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Era a segunda expedição de Benito Botelho em busca de informações a respeito do desaparecimento do jovem Bataillon. Há vários dias a paisagem era a mesma. O som do motor, ritmado pela fumaça da chaminé sobre o ar limpo, o calor úmido e a copa das árvores, arriadas pelo sol pesado e fone, o chão liquido filtrado pelos raios através do verde escuro, as minúcias de luzes em redes de cobertura fofa, arriscada, acamada de folhas secas como patê silvestre, pavê molhado, folheado, cremoso, marrom, onde se deitavam flores selvagens - sim, aquilo era o Igarapé do Inferno re-visitado, depois de tanto tempo, invadido, muito além do ponto de onde a expedição anterior tinha chegado. O Igarapé do Inferno, embora fundo - um navio de bom calado podia navegar - era uma armadilha, camuflada, estreita, em que tinham entrado desde o Igarapé Bom Jardim. Uma ilha engastada na foz fechava-o por dentro. Escondia a mata molhada, literária. Um observador de bom olho não o veria, por trás da glorificação daquele esplendor vegetal. A lancha, que se chamava Solar, penetrava-o como lâmina de faca, sincopada e intrusa, comprida, naquele parque aquático de gigantes antigos, insatisfeitos por serem incomodados, dignos, altaneiros. Era o rumo ignoto, inominável, distante, da paragem dos seres mágicos Numas. Dir-se-ia que as estruturas arcaicas do mundo estavam escondidas ali, que lá o mundo terminava, nos seus desconhecidos motivos. (O AMANTE DAS AMAZONAS)