90 anos de Osman Lins

 Por Hugo Viana

Na história literária há casos peculiares como o do escritor pernambucano Osman Lins (1924-1978): ao mesmo tempo em que promoveu experimentações importantes para o ofício da escrita, com livros revolucionários como o clássico Avalovara (1973), teve reconhecimento relativamente restrito a um público reduzido de leitores, críticos e pesquisadores acadêmicos; um desequilíbrio entre qualidade estética e alcance. Hoje, dia 5 julho, o autor completaria 90 anos – data que incentiva a necessidade de revisão crítica de sua plural produção literária.

“Ariano falou uma vez que Osman é um escritor para escritores”, lembra o professor da UFRPE Fábio Andrade, cuja dissertação foi sobre Avalovara. “De fato, a obra de Osman exige certo esforço, o mesmo requerido por grandes de todas as latitudes, como Joyce, Flaubert; todos grandes escritores, como Machado de Assis e Raduan Nassar, exigem esforço do leitor, o aprendizado de uma maneira nova de ler. É isso que fazem as obras cardeais, norteadoras: a possibilidade de aprender modalidades novas de leitura”, destaca. 

A relação entre “dificuldade” e “qualidade” de certa forma acompanha a história da literatura; nesse panorama, Osman surge como um autor exemplar. “Enquanto a popularização da literatura de entretenimento é um fenômeno quase imediato ao lançamento – quando não previamente estimulado pela propaganda -, a recepção de um autor considerado ‘difícil’ – cujo propósito é ‘incendiar as mentes e os corações’, como dizia Osman Lins – raramente ocorre de modo concomitante ao lançamento da obra”, sugere a professora da UFPE Ermelinda Ferreira. 

Foi com o gênero romance que o autor se destacou. Mas, além dos romances, Osman escreveu contos, ensaios e peças de teatro. “Ele escreveu ainda pouquíssimos poemas, publicados no Diario de Pernambuco nos anos 1950″, ressalta Fábio. “Ele via as outras formas a que ele se dedicou de maneira muito prática. Para ele a principal era o romance. O texto para o teatro, que ele gostava, era uma experiência menor, menos comprometida espiritualmente do que o romance”, comenta o pesquisador.

“Osman Lins desenvolveu um ambicioso projeto literário. Sua obra não é circunstancial. Ele é mais conhecido por sua peça teatral Lisbela e o prisioneiro, uma comédia adaptada com muito sucesso para a televisão e o cinema. Mas Osman investiu na construção e renovação do romance como um gênero que se dizia ameaçado de ‘extinção’. As bases deste projeto podem ser encontradas nos textos mais curtos de suas narrativas publicadas em conjunto, nos livros Os gestos, que elencam as preocupações do escritor na primeira fase de sua produção; e ‘Nove, novena’, em que ele ensaia os procedimentos criativos inovadores que utilizaria em sua maior obra, o romance Avalovara”, explica Ermelinda.

PERNAMBUCO

No Estado, o interesse pela obra do autor cresceu nos últimos anos, especialmente a partir da academia, com pesquisas sobre vida e obra do autor. “A quantidade de estudos sobre Osman na universidade hoje depende de dois professores, Lourival Holanda e Ermelinda Ferreira, que no final dos anos 1990, na UFPE, retomaram os estudos sobre Osman na UFPE. Mas essa retomada não foi na mesma proporção com a crítica e com maior interesse de leitores”, opina Fábio.

“A universidade oferece ao leitor a rara oportunidade de desenvolver um estudo profundo sobre determinada obra ou autor, muitas vezes com apoio financeiro, institucional e governamental, determinante para viabilizar tempo para esse trabalho. Infelizmente, porém, observa-se que essa reflexão atinge cada vez menos o público, e isso se deve, entre outras coisas, ao desaparecimento da crítica literária nos jornais, que disseminava o debate intelectual”, reflete Ermelinda.

ROTEIRO

Para entrar na obra de Osman, Fábio recomenda os contos. “É um caminho muito bom, principalmente Os gestos. Nos primeiros livros de contos já existem toda gama de temas que vão aparecer em sua obra sequente; uma percepção de mundo plural, diverso, um certo grau de incomunicabilidade entre os homens, um grau de solidão que está muito enraizado numa certa modernidade; o homem solitário no meio da multidão, traços modernos. São questões líricas trabalhadas à exaustão, mas na obra de Osman adquirem outro sentido. Embora o homem sofra com a falta de comunicação, o amor é a via para que se transcenda o abismo da comunicação. Avalovara é exemplo patente disso”, destaca

 

 

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