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[Maria do Rosário Pedreira]

Na obra-prima de Eça, levantam-se vozes discordantes quando Carlos da Maia decide ser médico. Em resposta às objecções, alguém diz, porém, que não há melhor profissão do que aquela num país cuja população ocupa a maior parte do tempo a queixar-se e a estar doente. Sim, é verdade que somos, por natureza, um bocado chorinhas e queixosos, mesmo que frequentemente cheios de razão, mas no romance de que hoje falarei, Índice Médio de Felicidade, de David Machado, encontraremos um protagonista nos antípodas deste modelo. Daniel, assim se chama a inesquecível personagem, perdeu o emprego, está em vias de perder a casa e até a família, tem um dos melhores amigos preso e o outro a caminhar para a loucura, mas nada parece demovê-lo de um optimismo e de uma esperança que são uma lição para todos nós. Porque, sem futuro, o presente não faz sentido, Daniel vira tudo do avesso, se for preciso, para que não falte felicidade àqueles que ama. Num romance que é também sobre os tempos duros que vivemos, David Machado conta-nos uma história que é uma autêntica espiral de peripécias com um ritmo incrível e gente que gostaríamos de ter como amiga. Dramático, realista e às vezes hilariante, esta é uma obra acerca da esperança que resta a quem perde quase tudo, que nos ensina muita coisa sobre nós mesmos.