Quando se fala em inteligência artificial, uma das reações mais freqüentes das pessoas é de receio. Elas temem que as máquinas se tornem inteligentes demais e acabem tomando conta do mundo. A ficção científica tem uma parcela de culpa por essa mentalidade retrógrada, porque não são poucos os filmes e livros descrevendo mundos futuros em que robôs implacáveis escravizam os seres humanos, ou computadores de dimensões babilônicas controlam os mínimos de detalhes de nossa vidas. Os exemplo são incontáveis: “O Exterminador do Futuro”, “Colossus 1980”, “THX 1138”, “Admirável Mundo Novo”...

    Minha teoria é justamente o contrário desta. A maior ameaça à Humanidade não é o desenvolvimento da inteligência artificial nas máquinas, é a expansão de burrice artificial em nós mesmos. As duas coisas estão ligadas, claro, porque quanto mais ficamos dependentes das máquinas mais o nosso raciocínio fica preguiçoso, nossa vontade atrofiada. Posso detectar sintomas em mim mesmo, naquelas horas em que fico imobilizado na cama, assistindo na TV um programa que detesto, e olhando com angústia o controle remoto lá longe, em cima do aparelho.

    Há poucos dias, na Alemanha, um motorista cujo carro tem sistema de navegação autônomo saiu da pista 30 metros antes do cruzamento onde deveria virar à direita e derrubou uma escada e um toalete que havia perto da estrada. Ele alegou que o sistema de navegação avisou: “Vire à direita agora”, e mesmo vendo que ainda não tinha chegado à esquina ele obedeceu, porque o sistema lhe deu uma ordem. Causou um prejuízo de 2 mil euros. Dias antes, em Hamburgo, outro motorista ignorou um sinal de “Em Obras” e preferiu seguir seu sistema de navegação, que o aconselhava a seguir em frente. Por sorte, tudo que fez foi colidir com um monte de areia e encalhar.

    O desenvolvimento da inteligência artificial nas máquinas só é perigoso porque não sabemos o que fazer com o tempo livre e a energia extra que essa transferência de trabalho nos proporciona. Em vez de ficarmos mais espertos e mais atentos, imobilizamo-nos como zumbis, desobrigados de pensar e de decidir porque a Máquina decide por nós. Há um conto notável de Isaac Asimov em que ele mostra a perplexidade do Alto Comando Militar no futuro quando descobre um sujeito capaz de fazer contas de cabeça. Perguntam-lhe quanto é 25 vezes 43, e daí a trinta segundos ele responde: 1.075. Os generais puxam suas calculadoras e conferem: está certo. Mas como será possível?!

    Nossa mente implora atividade, assim como nosso corpo implora exercício. Por que motivo as pessoas lêem “Caras” na sala de espera? Não é só para se inteirar sobre o saltitante cotidiano de Danielle Winitts ou de Kelly Key. É para exercitar a mente. Por que fazem palavras cruzadas no avião? Por que jogam joguinhos eletrônicos no metrô? Porque nossa mente suplica por utilização, aterroriza-se à simples possibilidade da inação e do ócio. Mexei-vos, galera! Vamos praticar Sudoku!