[Dílson Lages Monteiro]

A geografia de minha cidade me toca. As ruazinhas do centro e seus casarões sobreviventes. Um quê de saudade entre os becos das praças – nem sei mesmo o que dizem. Tenho uma dificuldade danada de dizer por que Teresina é assim: sem verbo ou construção para abarcar toda a semântica de meu pensamento. Vivo aqui; respiro o calor; ofusco-me da incandescência de prédios como o Teatro 4 de Setembro ou a Igreja de São Benedito.

 Vivo, há exatos 25 anos. Só hoje descobri que de todos os dias que conheci, foi aqui onde mais minhas pálpebras se abriram para a luz. Ainda assim, vivendo a textura do calor entre o Parnaíba e o Poty, não consegui formar por conta própria um conceito para a materialidade das ruas em meu tato.

É a leitura de um poeta jovem, desses que aparecem como corisco, mas aparecem para ficar, para deixar um legado de emoções a outros semelhantes, que tem me levado, com lirismo e humor, às entranhas de traços cujas retas e sinuosidades habitam as sensações de uma cidade dita como é. Nada de Shopings Centers; nem baladas dos novos bairros ricos, tampouco o frenesi da especulação urbana.

Nos poemas de Rodrigo Leite, Teresina é uma cidade de resistências. Frita. Pesada. E, assim, faz sua crítica à nova urbe, que vai perdendo o senso de humanidade para o concreto do crescimento e, por isso, literalmente, frita:

               "a cidade frita entre rios
               asfalto brita calafrios
               a idade grita entre pernas
                sal limão sangue de menstruação”

 

A cidade frita em assaltos e marginalidade. Frita na prostituição de ruas e avenidas já senhoras no assunto:

 

             “adiante, zona sul, esquina da Mapil
             garotas de esqueléticas formas, comedoras de brasa
             cuspidoras de fogo!
             atiçam corações feridos de aço e sucata


            Em Rodrigo Leite, abundam tipos anônimos em poesia que é poesia, mesmo o tom de prosa formando a tessitura do verso.  São versos marcados por forte apelo erótico. O bar é cena recorrente. Dele, ou do entorno dele, de seus sabores-cheiros-formas nascem sinestesias (“a alma do bar está acessa numa lata de sardinha com querosene”), nasce a geografia dos bairros populares, onde o eu-lirico rabisca erotismo e um  nome no guardanapo de um bairro vazio:

(parti pra casa com o coração nas mãos)

              naquela noite
              - apesar dos rios de suor sobre a cama –
                                         vc não gemeu nem
                                                                 um pin
                                                                          go

             & pela manhã
             ainda
             sumiu com o resto do chá
             que havia entre nós

Para ler  A cidade frita, de Rodrigo Leite, online, acesse

http://rodrigomleite.weebly.com/index.html


P.S.: O poeta mantém  o blog A mussa esquecida