundo se interessa em saber qual é a cor favorita dos outros.
Grande parte das perguntas feitas em entrevistas não são coisas que o público quer saber, e muito menos coisas que o jornalista quer perguntar. São perguntas que ele herdou. Perguntas que passam de geração em geração de repórteres, pelo simples fato de que é mais fácil usá-las de novo do que ter uma ideia nova. Além do mais, quem critica jornalistas não sabe o que é todo dia ter que encher aquela página que parece ter um hectare de superfície branca. Todo dia ter que reinventar o mundo a partir do zero. Todo dia ter que perguntar algo a desconhecidos, a alguém sobre quem o repórter leu meia lauda de informações colhidas às pressas, enquanto sobe no elevador para bater na porta do entrevistado.
Daí que muitas vezes o repórter faz uma pergunta besta e o entrevistado dá uma resposta áspera. Perguntaram a Nelson Rodrigues “que recado ele daria aos jovens”. Nelson jogou este paralelepípedo: “Envelheçam!”. Coitados dos jovens, que tiveram de obedecer-lhe a contragosto. O repórter (desta vez imagino que era um rapaz) certamente estava acostumado a entrevistar velhos cheios de conselhos e palavras de ordem.
Consta que alguém perguntou a Ariano Suassuna o que ele achava da Aids, e ele retrucou: “Prefiro Dostoiévski”. Menos mal para o entrevistador, que voltou para a redação com uma resposta pitoresca, ainda que revestida de um certo azedume. Ariano é o tipo do escritor que se irrita com a mania de se querer saber a opinião de um escritor sobre qualquer assunto, como se pelo fato de ser escritor ele tivesse obrigação de ter uma frasezinha espirituosa ou uma idéia revolucionária a respeito de qualquer tema.
Há autores que raramente dão entrevistas (Rubem Fonseca, Guimarães Rosa, etc). Não é por serem antipáticos ou misteriosos, é para não terem que dizer “onde encontram idéias para escrever tantos livros” ou “tipo, como foi que pintou essa coisa, assim, de escrever”. O problema não é a dificuldade de dar uma resposta, é o constrangimento de ter que escutar a pergunta. Perguntaram a Jorge Luis Borges o que faria se fosse nomeado Ministro da Economia da Argentina, e ele explicou: “Renunciaria”. Acho que é por isso que se perguntam tantas coisas, mesmo bobas, aos escritores. Eles só dão respostas pra lá de sensatas.